É uma figura feminina que surge, mas não é ainda Antony a silhueta diáfana que serve o bailado de sofrimento consentido que o Coliseu de Lisboa esgotado quer beber. O véu é calmamente retirado durante uma antecâmara que prepara os peitos abertos a uma voz que fere de forma dupla pelo timbre e pelas palavras.
Antony and the Johnsons mostram-se ainda na sombra das luzes que vão iluminar quase na totalidade
«The Crying Light»
Quem foi ouvi-los à espera de um recital de doçura sofrível não foi em vão. De todo. O tom foi esse desde os primeiros acordes. O tom foi esse na música que se ouviu - e que se queria ouvir -; essa música que se divide entre a ternura com que é cantada e a dor em que vive.
Mas não em que subsiste. Porque é assim o sofrimento de quem como ele ama. E quando a comunhão pela beleza da sua música está consagrada, essa recusa de estado final é partilhada. Ele é o Antony que sofre com o aquecimento global e que descobre «o ambiente como um amante» e «onde» nasceu.
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O autodenominado transgender que do catolicismo renegado só conserva o nome (de baptismo?) sofre porque precisa de outro lugar, de outro mundo. «Ainda não sei como participar neste» diz aquele a quem nem o popular Obama escapa quando é preciso acossar o demónio por causa das fotografias classificadas de Guantánamo e evitar a serpente dentro de casa na pele de Dick Cheney.
E tudo isto no meio da mais tocante beleza audível que impele ao delírio agradecido quando «I Am a Bird Now» se espalha sem retrocesso pelo Coliseu e o álbum homónimo faz a sua aparição por entre a luz que continua. A noite é desta «bruxa» que exacerba o feminismo conquistado e é adorada de pé à primeira hipótese depois de duas horas que não acontecem todos os anos.
Alinhamento:
«Where Is My Power»
«Her Eyes Are Underneath the Ground»
«Epilepsy Is Dancing»
«One Dove»
«For Today I Am a Boy»
«Kiss My Name»
«Everglade»
«Another World»
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«Shake That Devil»
«The Crying Light»
«I Fell in Love With a Dead Boy»
«Fistful of Love»
«You Are My Sister»
«Hope Mountain»
«Twilight»
«Aeon»
Encore
«Cripple and the Starfish»
«Hope There's Someone»
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