Os principais bancos faturaram quase dois mil milhões de euros só com juros no primeiro trimestre do ano e vão a caminho de um novo ano histórico, após terem lucrado 920 milhões no primeiro trimestre. Porém, nem tudo são rosas: fugiram mais de sete mil milhões em depósitos e a carteira de crédito já está a encolher. São os primeiros sinais dos desafios que vão ter no futuro.
Em todo o caso, o momento é muito positivo para os cinco maiores bancos nacionais: Caixa Geral de Depósitos (CGD), BCP, Santander Totta, BPI e Novobanco lucraram mais de 10 milhões por dia durante os três primeiros meses do ano, de acordo com os dados compilados pelo ECO. O banco público teve o maior resultado: 285 milhões. O BPI registou o mais baixo: 85 milhões.
Este desempenho atirou o setor para rentabilidades acima dos dois dígitos, quando ainda há pouco tempo era zero. Veja-se o caso do Santander e do Novobanco, onde o ROE atingiu os 20%, que é o dobro da referência no mercado. O banco da Lone Star é mesmo o mais rentável, depois do longo caminho das pedras nos últimos anos e em que beneficiou de injeções de mais de três mil milhões do Fundo de Resolução.
Resultados e ROE no primeiro trimestre de 2023
Com as comissões praticamente a estabilizarem, rondando os 608 milhões de euros, o grande impulso dos resultados dos bancos veio da margem financeira, que resulta da diferença entre o que pagam nos depósitos e o que cobram nos empréstimos. As receitas com juros praticamente duplicaram face há um ano, atingindo 1,99 mil milhões de euros.
Neste capítulo, BCP e Caixa ganharam ambos mais de 600 milhões em margem financeira, aumentando 43% e 130% face há um ano, respetivamente. Mas também no BPI e Novobanco a margem quase duplicou.
O que acontece é que, depois de um longo período penoso por conta dos juros baixos, o negócio da banca vai agora de vento em poupa com a inversão da política monetária do Banco Central Europeu (BCE) para controlar a escalada da inflação.
No caso português, o facto de 90% do mercado de crédito à habitação ter taxa variável está a funcionar como um autêntico trampolim para a margem financeira dos bancos nacionais, mas também os deixa sob pressão para apoiar as famílias em dificuldades – o Presidente da República pediu uma reflexão ao setor – e também para remunerarem devidamente os depósitos – Portugal tem a segunda taxa mais baixa na Zona Euro. E não é só por causa da fuga para os certificados.
Margem financeira dispara
Pressão nos depósitos e no crédito
Aliás, as intervenções do próprio regulador têm sinalizado isso mesmo. Na semana passada o governador do Banco de Portugal considerou ser “desejável” que os bancos continuem o processo de subida dos juros dos depósitos, até para que a política monetária do BCE funcione com maior impacto – isto é, incentive as famílias a pouparem mais e a reduzirem o consumo, para aliviar a pressão sobre os preços.
Por outro lado, a Caixa deu um sinal importante ao mercado, com Paulo Macedo a anunciar que estuda duas medidas – bonificação complementar de juros e fixação da prestação – para aliviar o impacto da subida dos juros nas famílias que já não têm condições para pagar os seus empréstimos da casa. O BCP diz que “não tem cartas mangas”, mas está atento às palavras de Marcelo.
Para os bancos, aumentar os juros dos depósitos ajudará a responder às saídas de poupanças que tiveram no primeiro trimestre, na ordem dos 7,4 mil milhões de euros. Os Certificados de Aforro tornaram-se moda, mas não é a única explicação que os bancos dão para este cenário. Também há muitas famílias e empresas que estão a aproveitar as poupanças acumuladas durante a pandemia para amortizarem antecipadamente o crédito ao banco, com o objetivo de fazer baixar a fatura mensal.
Bancos perdem 7,2 mil milhões em depósitos
Esta situação leva a outra. Com a incerteza a abrandar a procura de crédito – tirando as renegociações de crédito, o mercado já está a cair –, os reembolsos de dívida antecipados estão a dar origem a um novo fator de pressão para o negócio: a partir do momento em que se dá a amortização, já não há volta atrás, enquanto nos depósitos a situação pode ser invertida com uma taxa de juro mais generosa do que aquela que oferecem atualmente.
O primeiro trimestre já deixou uma primeira amostra do desafio que espera os bancos: a carteira de crédito encolheu mais de 1% para 182,7 mil milhões de euros.
Sem sinais de incumprimento
Na Caixa já foram reestruturados 8.000 créditos, no BCP cerca de 6.500 e no BPI quase 2.000. O CEO do Novobanco disse aos analistas que ainda não tem sinais de alerta relativamente ao número de famílias em dificuldade em pagar o crédito da casa.
Os balanços do banco contam-nos que o malparado continuou a cair no primeiro trimestre do ano, apesar do contexto mais difícil não só por conta da subida dos juros, mas também pelo aumento do custo de vida. Na Caixa, o rácio de malparado baixou para 2,5%, no BCP caiu para 2,1% e no BPI manteve-se nos 2%. O Novobanco tem (historicamente) o rácio de NPL mais elevado: 4,4% no final de março, mas baixando 1,3 pontos percentuais em relação a março do ano passado.