Dos peixes que se fundem num só aos besouros que oferecem veneno às parceiras. Os rituais de acasalamento que provam que o amor também é complicado para os animais - TVI

Dos peixes que se fundem num só aos besouros que oferecem veneno às parceiras. Os rituais de acasalamento que provam que o amor também é complicado para os animais

Para além de plantas e animais invertebrados, a partenogénese acontece em alguns animais vertebrados como répteis e peixes (Wild Horizons/Universal Images Group/Getty Images)

Mamíferos, répteis, insetos: a luta pela continuidade da espécie origina situações inusitadas em várias espécies do reino animal

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Uma paixão assolapada, o nervosismo dos primeiros encontros: as relações íntimas entre seres humanos podem muitas vezes parecer desnecessariamente complexas e melodramáticas. Em comparação, os rituais de sedução no reino animal parecem primar pela simplicidade, como a exposição do leque de penas do pavão ou o papo inchado do rabiforcado-magnífico. 

Mas não é bem assim. Para alguns animais, o processo de acasalamento pode ser tão ou mais extravagante do que o da espécie humana - ou até mesmo traduzir-se numa questão de vida ou de morte.

O gato marsupial que morre de exaustão à procura de fêmeas

Inestigadores australianos equiparam gatos marsupiais de ambos os sexos com localizadores e estudaram o seu percurso pela ilha de Groote Eylandt, no nordeste da Austrália. Nos 42 dias em que foram acompanhados, machos e fêmeas revelaram diferenças significativas: quer nos percursos percorridos, quer na probabilidade de sobrevivência na Natureza (Getty Images)

Os gatos marsupiais são uma espécie ameaçada de extinção, mas há um factor que pode estar a acelerar o rápido desaparecimento da espécie: os machos estão a trocar o sono por sexo, o que pode mesmo resultar na sua morte.

As fêmeas podem reproduzir-se logo após atingirem a maturidade sexual, com um ano, e até ao fim da vida, por volta dos quatro anos. Quanto aos machos, tendem a sobreviver apenas a uma época de acasalamento. Porquê? 

A privação de sono – associada a uma atividade redobrada, que pode levar estes mamíferos marsupiais a percorrer mais de 10 quilómetros numa única noite – faz com que os machos da espécie descurem a manutenção do pelo e a vigilância necessária à sobrevivência na natureza, tornando-os mais vulneráveis a parasitas e predadores.

O gato marsupial acaba por ser vítima do seu impulso de dar continuidade à espécie, como explica o autor principal de um estudo sobre o tema: "Tornam-se alvos fáceis, são incapazes de evitar colisões com veículos, ou simplesmente morrem de exaustão".

O casal de tamboris que se funde num só

As primeiras filmagens de um casal de tamboris no fundo do oceano foram capturadas em Portugal, ao largo dos Açores. O macho, agarrado à barriga da fêmea, é tão pequeno que quase se torna impercetível (Rebikoff Foundation)

Tal como a maioria das criaturas que habitam no fundo do oceano, o tamboril da espécie Caulophryne jordani tem um aspeto medonho: olhos minúsculos e uma boca enorme, escancarada, repleta de dentes afiados. Na profundeza das águas, a fêmea distingue-se dos demais peixes por carregar uma espécie de “lanterna” na cabeça, que a torna mais facilmente identificável pelo macho.

As fêmeas procuram alimento e movem-se agilmente pelos oceanos, chegando a ser até 60 vezes mais portentosas do que os machos, enquanto a função dos parceiros masculinos parece resumir-se à reprodução. Apesar de parecerem um casal improvável à primeira vista, a verdade é que os tamboris macho e fêmea acabam por complementar-se e fundir-se numa relação simbiótica… literalmente.

O macho de proporções invulgares, com os olhos e narinas exageradamente grandes para o seu tamanho, consegue detetar as feromonas femininas com o seu olfato apurado. Nada pelo escuridão do Oceano até reconhecer o ponto luminoso que pende do topo da cabeça da parceira e, então, finca os dentes aguçados no seu corpo.

Unidas pela “mordida de amor”, as células do casal de tamboris fundem-se e crescem em conjunto, numa espécie de parasitismo sexual. Como os dentes do macho estão presos na parceira e não tem possibilidade de caçar, a corrente sanguínea da fêmea pode por vezes fluir para o corpo do macho para assegurar a sua sobrevivência. Desde o nascimento até à morte, o único propósito da existência masculina nesta espécie é, portanto, a produção de esperma e a fertilização da fêmea.

A inversão de papéis dos cavalos-marinhos

Cavalo-marinho gestante, num aquário no Estado norte-americano do Luisiana. Nesta espécie, são os machos que se ocupam das crias desde o momento da conceção: recebem os ovos, fertilizam-nos, passam pelo processo de gestação e, por fim, dão à luz (Education Images/Universal Images Group via Getty Images)

A gravidez é um momento mágico, suspira a maioria das mães, para depois reconhecer: é também uma das etapas mais desconfortáveis da vida da mulher. Os cavalos-marinhos são uma das poucas espécies em que os papéis se invertem e é o macho a fecundar os ovos na bolsa incubadora – e a dar à luz, com direito a contrações que se podem prolongar por horas.

Apesar dos papéis reprodutivos inusuais, a fêmea continua a ser responsável pela produção de ovócitos e o macho pelos espermatozoides. Ao receber os gâmetas femininos numa bolsa incubadora na cauda, semelhante ao útero dos mamíferos do sexo feminino, o macho entra num período de gestação que pode ir de 9 até 69 dias.

O momento mais desafiante acontece no parto. As crias são expelidas da bolsa concomitantemente às contrações do pai, com cerca de dois milímetros de comprimento, mas o formato em "miniatura" é a principal fraqueza dos animais: só uma pequena fração sobrevive até à idade adulta, acabando os restantes por ser devorados por peixes de maior dimensão. 

As fêmeas que "encontraram um caminho" e se reproduzem sozinhas

Para além de plantas e animais invertebrados, a partenogénese acontece em alguns animais vertebrados como répteis e peixes (Wild Horizons/Universal Images Group/Getty Images)

"A vida encontra sempre um caminho", dizia Ian Malcolm, interpretado por Jeff Goldblum, no primeiro filme da saga "Parque Jurássico".  Referia-se à reprodução dos dinossauros (todos do sexo feminino) no parque temático, que parecia contrariar todas as leis da natureza. A situação é ficcional, mas a ciência em que se baseia é factual e verifica-se em várias espécies. 

Toda a população de répteis Aspidoscelis uniparens, lagartos encontrados nos Estados Unidos e no México, é composta exclusivamente por fêmeas que se reproduzem de forma assexuada, sem fusão de material genético. O fenómeno chama-se partenogénese - em grego antigo, "nascimento virgem" - e permite que o embrião se desenvolva a partir de um óvulo não fecundado.

Mas a reprodução autónoma não tem de significar a total ausência de comportamento sexual. Alguns cientistas observaram "atividades pseudossexuais" nesta espécie como uma fêmea a montar a outra, um comportamento geralmente observado entre pares de sexos diferentes. As conclusões dos estudos sugerem que, embora este comportamento não tinha fins reprodutivos, poderá promover a ovulação. 

Uma relação tóxica? Os besouros que oferecem veneno às parceiras

O composto venenoso cartaridina, segregado por várias espécies de besouro, é tóxico para mamíferos se ingerido 

Oferecer bombons em datas especiais é sempre romântico, mas os besouros da espécie Neopyrochroa flabellata atrevem-se a ir mais longe: segregam uma substância tóxica e oferecem-na à fêmea, que a despeja nos ovos após a reprodução e garante que se tornem imunes a ataques de predadores. 

Este estranho ritual é tão crucial para a sobrevivência da espécie que a fêmea pode mesmo recusar-se a copular com o macho se ele não segregar cantaridina em quantidade suficiente. Então, prova a substância gordurosa diretamente da glândula na cabeça do macho - se satisfeita, aceita continuar com o processo de acasalamento e consome ainda mais cantaridina através do sémen do parceiro, para depois a a "vomitar" nos ovos do casal. 

Quanto aos humanos, o melhor é mesmo ficar pelos bombons. A cantaridina foi usada para fins diuréticos e afrodisíacos desde os tempos da Grécia Antiga, mas a medicina moderna proíbe agora medicamentos à base da substância devido ao elevado risco de intoxicação. 

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