Em outubro de 2021, a família Silva pagava uma prestação mensal ao banco de pouco mais de 450 euros por um crédito à habitação de 150 mil euros, a 30 anos, indexado à Euribor 12 meses e com um spread de 1%.
As taxas Euribor estavam, por essa altura, em valores negativos e a taxa de inflação na zona euro era de 4,1%, já acima do objetivo de 2% definido pelo Banco Central Europeu (BCE). Mas em Frankfurt, na Alemanha, a líder do BCE, Christine Lagarde, mantinha que a subida dos preços era “transitória”.
Já em novembro e em Lisboa, numa entrevista à CNN Portugal, a líder do BCE dizia mesmo que não estava a ver aumentos das taxas de juro em 2022. “Está fora de questão”, garantia Lagarde.
Apesar da garantia, nos mercados financeiros, a convicção de que as taxas de juro do BCE iriam mesmo subir tinha reflexos. E a média mensal das Euribor de janeiro de 2022 já registavam uma primeira subida que, desde então, praticamente não voltou a parar.
NOTA | O que são as taxas Euribor
Euribor é a abreviatura de Euro Interbank Offered Rate. As taxas Euribor baseiam-se nas taxas de juro que um conjunto de bancos europeus está disposto a pagar para emprestar dinheiro uns aos outros. No cálculo, os 15% mais altos e mais baixos de todas as cotações recolhidas são eliminados. As restantes taxas são calculadas como média e arredondadas a três casas decimais. O valor das taxas Euribor é determinado e publicado diariamente. Existem cinco taxas Euribor diferentes, todas com diferentes maturidades (uma semana, um mês, três meses, seis meses e 12 meses).
O tempo ia passando e, em junho de 2022, a taxa de inflação na zona euro atingia os 8,6%. No mês seguinte, pela primeira vez em 11 anos, o BCE subia as suas taxas diretoras em 50 pontos base. Desde então, os juros do BCE ainda não pararam de subir.
NOTA | O BCE tem três taxas de juro de referência:
- A taxa das principais operações de refinanciamento, sob a qual os bancos podem contrair empréstimos junto do BCE pelo prazo de uma semana: está nos 4,50%, mas esteve fixada em zero entre março de 2016 e julho do ano passado;
- A taxa de depósito, que determina os juros que os bancos recebem pelos depósitos realizados junto do BCE: está em 4%. Mas entre julho de 2012 e junho de 2013 era de zero. E entre junho de 2013 e julho do ano passado era negativa, obrigando os bancos a pagar pelos depósitos que faziam no BCE;
- E a taxa de cedência de liquidez, que determina o juro que os bancos pagam quando contraem empréstimos junto do BCE pelo prazo de um dia (overnight). Está atualmente em 4,75%.
Em outubro de 2022, o contrato da família Silva foi revisto com base na Euribor de setembro desse ano. A Euribor tinha passado de um valor negativo para 2,233% e a prestação a pagar ao banco subiu para mais de 651 euros. Uma subida de mais de 44%.
No próximo mês, quando o crédito à habitação da família Silva voltar a ser revisto com base na Euribor deste mês, a taxa de referência já será de cerca de 4,145%. A prestação deverá subir para mais de 818 euros. Uma subida superior a 80% face à prestação que pagava há dois anos (450 euros).
O retrato da família Silva não difere muito das restantes famílias com crédito à habitação em Portugal que vão ter os seus contratos revistos no próximo mês. A generalidade dos aumentos na prestação a pagar ao banco desde que as taxas de juro começaram a subir ronda os 80%. E mesmo analisando a subida registada no último ano, a subida chega a ultrapassar os 40%.
Quanto já aumentou e quanto vai subir em outubro a prestação da casa:
Empréstimo a 30 anos com spread de 1%
EURIBOR A 3 MESES
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EURIBOR A 6 MESES
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EURIBOR A 12 MESES
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A boa notícia: o pior já terá passado
Apesar de a subida nas prestações a pagar ao banco ainda não ter parado, tem vindo a desacelerar e na base desta desaceleração está o comportamento das taxas Euribor que, apesar de continuarem a aumentar, registam aumentos cada vez menores. A Euribor a 12 meses, por exemplo, chegou a recuar de julho para agosto, mas voltou a aumentar em setembro, ainda que de forma pouco significativa. Já as Euribor a 6 meses e a 3 meses não param de aumentar desde janeiro de 2021, mas a um ritmo cada vez menos intenso.
Para o futuro, o mais expectável é que estas taxas venham a estabilizar à boleia da convicção que o BCE não voltará a aumentar as suas taxas de juro. Numa sondagem efetuada pela agência Reuters a 70 economistas, entre 15 e 18 de setembro, todos dizem acreditar que as taxas atingiram o seu valor máximo e que se deverão manter inalteradas até julho de 2024.
Segundo a mesma sondagem, existe apenas uma probabilidade de 20% de as taxas poderem voltar a subir. E para esse cenário se confirmar, os dados que serão conhecidos da inflação serão determinantes. Esta sexta-feira, o Eurostat, órgão estatístico da União Europeia, divulga a sua estimativa da inflação de setembro. E no próximo mês, dia 26, o BCE voltará a reunir-se para decidir se mantém, ou não, inalteradas as suas taxas diretoras.