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Geórgia aprova "lei russa" que torna ONG e media "ilegais" e preocupa Europa: "É um sinal de aproximação a Moscovo"

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O parlamento georgiano aprovou uma lei semelhante a uma outra que já está em vigor na Rússia desde 2012, numa iniciativa que está a ser interpretada pelos opositores e pelo Ocidente como "uma aproximação da Geórgia à Rússia"

Milhares de georgianos têm saído às ruas de Tbilissi em protesto contra a chamada “lei dos agentes estrangeiros”, semelhante a uma lei que está em vigor na Rússia desde 2012, e que pode ser um sinal de “aproximação da Geórgia a Moscovo” para o qual a União Europeia (UE) deve saber responder “com cautela”.

Em causa está uma lei aprovada esta quarta-feira pelo parlamento georgiano, com 83 votos a favor e 23 contra, que exige que todas as organizações não-governamentais (ONG), meios de comunicação e entidades similares que recebam pelo menos 20% do seu financiamento do exterior reportem os seus rendimentos e doações. 

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Se não o fizerem, “é-lhes retirado o estatuto de utilidade pública”, tornando-se assim ilegais e passando a ficar registadas como “agentes de influência estrangeira”, explica à CNN Portugal o professor Tiago André Lopes, especialista em Relações Internacionais. “Basicamente, o regime classifica-as como sendo disruptivas”, acrescenta, razão pela qual a lei está a ser interpretada como uma ameaça aos direitos à liberdade de expressão e de associação e promotora da censura.

A lei motivou vários protestos na capital da Geórgia, onde milhares de georgianos, sobretudo estudantes universitários, têm vindo a insurgir-se contra o que designam como “a lei russa”, uma vez que Moscovo adotou uma lei semelhante em 2012. As manifestações de protesto têm sido violentamente reprimidas pela polícia, que utiliza gás lacrimogéneo e granadas para dispersar os manifestantes, que ainda esta terça-feira tentaram bloquear o edifício do parlamento.

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A diferença entre a lei em vigor na Rússia e a lei aprovada agora na Geórgia, diz o especialista, reside no facto de o parlamento georgiano ser composto por uma “maioria democraticamente eleita”, do partido Sonho Georgiano, tendo sido eleita “numa eleição reconhecida como livre e transparente pelos observadores internacionais”, inclusive por uma missão da UE.

Rússia pode aproveitar protestos na Geórgia para "propaganda" contra UE

Pese embora haja “uma desconfiança grande em relação ao parlamento” da Geórgia, bem como em relação à elite política, a verdade é que este regime “cumpre os requisitos democráticos” e, por isso, “a UE tem de ter algum cuidado no modo como vai lidar com isto”.

É que, no entender de Tiago André Lopes, estes protestos - que são sobretudo urbanos, não sendo expressivos nas zonas do interior da Geórgia - podem “abrir uma porta que a Rússia pode explorar para efeitos de propaganda”, nomeadamente denunciando que a “a União Europeia só valida certos protestos quando lhe interessa a agenda”. 

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O professor de Relações Internacionais vê a reprodução desta lei russa na Geórgia como um sinal de “aproximação de Tbilissi a Moscovo”, que parecem estar a enveredar num “processo de normalização de relações diplomáticas”. E isto apesar de a Geórgia ter ainda território sob ocupação russa. “Mas parece estar interessada em normalizar as relações com essa mesma Rússia”, observa o especialista. 

Na perspetiva do professor Tiago André Lopes, esta aproximação é resultado da forma como a NATO está a gerir a guerra na Ucrânia, priorizando a adesão de Kiev à Aliança Atlântica em detrimento de outros Estados, “como a Geórgia, como a Moldova ou como a Bósnia”, que “estão a começar a pôr em questão se de facto estas instituições internacionais as querem como Estados-membros, se as tratam como iguais” à Ucrânia.

É que mesmo sendo Tbilissi “um dos maiores contribuidores líquidos” entre os Estados não-membros da NATO, a verdade é que “não vimos a Geórgia no discurso político nem de Stoltenberg nem dos grandes dirigentes da NATO”, sublinha. “E isso é que levou a uma revolução das prioridades de política externa da Geórgia”, conclui.

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Ocidente preocupado com "ameaça aos direitos à liberdade de expressão e de associação"

A presidente da Geórgia, Salome Zurabishvili, que não faz parte do partido com maioria no parlamento - o Sonho Georgiano, liderado por Giorgi Garibashvili, já se manifestou contra a lei e apelou aos cidadãos para que façam uma escolha "existencial" entre a Rússia e a Europa.

“Esta lei é um símbolo, mas na realidade há uma escolha – uma decisão, uma escolha existencial que a Geórgia deve fazer nas eleições: Europa ou Rússia”, advertiu Zurabishvili, referindo-se às próximas eleições na Geórgia, que deverão ocorrer no final do ano.
 
Tal como acontece em Portugal, a constituição da Geórgia dá à presidente o poder de veto único, pelo que Salome Zurabishvili ainda poderá vetar a mesma lei - o que já prometeu fazer. Ainda assim, e tratando-se apenas de um veto único, a lei pode voltar ao parlamento e "é quase garantido que passará uma segunda vez", antecipa Tiago André Lopes.  

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Esta quarta-feira, o alto comissário das Nações Unidas para os Direitos Humanos exortou as autoridades da Geórgia a recuarem na lei, manifestando-se preocupado com o “uso desproporcionado de força” contra manifestantes e imprensa.

“Exorto as autoridades da Geórgia a retirarem este projeto de lei e a encetarem um diálogo, nomeadamente com a sociedade civil e as organizações de comunicação social”, afirmou o responsável da ONU, em comunicado.

Para Türk, “rotular as ONG e os meios de comunicação social que recebem financiamento estrangeiro como ‘organizações que atuam no interesse de uma potência estrangeira’ constitui uma séria ameaça aos direitos à liberdade de expressão e de associação”.

Também esta quarta-feira, o Parlamento Europeu condenou a violência na Geórgia, candidato à adesão à União Europeia (UE), e pediu aos líderes georgianos para que “retirem o projeto de lei e concentrem os seus esforços nas reformas necessárias para a adesão à UE e à NATO”.

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