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Cinco dias entre a denúncia e a detenção: os três fatores decisivos no caso de José Castelo Branco

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APAV diz que rapidez do processo "não é comum", mas a mediatização pode ser um ponto-chave neste caso

Cinco dias passaram entre a notícia de uma queixa apresentada pelo Hospital CUF de Cascais ao Ministério Público por suspeitas de violência doméstica sobre Betty Grafstein e a detenção do alegado agressor, o socialite José Castelo Branco. Ao final da manhã de terça-feira, menos de uma semana depois de noticiada a queixa, Castelo Branco, de 61 anos, foi detido pela GNR, sob um mandado emitido pelo Departamento de Investigação e Ação Penal (DIAP) de Sintra. 

“Esta celeridade [nos procedimentos] não é tão comum assim, é um caso que tem uma celeridade especial devido à mediatização que tem”, assume João Massano, presidente do Conselho Regional de Lisboa da Ordem dos Advogados. “E eu acho bem que assim seja. A violência doméstica é uma situação que tem de ser combatida e este tipo de processos deve servir como exemplo.”

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O caso remonta a 20 de abril, quando a norte-americana de 95 anos deu entrada no hospital da Grande Lisboa na sequência de uma queda, tendo então relatado a “vários profissionais de saúde” que tinha sido empurrada pelo marido – um “comportamento abusivo, físico e psicológico”, que, disse Betty de forma "consciente, orientada, calma e colaborante", com "memória mantida e cognitivamente bem", será "recorrente" na vida do casal.

Daniel Cotrim, responsável da Associação Portuguesa de Apoio à Vítima (APAV) para a área da Violência Doméstica, concorda que “esta rapidez não é comum”, mas recorre a uma "expressão corriqueira" para a tentar explicar. "Cada caso é um caso e, muitas vezes, na fase de instrução, o Ministério Público pode achar que existem acontecimentos ligados à situação de vitimização que podem propiciar uma detenção mais rápida".

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Ainda assim, o psicólogo admite que "este não é o tempo normal, não costuma ter esta rapidez – normalmente o que acontece é que há uma denúncia e, cerca de 15 dias depois, a vítima e a pessoa agressora são notificadas para serem ouvidas em inquérito, primeiro por uma força policial e só mais tarde pelo MP".

Para João Massano, "a mediatização do processo, que obriga as autoridades a um tratamento diferenciado, é um ponto que não se pode esquecer". Mas há também outros fatores que podem explicar a rapidez com que tudo está a decorrer, nomeadamente por se tratar de "uma situação denunciada por um hospital e por estarmos perante uma pessoa claramente vulnerável".

"Este tipo de situação acarreta maiores vulnerabilidades, tanto físicas quanto psicológicas", adianta Daniel Cotrim, e "nas situações de violência contra pessoas idosas também se coloca a questão de proteção e segurança imediatas para que não fique exposta novamente a violência", explica o psicólogo. "Os casos de violência contra pessoas idosas estão subreportados em Portugal, porque [as vítimas] são altamente dependentes e porque nalguns casos as pessoas agressoras são muito próximas e até lhes asseguram cuidado."

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"Alarme social não deixa magistratura indiferente"

João Massano dá exemplos que, não envolvendo o crime público de violência doméstica, demonstram a “pressão” sobre o poder judicial quando se vê confrontado com suspeitas imputadas a figuras públicas, o mais recente deles relacionado com o atropelamento mortal de um trabalhador na A6 pelo motorista do ex-ministro da Administração Interna, Eduardo Cabrita.

“Há cerca de um ano perguntavam-me sobre o facto de a acusação ter surgido em seis meses, se tinha demorado tanto tempo por ele ser uma figura pública, e eu respondi que foi precisamente o contrário, foi por ser uma figura pública que demorou só seis meses – na altura eu tinha processos semelhantes em mãos que demoraram muito mais a chegar a uma situação de acusação.”

Outro exemplo: a morte de Sara Carreira, filha do cantor Tony Carreira, num acidente de carro em dezembro de 2020, em que os acusados de homicídio por negligência já foram todos julgados e condenados. “Posso dizer que tenho vários processos dessa mesma altura em que os procedimentos ainda não avançaram, também aí houve uma celeridade muito maior, porque o próprio poder judicial sente-se naturalmente pressionado nestes casos.”

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No caso das suspeitas de maus-tratos a Betty Grafstein por José Castelo Branco, por se tratar de um crime público denunciado pelo próprio hospital, o advogado considera “natural” que tudo esteja a decorrer com grande celeridade. “É um caso de violência doméstica com uma visibilidade completamente diferente, e acho que isso faz todo o sentido. Neste tipo de processos, o alarme social não deixa indiferente a própria magistratura.”

Cotrim e Massano dizem que não existem estudos em Portugal sobre o tempo médio que decorre entre uma denúncia de violência doméstica e a formalização de uma acusação. Contudo, adiantam com base na sua experiência que, atualmente, costuma levar entre nove meses a um ano, “às vezes mais, dependendo da dificuldade de notificar testemunhas ou de ser feita a investigação”, indica o psicólogo. “Mas pelo que estivemos aqui a falar e por tudo o que estamos a ver”, acrescenta o advogado, “é óbvio que este caso não vai levar esse tempo todo”.

José Castelo Branco deveria ter sido presente a tribunal na terça-feira à tarde, para primeiro interrogatório judicial para a aplicação de medidas de coação, mas o interrogatório foi adiado por causa da greve dos funcionários judiciais. De acordo com dados da Direção-Geral de Reinserção e Serviços Prisionais (DGRSP) compilados pela Comissão para a Cidadania e a Igualdade de Género (CIG), 895 suspeitos de violência doméstica foram sujeitos a vigilância eletrónica como medida de coação no último trimestre de 2023, contra 266 não-sujeitos a vigilância eletrónica.

Entre outubro e dezembro do ano passado, houve 6.973 ocorrências de violência doméstica participadas à PSP e à GNR, de um total de 30.279 em todo o ano de 2023. Dados da Polícia Judiciária (PJ) indicam que, entre janeiro e dezembro do ano passado, 22 vítimas de violência doméstica morreram às mãos dos seus agressores, das quais 17 mulheres, duas crianças e três homens.

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