“Neste momento, estamos a conversar, quer com a associação de inquilinos, quer com a associação de proprietários, para ver como é que distribuímos o esforço entre o proprietário, o inquilino e o Estado também”.
A frase é de António Costa na entrevista dada na segunda-feira à TVI e CNN Portugal, onde garantiu que 2024 não traria um travão idêntico ao aplicado este ano nas rendas, de 2%. Então, o que esperar? A medida concreta dependerá da negociação com as partes interessadas, apontou Costa.
Só que as associações de proprietários e inquilinos descartam ter tido qualquer contacto direcionado para definir essa solução. À CNN Portugal, lembram que existiu apenas uma reunião no final de setembro com a ministra da Habitação Marina Gonçalves, que serviu para traçar o retrato das principais ansiedades do setor.
Soluções concretas sobre como vão aumentar (ou não) as rendas em 2024? Nenhuma, dizem a Associação Nacional de Proprietários (ANP), a Associação Lisbonense de Proprietários (ALP) e a Associação dos Inquilinos Lisbonenses (AIL).
“No que nos diz respeito, essa informação não é correta”, reage António Frias Marques, porta-voz da ANP. “Da nossa parte, não fomos contactados”, reforça Luís Menezes Leitão da ALP. Da mesma associação, Diana Ralha confirma este cenário e fala num “simulacro de negociação que não está a existir”.
Já do lado dos inquilinos, António Machado, secretário-geral da AIL, responde desta maneira sobre a reunião tida no ministério da Habitação: “Não foi uma negociação do tipo ‘eu dou um, tu dás dois’”.
Senhorios: queremos subir a renda, o Estado que apoie os inquilinos
Para os senhorios, a posição é clara: é para aplicar a lei. E, logo, uma subida de 7% nas rendas em 2024. O Estado, dizem, é que tem de compensar as famílias que fiquem mais frágeis com os aumentos.
“Está previsto, desde 2015, um subsídio de renda para os inquilinos que provem que não podem pagar a renda. A grande solução é essa”, diz António Frias Marques.
Já Diana Ralha da ALP lembra que a associação apresentou 12 propostas ao Governo em matéria de habitação. “A expectativa da ministra era de que as associações estavam dispostas a que o Governo não aplicasse a lei. E não estão...”, recorda.
Então, como se vai distribuir o esforço? “O esforço não tem de ser distribuído. Tem de ser o Estado a absorver o esforço. O Estado tem de apoiar as pessoas que efetivamente precisam”, resume, lembrando os apoios diretos a inquilinos cuja renda exceda os 35% de taxa de esforço após a atualização.
Os proprietários avisam que, neste contexto de incerteza, “toda a gente foge do arrendamento” ou passa a aplicar o “preço do risco associado”, necessariamente mais elevado.
Uma das opções em cima da mesa para as rendas seria uma solução semelhante à encontrada para o crédito à habitação, num registo de moratória no que respeita aos aumentos. “Levámos com as moratórias na covid-19 e ainda há rendas que estão a ser pagas desde essa altura”, descarta Diana Ralha.
Inquilinos: não subam a renda, o Estado que apoie os senhorios
Se os senhorios não estão descansados, os inquilinos também não. António Machado, secretário-geral da AIL, argumenta que qualquer subida nas rendas pode asfixiar ainda mais as famílias.
O anúncio de Costa de que não haverá um travão como o deste ano é “grave”, diz. “E não o podemos chamar travão, chamamos contenção, porque o travão é 0%”. Seria esse o número desejado pelos arrendatários.
Mas, como é preciso “distribuir o esforço” – palavras de Costa –, existem diferentes caminhos possíveis para que pese menos no lado de quem arrenda casa. Para os inquilinos, além de serem mantidos os apoios às rendas, o Governo deveria compensar os “senhorios particulares que comprovadamente necessitam de apoio” pela subida que não conseguiriam aplicar na íntegra.