Recebeu €500.000 para sair da TAP, acabou nomeada secretária de Estado de Fernando Medina: o caso Alexandra Reis - como se chegou até aqui - TVI

Recebeu €500.000 para sair da TAP, acabou nomeada secretária de Estado de Fernando Medina: o caso Alexandra Reis - como se chegou até aqui

A nova secretária de Estado do Tesouro, Alexandra Reis, durante a cerimónia de tomada de posse (Tiago Petinga/ Lusa)

Esta segunda-feira o Governo divulgou o relatório da Inspeção-Geral das Finanças sobre o caso: os presidentes da TAP foram demitidos, Alexandra Reis vai ter de devolver quase todo o dinheiro. Eis o que motivou toda esta celeuma

Alexandra Reis esteve apenas 25 dias como secretária de Estado do Tesouro no Ministério das Finanças, liderado por Fernando Medina. Saiu no fim de 2022 e mais tarde fez cair todo o Ministério das Infraestruturas e da Habitação, com Pedro Nuno Santos à cabeça.

A polémica começou a 24 de dezembro, quando foi noticiado que a governante tinha recebido no início do ano 500 mil euros de indemnização pela saída da TAP, onde era gestora desde 2017. O motivo da saída foi logo uma das primeiras dúvidas, mas depressa se percebeu que a relação entre Alexandra Reis e a CEO da companhia aérea não era a melhor. Com efeito, terá sido mesmo Christine Ourmières-Widener a acelerar a saída da gestora, sendo que o relatório da Inspeção-Geral de Finanças (IGF) aponta a existência de “irregularidades” na condução do processo.

Polémica foi também a transição entre TAP e Governo, uma vez que Alexandra Reis, que era administradora da companhia aérea, foi trabalhar como presidente para a NAV – Portugal, empresa responsável pela atribuição de slots às empresas de aviação. O ministro das Finanças, Fernando Medina, afirmou que esta nomeação foi “positiva”.

A cronologia da demissão

No dia 24 de dezembro, o Correio da Manhã noticiava que a então secretária de Estado do Tesouro, empossada a 2 de dezembro, tinha recebido uma indemnização de 500 mil euros da TAP. Mais do que o valor, o que causou surpresa foi a informação dada pela empresa à Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM), que indicava que a gestora tinha renunciado ao cargo. “Alexandra Reis, vogal e membro do Conselho de Administração e Comissão Executiva da TAP, apresentou hoje renúncia ao cargo, decidindo encerrar este capítulo da sua vida profissional e abraçando agora novos desafios”, pode ler-se no comunicado. Ainda nesse dia a oposição começa a levantar algumas dúvidas sobre o caso, do qual o Presidente da República diz não querer falar.

Já no dia de Natal, e mudando a postura que tinha tido no dia anterior, Marcelo Rebelo de Sousa admite que “há quem pense” que era bonito Alexandra Reis prescindir do valor recebido na indemnização.

“É como pensam muitos portugueses, dizem: a senhora saiu daquele lugar, tinha direito por lei a ter aquilo, mas na medida em que está a exercer uma função pública há quem pense que era bonito prescindir disso, atendendo a que está noutra função. Mas do ponto de vista jurídico, a lei permite isto”, disse Marcelo Rebelo de Sousa, dizendo que Alexandra Reis teria, à luz da lei, direito a três vezes o valor recebido.

O Presidente da República mostrava-se bem informado acerca do caso, chegando-se à frente para dizer que Alexandra Reis “saiu com essa indemnização por decisão da própria empresa e não por iniciativa própria”.

Chegava a vez de ser o Governo a falar, com os ministérios das Finanças e Infraestruturas e Habitação a pedirem esclarecimentos sobre "o enquadramento jurídico do acordo celebrado no âmbito da cessação de funções", incluindo o valor do "montante indemnizatório atribuído".

Os partidos continuam a pedir mais explicações, com Chega e Bloco de Esquerda a pedirem audições urgentes de Fernando Medina, Pedro Nuno Santos, Christine Ourmières-Widener e a própria Alexandra Reis. Em paralelo o partido de André Ventura envia uma queixa à IGF.

A ainda secretária de Estado do Tesouro tem a primeira reação, afastando logo o cenário de ilegalidade no processo e rejeitando a devolução da indemnização recebida. "Nunca aceitei - e devolveria de imediato caso já me tivesse sido paga - qualquer quantia em relação à qual não estivesse convicta de estar ancorada no estrito cumprimento da lei", escreveu, numa declaração escrita enviada à agência Lusa, na qual confirma uma primeira contradição no caso: Alexandra Reis garante que foi a TAP a solicitar o fim do contrato de trabalho, sendo que o tal comunicado à CMVM falava em renúncia.

Mais cauteloso, o Presidente da República voltava a pegar no tema, apontando questões que deviam ser esclarecidas, nomeadamente a razão do fim da colaboração e quais os critérios que levaram ao valor atribuído.

A 27 de dezembro Alexandra Reis passa a ter um peso demasiado evidente e o Governo anuncia a sua demissão. Numa nota curta do Ministério das Finanças, onde é referido a necessidade de "preservar a autoridade política" da pasta de Fernando Medina, é dado a conhecer que a secretária de Estado aceitou prontamente o pedido de demissão.

Isto no fim de um dia em que Marcelo Rebelo de Sousa voltou a colocar pressão no tema, e em que o primeiro-ministro disse que "desconhecia em absoluto os antecedentes" do caso. Também nesse dia, e horas antes da comunicação da demissão, a TAP corrige a informação enviada à CMVM, referindo que foi a empresa que decidiu colocar fim à relação laboral.

Caía Alexandra Reis, mas dois dias depois caía um peso pesado dos governos de António Costa. Pedro Nuno Santos anunciava a sua demissão já durante a madrugada de 29 de dezembro, defendendo que "face à perceção pública e ao sentimento coletivo gerados em torno deste caso, o ministro das Infraestruturas e da Habitação, Pedro Nuno Santos, entende, neste contexto, assumir a responsabilidade política e apresentou a sua demissão ao primeiro-ministro”. Com ele saíram também os secretários de Estado das Infraestruturas e da Habitação.

O caso de Pedro Nuno Santos, que começou por dizer que não sabia de nada, só seria fechado dias mais tarde após a demissão, com o já ex-ministro a confirmar que, afinal, tinha dado autorização à indemnização. "Neste processo de reconstituição, foi encontrada ontem (19 de janeiro de 2023), por mim, uma comunicação anterior da minha então Chefe do Gabinete e do Secretário de Estado, de que nenhum dos três tinha memória, a informarem-me do valor final do acordo a que as partes tinham chegado", admitiu. "Nessa comunicação dizem-me que é convicção dos dois, em face da recomendação da CEO da TAP e da sua equipa de advogados e das informações que receberam dos mesmos, que não era possível reduzir mais o valor da compensação. Aquilo que me foi pedido nessa comunicação foi anuência política para fechar o processo e a mesma foi dada."

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