Todos os meses o Estado gasta quase 60 mil euros com o Centro de Competências Jurídicas do Estado, o JurisAPP. Um organismo criado pelo Governo em 2017 com o objetivo de ter uma equipa a trabalhar exclusivamente para o setor público, contribuindo com consultoria, assessoria e aconselhamentos jurídicos.
Apesar disso, todos os anos o mesmo Estado continua a gastar milhões de euros na contratação de advogados. Desde que o JurisAPP existe foram gastos 56.387.596 milhões de euros em apenas 11 sociedades de advogados, de acordo com o portal Base.
A análise da CNN Portugal incidiu sobre os contratos feitos entre Estado e as 11 sociedades de advogados que mais faturam no país, de acordo com os rankings do setor.
Sociedade |
2018 |
2019 |
2020 |
2021 |
2022 |
2023 |
Morais Leitão |
699.865 |
1.154.297 |
949.323 |
1.236.574 |
1.202.015 |
762.135 |
Vieira de Almeida |
5.320.909 |
475.190 |
1.075.999 |
7.650.779 |
700.455 |
226.256 |
PLMJ |
160.040 |
569.165 |
1.062.078 |
1.424.383 |
733.835 |
664.748 |
Abreu |
273.654 |
97.280 |
328.785 |
594.640 |
418.812 |
529.323 |
Miranda |
331.790 |
363.800 |
589.250 |
975.870 |
460.530 |
203.848 |
CMS |
177.624 |
254.525 |
319.395 |
242.895 |
722.100 |
226.940 |
SRS |
186.250 |
180.599 |
276.920 |
1.199.164 |
541.165 |
151.000 |
Sérvulo |
1.434.410 |
1.945.385 |
1.301.315 |
2.406.886 |
2.355.408 |
1.057.190 |
Telles |
335.550 |
237.210 |
72.100 |
536.536 |
665.890 |
315.880 |
CS |
47.700 |
69.800 |
230.726 |
132.615 |
76.500 |
49.900 |
Cuatrecasas |
1.471.920 |
3.471.043 |
1.145.032 |
359.800 |
1.135.200 |
457.275 |
Total |
10.439.712 |
8.818.294 |
7.350.943 |
16.760.142 |
9.011.010 |
4.644.495 |
O JurisAPP tem 16 advogados e duas assistentes que trabalham em regime de exclusividade, sendo que alguns deles recebem salários que se aproximam do topo na Administração Pública. De acordo com o decreto-lei que definiu a criação do JurisAPP, quatro dos advogados, contratados como consultores seniores, recebem 4.688,49 euros por mês cada.
Contratos com as maiores sociedades feitos por ajuste direto
A figura do ajuste direto é comum na contratação de advogados. Sejam câmaras municipais, a RTP ou até universidades, é este o tipo de contrato mais realizado.
Dos 163 contratos entre o Estado e a sociedade Morais Leitão entre 2018 e 2023, 144 foram feitos por ajuste direto, sendo que os contratos com os valores mais elevados recorreram todos a este procedimento. É o caso da Câmara Municipal de Cascais, entidade que adjudicou os quatro contratos mais elevados com aquela sociedade, num valor total que chega perto de um milhão de euros.
É também o caso do Banco de Portugal. Apenas em quatro contratos, três com a sociedade Vieira de Almeida e um com a Cuatrecasas, foram gastos 14.715.000 euros. Montante que serve, segundo os contratos analisados, para "serviços de assessoria jurídica e patrocínio jurídico". Como na maioria dos casos, também estes contratos foram adjudicados com recurso ao ajuste direto.
De resto, e à semelhança da Morais Leitão, a Vieira de Almeida teve os seus contratos adjudicados por ajuste direto em 73 das 75 ocasiões que prestou serviços ao Estado no mesmo período. Já a Sérvulo, que é a sociedade que mais trabalha com o setor público, sendo conhecida por ser especialista na área, realizou 234 dos 267 contratos com o Estado através de ajuste direto.
O código da contratação pública prevê uma série de modalidades para que o Estado possa contratar. Entre elas está o ajuste direto, que tem regras claras: só pode ser usado em contratos com um máximo de 50 mil euros, sendo que esse limite baixa para 30 mil euros em casos de obras públicas e para 20 mil euros na aquisição de serviços, como seria o caso das sociedades de advogados.
Apesar disso, e de acordo com o que está previsto no código da contratação pública, existem exceções que podem legalizar contratos acima dos valores referidos. São cenários desses o facto de um concurso ficar deserto ou se, por motivos imprevisíveis, não existir tempo para o lançamento de um concurso.
Na prática, e como acontece nos contratos analisados, a maioria dos casos de contratos de serviços jurídicos acaba por ter sempre presente alguma das exceções previstas para o limite de preços dos ajustes diretos.
Despesa para este tipo de serviços aumenta
Não é possível perceber com exatidão quanto é que o Estado prevê gastar todos os anos com serviços jurídicos, mas as parcelas onde estes estão inseridos têm vindo a aumentar substancialmente.
De acordo com os últimos Orçamentos do Estado, e na parte que analisa os gastos em estudos, pareceres, projetos e consultadoria, onde se incluem os pareceres jurídico e a assessoria, em 2023 o setor público prevê gastar 245.644.213 euros. Bem mais do que os 181.535.534 euros previstos para 2022 e quase o dobro dos 136.200.249 alocados em 2021.
Fora das contas referidas no portal Base estão eventuais serviços jurídicos que o Estado tenha contratado para empresas como a TAP, por exemplo. Mas dentro das parcelas que incluem os estudos, além daquilo que é gasto em advogados, estão os valores de estudos como os encomendados para se perceber onde vai realizar, afinal, o novo aeroporto de Lisboa.