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Opinião: o malabarismo governamental

Com o Programa de Estabilidade e Crescimento, Governo tenta equilibrar as contas... para não cair do trapézio

Ao fim de muitos meses de expectativa o Governo torna público o documento que, ao projectar a trajectória das contas públicas para os próximos quatro anos, vai também definir muitos aspectos importantes da vida de todos os portugueses.

Foi um parto difícil que obrigou o ministro das Finanças a fazer todo o tipo de malabarismos para não cair do trapézio. Entre o aumento das receitas e a redução das despesas, Teixeira dos Santos tenta não cair da corda.

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É necessário manter a estabilidade política simulando uma negociação com os partidos da oposição. Todavia, é notório que mais do que uma negociação o governo limitou-se a informar as restantes forças partidárias das linhas gerais do PEC, colocando-os entre a espada e a parede, já que um parecer negativo por parte dos partidos vai, aos olhos de quem governa, pôr em causa o futuro do país.

Resolvido o problema da estabilidade política, o executivo tenta agora provar que a estabilidade económica e o caminho para o crescimento se fará com este Programa que será entregue em Bruxelas no final do mês.

Por um lado, Teixeira dos Santos sabe que não pode avançar com um aumento generalizado dos impostos, para não penalizar a competitividade da economia nacional, por outro, é inevitável que o ministro tenha vasculhado o sistema contributivo para encontrar novas fontes de receitas que compensem as perdas fiscais registadas no último ano, provocadas, sobretudo, pelo abrandamento da economia.

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O equilibrismo governamental é agora conhecido e mais uma vez são os funcionários públicos que vão pagar parte da factura. Os salários vão ficar praticamente congelados, (na melhor das hipóteses os aumentos salariais ficarão sempre abaixo da taxa de inflação até 2013), agravando ainda mais as perdas sucessivas de poder de compra que registam desde a década de 90. Uma realidade que vai, certamente, afectar muitos mais portugueses do que os setecentos mil trabalhadores do Estado, já que as políticas salariais seguidas na função pública servem de referência para os patrões do sector privado.

Quer isto dizer que nesta segunda-feira cinzenta, os portugueses ficaram a saber que perante as regras ditadas pelo temido PEC, terão de se conformar com aumentos salariais, que, na melhor das hipóteses, serão residuais. E se por um lado, todos nós desejamos conhecer dias de prosperidade, por outro, a recuperação económica vai acentuar ainda mais o recuo dos salários, ao empurrar a inflação para terreno positivo.

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Na prática, os preços vão voltar a subir enquanto a generalidade das remunerações vai estagnar. O executivo alega que com este corte expressivo dos salários conjugado com a regra 2 por 1 (só é admitido um novo funcionário público por cada duas saídas) os cofres do Estado vão poupar 100 milhões de euros por ano.

Ainda assim há uma pergunta que se impõe: até que ponto a contenção salarial exacerbada não será mais prejudicial uma vez que se vai conduzir a retracção do consumo privado?

O Programa de Estabilidade e Crescimento para os próximos quatro anos dita ainda que quem aufere mais de 150 mil euros por ano vai pagar mais 3% de IRS. É criado um novo escalão neste imposto, mas num país em que o salário médio está pouco acima dos 800 euros, é inevitável questionar até que ponto o montante que será arrecadado compensa a medida de austeridade, sabendo que quem mais ganha sabe bem como contornar o sistema contributivo nacional.

Ao conhecer o PEC apercebemo-nos do esforço e dos muitos sacrifícios que serão feitos para que o malogrado défice público baixe de vez para menos de 3% e quem mais tem, mais deve contribuir. O principio é bom, mas esperemos que não provoque efeitos perversos.

*[António Ferrari é jornalista de economia da TVI]

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