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Praxes pela primeira vez na barra do tribunal

Aluna da Escola Superior Agrária de Santarém fez queixa de abusos em 2003. Tribunal decidiu agora que o caso vai a julgamento. Estudante queixa-se de ter sido impedida de falar com a mãe e esfregada com esterco de porco

Seis alunos da Escola Superior Agrária de Santarém vão ser julgados sob acusação de terem submetido uma colega caloira a praxes violentas, decidiu esta segunda-feira o Tribunal de Santarém. É a primeira vez que um caso de violência durante as praxes vai ser julgado em tribunal.

A aluna apresentou uma queixa na PSP de Santarém, em Março de 2003, alegando ter sido vítima de praxes violentas por parte de outros alunos do estabelecimento, entre as quais ter sido levada para uma quinta na periferia da cidade, onde foi coberta com excremento de porco.

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A queixosa acusava sete colegas mais velhos de vários crimes, incriminando-os de a terem forçado a aceitar praxes através de pressões psicológicas sob coacção, nos primeiros dias do ano lectivo de 2003.

Perante estes factos, a aluna apresentou uma queixa e enviou uma carta ao ministro do Ensino Superior, dando conta desses alegados abusos, que foram esta segunda-feira confirmados parcialmente pelo tribunal de Santarém, numa sessão em que foi dado como procedente o pedido do Ministério Público e da aluna de julgamento sobre seis dos sete arguidos.

Para Manuela Miranda, advogada da aluna, trata-se de um acórdão «histórico em termos de processos deste género». No entanto, a advogada admitiu recorrer do acórdão, já que a decisão não contemplou todos os pedidos de crime apresentados pela aluna.

Por sua vez, a mãe da aluna, que entretanto já mudou de estabelecimento de ensino, lamentou a actuação da escola em todo este processo, já que a vítima nunca contou com testemunhos favoráveis de professores ou alunos.

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Entre os factos relatados na carta que a aluna do curso de engenharia agro-alimentar enviou ao então ministro do Ensino Superior, a estudante queixava-se de ser vítima de praxes várias horas por dia, tendo sido impedida de falar com a mãe e esfregada com esterco de porco, além de constantes insultos verbais.

«Tem sido muito doloroso para mim recordar os factos que se reportam a este dia e lembrar o que gostava e precisaria esquecer. Peço por isso antecipadamente as minhas desculpas pela dificuldade em me exprimir e principalmente por ter de transcrever algumas frases impróprias», dizia a estudante na missiva.

De acordo com a estudante, nesse dia, os caloiros foram levados num autocarro da escola para uma quinta pertencente ao estabelecimento de ensino, sem a presença de professores ou funcionários.

«Após o almoço, por volta das 14 horas, recebi um telefonema da minha mãe, mas continuávamos proibidos de atender o telemóvel. Ao aperceberem-se, de imediato levantaram-se as vozes, repreenderam-me com tanto exagero que a minha mãe ouviu e perguntava nervosa o que se passava ali (...); fui impedida de continuar ao telefone».

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A aluna contou que reagiu, tentou calçar-se para ir embora da quinta e depois disso seguiu-se o terror: «Um veterano foi buscar dois sacos de esterco de porco e, sendo escolhidos quatro dos 30 caloiros presentes, foi-lhes dada liberdade de me esfregarem com esse esterco».

Depois, «outro horror ainda se seguiria»: «Quando todos voltaram do passeio diziam que tinham um espectáculo para mim, para eu ver como faziam os coelhos; assim as raparigas colocaram-se de gatas todas lado a lado, enquanto os rapazes tinham de simular o acto sexual com elas».

«(...)Então dois caloiros pegaram-me pelos pés e ombros e assim me agarraram no tal pino e com a cabeça metida dentro do penico. Aqui também não tenho noção do tempo que ali me mantiveram em tortura, obrigando-me ainda a pedir desculpa», escreve na missiva enviada ao então ministro Pedro Lynce.

O Movimento Anti-Tradição Académica (MATA) congratula-se com a decisão do tribunal de levar o caso a julgamento, considerando «esta decisão muito importante», uma vez que «marca o início de uma nova realidade: fica hoje claro que a impunidade não é um dado adquirido para quem insiste em ver as faculdades como uma espécie de "país à parte"».

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