Quando uma amizade se depara com um obstáculo, como é que sabe se deve trabalhar a relação ou deixá-la ir?
Pode ser tentador deixar uma amizade desvanecer-se em vez de enfrentar um conflito - especialmente quando a vida parece esmagadora noutros aspetos - porque o conflito é difícil. Mas já estamos a enfrentar uma epidemia de solidão, e a reparação de relações é ainda mais urgente face às evidências biológicas.
"De facto, é uma questão de vida ou de morte", escreveu Lydia Denworth no seu livro "Friendship: The Evolution, Biology, and Extraordinary Power of Life’s Fundamental Bond [Amizade: a Evolução, a Biologia e o Poder Extraordinário do Vínculo Fundamental da Vida]". "Está presente no nosso ADN, na forma como estamos ligados. E isso significa que a amizade não é uma escolha ou um luxo; é uma necessidade que é fundamental para a nossa capacidade de ter sucesso e prosperar."
Se perdeu o contacto com bons amigos ou se se afastou no último ano, pode ser altura de trabalhar os sentimentos feridos e os mal-entendidos. Pense neste trabalho como uma forma de relacionamento e de autocuidado, porque ficar preso em conflitos mina energia que é valiosa.
Aqui estão cinco maneiras de reparar uma amizade - ou deixá-la para trás se for tóxica.
1. Refletir e escrever o que é bom
Antes de enfrentar uma conversa difícil com um amigo, faça uma pausa e reflita. "Pense num momento específico em que essa amizade lhe trouxe alegria ou entusiasmo", recomenda Adam Smiley Poswolksy, autor de "Friendship in the Age of Loneliness [A amizade na era da solidão]". Poswolsky sugeriu usar essa memória como inspiração para escrever coisas que aprecia num amigo. Também incentiva a partilha dessa lista na conversa com o amigo.
"Começar a comunicação a partir de um lugar de gratidão e positividade vai tornar a conversa muito mais significativa", aconselha.
Independentemente do resultado, a intenção positiva manter-se-á. "Mesmo que ainda haja tensão e mesmo que ainda seja necessário fazer uma pausa na amizade, ou até mesmo uma pausa longa (ou permanente) de passar tempo juntos, essa apreciação irá percorrer um longo caminho para construir empatia e compreensão mútua", diz Poswolsky.
2. Escolha uma forma diferente de comunicar
Se os esforços de reparação não funcionaram através dos canais habituais, tente uma forma diferente de comunicar. "As pessoas ficam entusiasmadas quando recebem correio que não é um catálogo ou uma fatura. Envie mais postais, escreva mais cartas ou envie a alguém um livro que ache que essa pessoa iria gostar", recomenda Poswolsky.
Também sugere uma abordagem mais profunda para escrever cartas: "Tentem escrever cartas um ao outro antes de falarem. Na sua carta, inclua a razão pela qual acha que a relação é estranha - e porque a quer reparar."
Esta abordagem pode ajudá-lo a ganhar empatia e a melhorar as capacidades de comunicação. "Poderá aperceber-se de que o seu amigo está a passar por algo de que não tinha conhecimento. Começará a prática importantíssima de ouvir, antes mesmo de se sentarem para falar um com o outro", observa Poswolsky.
3. Dar tempo ao tempo e tentar de novo
As pessoas diferem na forma como lidam com os conflitos, por isso, lembre-se de que pode ser necessário dar algum espaço de manobra a uma amizade antes de tentar novamente.
Maria Franco, psicóloga e perita em amizades com sede em Washington, DC, EUA, diz que as amizades podem necessitar de tempo para voltarem ao normal após o conflito - e que os sentimentos desconfortáveis persistentes podem exigir mais atenção.
"Se continuar a ser estranho, isso pode sugerir que nem todos puderam partilhar a sua opinião e sentir-se ouvidos", observa Franco.
Franco recomenda uma abordagem honesta e afirmativa como, por exemplo, "Tenho sentido que as coisas têm andado um pouco mal desde que nos chateámos. Gostaria muito de voltar a pôr as coisas nos eixos, pois valorizo muito a tua amizade. Queria falar sobre isto para ver se há mais alguma coisa que precisemos de desanuviar."
Também é importante lembrar que só pode fazer o que está ao seu alcance. "Se o amigo preferir não reparar, pode orgulhar-se de si próprio por ter agido com integridade. Lembre-se de que não controla as outras pessoas, mas, do seu lado, fez tudo o que podia", sublinha Franco.
4. Mude a "mobília da amizade" de lugar
Um dos desafios das amizades de longa data é quando ficamos presos à ideia de como a relação era antes. A realidade é que todos nós mudamos à medida que as nossas circunstâncias e prioridades mudam.
Se tentou consertar uma amizade e não sente que as coisas possam voltar a ser como eram antes do conflito, Denworth sugere que seja considerada a possibilidade de continuarem amigos de uma forma mais informal.
"Chamo-lhe mudar a mobília da sua vida social", diz Denworth. "Nem todas as amizades duram uma vida inteira, e não há problema. Os biólogos evolutivos descobriram que os laços de alta qualidade requerem três coisas: são duradouros, positivos e cooperativos. É preciso ter as três coisas."
5. Siga as bandeiras vermelhas
Por vezes, uma amizade sofre devido a um erro de comunicação e, por vezes, os problemas são muito mais profundos.
Franco encoraja as pessoas a não deixarem que um único problema acabe com uma amizade, que é algo que ela vê na sua prática. "O conflito é uma abertura para recalibrar e melhorar uma amizade, e transmite investimento mútuo. Não desista de uma amizade só porque surgiu um problema", considera Franco.
Mas Franco aconselha a estar atento aos sinais de alerta. "Por exemplo, o seu amigo não está a torcer pelo seu sucesso, intimida-o, não tem consideração, ou você sente-se esgotado ou incompreendido por ele... pode ser altura de terminar em vez de remendar", defende Franco.
Avaliar o equilíbrio entre o mal e o bem é crucial. "A ciência da amizade mostra que as relações ambivalentes não são boas para a nossa saúde. Por outras palavras, se houver demasiadas coisas más, as boas não compensam necessariamente as más", explica Denworth. "Seja honesto consigo mesmo sobre a saúde de uma amizade e não a mantenha apenas pelos velhos tempos se ela o estiver a prejudicar."
Quando a vida parece difícil, abordar conversas incómodas ou dolorosas cai muitas vezes para o fim das nossas listas de tarefas. Mas a ligação humana é crucial; é altura de abraçar o estranho, ser honesto, ouvir e arriscar.