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Entre-os-Rios: engenheiros «nada fizeram» para salvar vidas

PDiário: Juiz entende que os seis engenheiros pronunciados no caso da ponte «agiram de forma livre e consciente», omitindo regras técnicas que poderiam ter salvo 59 vidas. Denúncias sobre extracção ilegal de areias remontam a 1979. Inspecções insuficientes e desinteresse são as principais falhas apontadas

O juiz de instrução do Tribunal de Castelo de Paiva decidiu levar a julgamento seis engenheiros civis, quatro da extinta Junta Autónoma de Estradas (JAE) e dois de uma empresa projectista, na sequência da queda da Ponte de Entre-os-Rios, em 4 de Março de 2001, de que resultaram 59 mortos. Todos foram pronunciados por crimes de violação de regras técnicas agravados pelo resultado.

De acordo com a decisão instrutória, a que o PortugalDiário teve acesso, e que reproduz o teor da acusação, «os arguidos agiram de forma livre e consciente, omitindo voluntariamente a observância de regras técnicas em geral reconhecidas pela engenharia de pontes, perfeitamente testadas e difundidas e que, assim, não podiam desconhecer».

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O acórdão realça que todos eram «profissionais experientes» e que «podiam e deviam ter previsto» que «com as respectivas condutas punham em perigo a segurança e a vida de um número indeterminado de pessoas que circulassem na Ponte». No entanto, «os arguidos nada fizeram, actuando com falta de cuidado e de zelo» e com a «violação das mais elementares regras de prudência».

Segundo o despacho de pronúncia, remonta a 1979 a primeira denúncia anónima, comunicada à JAE, em que se alertava para a intensa extracção de areia por meio de arrastões a cerca de 20 metros dos pilares da Ponte e que poderia afectar a estabilidade das suas fundações.

A decisão do juiz é muito sustentada nas inspecções subaquáticas, em Dezembro de 1986, e reproduzidas em vídeo, nos quais se dá conta de «algumas anomalias». Concluiu o magistrado que «em Dezembro de 1986 era já evidente a existência de sinais de erosão localizada junto ao pilar 4 da Ponte».

Mas, apesar de a situação impor a realização de «obras urgentes de protecção do pilar», o certo é que os arguidos Jorge Cardoso e Aníbal Ribeiro (da JAE) «não só se desinteressaram de realizar obras de reforço e consolidação da fundação desse pilar, como não providenciaram pelo seguimento da evolução das infra-escavações verificadas no Pilar 4», lê-se no despacho.

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Mais adiante, refere-se que os arguidos Carlos Guerreiro e José Freitas, sócios-gerentes da empresa privada, foram os autores do estudo prévio de reforço e alargamento da Ponte. E nessa altura consideraram que só no caso de um alargamento da ponte havia necessidade de efectuar obras de consolidação da infra-estrutura, tendo, por isso, «infringido as regras técnicas» e «criando perigo para um número indeterminado de pessoas».

Face aos dados obtidos em 1986, na inspecção subaquática aos pilares, bem como nas informações recolhidas em 1988, em que se apontava para a erosão acentuada na envolvente da fundação do pilar 4, impunha-se «sempre e em qualquer caso, (. . .) uma intervenção urgente correctora e mitigadora», escreve o juiz.

O despacho de pronúncia alude, ainda, a um concurso público para «beneficiação, limpeza e pintura» da Ponte, lançado a 30 de Julho, e posteriormente anulado, sendo que, «após a mencionada anulação, jamais foi renovado o concurso para efectivação da anunciada empreitada, verificando-se um total e inexplicável abandono da conservação da Ponte».

Num outro caso, o despacho dá conta de uma vistoria realizada pelo arguido Manuel Ferreira (JAE), a 28 de Julho de 1998, que «não se preocupou em obter informações sobre os antecedentes históricos da Ponte, nem em consultar o respectivo cadastro».

O juiz alude, por outro lado, para as deficientes inspecções realizadas, nomeadamente do técnico José Santos, que propõe obras na ponte, ao mesmo tempo que reconhece, nas palavras do magistrado, a «clara superficialidade e insuficiência da inspecção realizada». «Devido à passagem constante de veículos não foi possível aceder ao passadiço da superestrutura e fazer uma análise ao estado dos aparelhos de apoio (. . .) ou avaliar visualmente se os elementos estruturais se encontram num elevado grau de corrosão», reconhecia o técnico.

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