O encontro que terá mudado a relação no trabalho e a argentina que já tinha denunciado publicamente. Novas acusações contra Boaventura de Sousa Santos [atualização] - TVI

O encontro que terá mudado a relação no trabalho e a argentina que já tinha denunciado publicamente. Novas acusações contra Boaventura de Sousa Santos [atualização]

Boaventura de Sousa Santos (Universidade de Coimbra)

Duas mulheres, uma brasileira e uma argentina, afirmam ter sido assediadas durante visitas a Portugal e mesmo uma professora da universidade estará disposta a testemunhar

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Três antigas investigadoras do Centro de Estudos Sociais (CES) de Coimbra acusaram Boaventura de Sousa Santos de assédio sexual, mas o caso pode não ficar por aí. Depois da denúncia feita num artigo, há mais mulheres a fazer relatos semelhantes contra o diretor emérito daquele instituto.

[artigo atualizado às 18:15, depois de recebidas novas informações sobre o alegado caso da professora universitária disposta a colaborar com as autoridades. Este caso terá tido origem num email falso em nome da docente

Nega terá levado a consequências no trabalho

Tocou-lhe no joelho, convidou-a a “aprofundar a relação” e depois colocou-a de parte. Este é o desenrolar da acusação que uma investigadora brasileira que trabalhou no CES faz a Boaventura de Sousa Santos. Na altura, em 2014, ela tinha menos de 30 anos, ele tinha mais de 70.

A história desta mulher consta no artigo que revela casos de alegado assédio moral e sexual cometidos pelo professor universitário no âmbito do exercício da sua função, neste caso com uma mulher que saiu do Brasil de propósito para trabalhar com o docente, que tinha uma grande reputação no seu país, e que era o diretor emérito do CES.

O caso “limite” não aconteceu nas instalações da universidade, mas antes na casa do sociólogo. Terá sido lá que Boaventura de Sousa Santos acariciou o joelho da mulher, prometendo-lhe “portas abertas” caso ambos aprofundassem a “relação pessoal”.

O local do encontro foi escolhido pelo professor, que tinha acabado de aceitar orientar um trabalho da investigadora. Respondendo-lhe ao email com a solicitação, Boaventura de Sousa Santos sugeriu que ambos se encontrassem em sua casa. A mulher aceitou.

Segundo relata agora a alegada vítima, aquilo que devia ser uma reunião de trabalho começou logo de forma estranha: o professor recebeu-a com bebidas alcoólicas, que ela recusou. O homem terá passado entrão para outras investidas, levando nova recusa. “Acho que confundiu as coisas”, terá dito a mulher, que de seguida abandonou a casa, mudando de vez a perceção que tinha de Boaventura de Sousa Santos, de quem tinha ouvido falar através de um livro da coleção “Ecologia de Saberes”.

“Li aquilo e fiquei admirada e isso fez-me tomar a decisão de fazer o intercâmbio estudantil na altura da graduação para Portugal”, conta ao jornal Observador, explicando que a publicação a fez “querer fazer um doutoramento” no CES.

No dia a seguir ao encontro, a relação tinha mudado. Numa reunião entre a alegada vítima, o seu ex-companheiro (também estudante de doutoramento) e o professor, Boaventura de Sousa Santos "criticou de forma muito agressiva o trabalho que vínhamos fazendo", conta a mulher ao jornal Público, revelando que a situação levou mesmo o então seu companheiro a chorar.

"O assédio que era sexual tornou-se [assédio] moral", acrescenta.

A mulher tentou procurar ajuda junto da universidade, queria denunciar formalmente o caso, mas o coordenador do curso fechou-lhe as portas. "Infelizmente, o Boaventura é brilhante, mas tem destas coisas", terá dito o responsável à alegada vítima, que ainda procurou mulheres que a pudessem ajudar, mas ouviu a mesma resposta: "Ele é assim, sabemos de outros casos, mas não sabemos o que fazer".

"A vida académica delas estava atrelada e condicionada por aquele sistema de poder", afirma hoje em dia.

Um ano depois estava de volta ao Brasil, onde concluiu o seu doutoramento. Em 2019, e cinco anos após o caso, recebeu um email do próprio Boaventura de Sousa Santos, que ia estar em Bahia e queria estar com ela. Ela concordou em encontrar-se para uma reunião, mas o que o professor queria era pedir-lhe desculpas, aproveitando para tirar a limpo se a mulher tinha alguma coisa a ver com os grafitis que surgiram em paredes de Coimbra, em que se podia ler o nome do professor e a mensagem "Todas Sabemos". Ao Observador, a mulher garante que não esteve por detrás do caso, do qual só soube em 2019, quando o docente lhe mostrou as fotografias.

No mesmo encontro, Boaventura de Sousa Santos afirmou-se vítima da "cultura de cancelamento", argumentando que tinha agido por impulso dos seus sentimentos. A mulher recusou o pedido de desculpas, e hoje relembra a falta de ajuda: "Aquilo de que tinha precisado anos antes era de uma orientação para fazer uma denúncia formal".

A mediatização deste caso já levou a imprensa brasileira a recordar uma denúncia que na altura passou despercebida. Em junho de 2022, a argentina Moira Ivana Millán, hoje com 53 anos, acusou publicamente Boaventura de Sousa Santos de assédio sexual.

Tudo aconteceu num vídeo partilhado no Instagram por uma associação de mulheres indígenas, e no qual a investigadora denuncia o diretor emérito do CES. Ao longo de vários minutos, a ativista conta que viajou para Coimbra a convite do professor para dar uma aula de uma pós-graduação. "Convidou-me para jantar num lugar onde estávamos sozinhos. Começou a beber e chamou-me para ir ao seu departamento para buscar uns livros que me ia emprestar. Quando fui ao departamento atirou-se para cima de mim", afirmou.

Moira Ivana Millán explicou que o caso terá ocorrido em 2010, apelidando Boaventura de Sousa Santos de "machista e violento", defendendo o facto de não ter feito nenhuma denúncia com o medo de ser marginalizada. "Seria vista como uma mulher mapuche", em vez de uma académica. "Quando voltei de Coimbra para Lisboa, devastada, um argentino disse-me para não dizer nada, pois ele é o guru do pensamento de esquerda em Portugal e, na Argentina, ninguém acreditaria em mim", lembrou.

Boaventura de Sousa Santos avança com queixa

O sociólogo Boaventura de Sousa Santos anunciou, entretanto, que vai avançar com uma queixa-crime contra as três investigadoras que denunciaram as alegadas situações de assédio sexual e moral no CES.

Num documento enviado a toda a comunidade do CES intitulado “Diário de uma difamação”, a que agência CNN Portugal teve acesso, o diretor emérito da instituição afirma que irá apresentar “uma queixa-crime por difamação contra as autoras” de um artigo em que acusam Boaventura de Sousa Santos e o investigador Bruno Sena Martins de usarem o seu poder sobre jovens estudantes e investigadoras para "extrativismo sexual".

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