Pode ser uma boa notícia para os que estão cansados do ressonar do parceiro ou que sofrem de distúrbios do sono. De acordo com um estudo publicado este ano pelo organismo americano dedicado ao estudo do sono (The Better Sleep Council), dormir em camas separas pode ser uma solução para problemas de insónias e outros, mas também para o próprio casamento.
"Embora dormir com um parceiro possa intensificar sentimentos de apego e amor, também pode afetar negativamente a qualidade do sono, o que pode causar problemas no relacionamento", referem os autores do trabalho sublinhando o impato que pode ter: "Quando não dormimos bem, o nosso estado emocional fica alterado, ou seja, ficamos mais irritados, mais ansiosos, com mais alterações de humor e menos empáticos e tolerantes, e isso gera consequências às pessoas mais próximas de nós: os nossos filhos e os nossos parceiros. Muitas discussões, brigas e até divórcios se devem a não dormir bem".
Segundo explicou à CNN Portugal a psicóloga e terapeuta de casal Catarina Lucas dormir em camas separadas pode fazer sentido. "Um casal dormir separado pode ser útil quando há perturbações do sono, como o estudo explicita é protetor para a saúde mental de ambos", diz, frisando que ao preservarmos a nossa noite de descanso, o resto vai funcionar melhor. "Esta é a ideia chave, é válida e verdadeira", salienta.
A prática, conhecida como "divórcio do sono" está, aliás, a ser adoptada por muitos casais, segundo aquele estudo, por ser a forma de equilibrarem o sono e a relação. Catarina Lucas sublinha que simples facto do companheiro ressonar alto pode perturbar o sono do outro o que interfere negativamente com humor. “O estado de irritação e às vezes até ansiedade tem impactos na vida do casal”, alerta, garantindo que ao não se dormir pode colocar-se me causa o funcionamento individual e a vida em conjunto.
O “divórcio do sono” também marca o que os especialistas designam de diferenciação. Ou seja, assinala a individualidade de cada pessoa dentro de um relacionamento. “Cada pessoa determina o seu território na cama, algumas têm uma certa posição para dormir e gostam de ter o seu próprio espaço”, diz a psicóloga, considerando que há pessoas muito “gulosas” do seu espaço e por isso compensa dormirem afastadas.
Contudo, avisa Catarina Lucas, existem determinadas desvantagens do ponto de vista da intimidade. “Nós associamos o dormir com alguém uma questão de conforto, proximidade, afeto e a sexualidade também está relacionada”, especifica, destacando que existe uma ideia romântica e simbólica em redor do conceito de dormir juntos.
Por este motivo, a terapeuta de casal explica que há duas perpetivas a ter em conta na hora de decidir: dormir em quartos separados pode ser útil quando há perturbações do sono o que é benéfico para ambos, mas, por outro lado, pode desenvolver sentimentos de afastamento e interferir na intimidade do casal.
Um artigo do jornal El Pais, em que é referido este estudo, explica que na sociedade britânica esta prática do “divórcio do sono” é algo frequente, essencialmente na classe alta. É o caso, por exemplo, de Elizabeth II e o príncipe Philip que dormiam separados segundo a biografia Elizabeth the Queen: The Life of a Modern Monarch., citada pelo jornal, que ainda lembra o que a prima do príncipe, Lady Pamela Hicks, escreveu em Woman and Home: “Na Inglaterra, a classe alta sempre teve quartos separados”.
Sobre este comportamento da aristocracia britânica, Catarina Lucas refere que é completamente diferente da sociedade portuguesa, onde dormir em quartos separados não é muito habitual. “A forma como os britânicos demonstram afeto é diferente, costuma-se dizer que são mais frios. São várias as hipóteses, mas de facto a componente histórica pode influenciar de alguma maneira”, diz, considerando que pode ter a ver com a maneira como as pessoas se relacionam umas com as outras.
Em Portugal, a especialista afirma ser algo raro e que ocorre principalmente com pessoas mais velhas que têm condições médicas associadas ao sono e que por isso optam por dormir em quartos separados . “Nas sociedades ocidentais, não é algo tão comum de acontecer. Realmente o fator principal envolve motivos de saúde”, frisa, explicando que a sociedade portuguesa dá muita importância aos valores simbólicos. “Devido às crenças que temos associadas ao dormir juntos, as pessoas não abdicam disso. São valores muito enraizados nos portugueses”, afirma, indicando que estes valores simbólicos tratam-se da longevidade do casal e o partilhar aquele momento juntos antes de adormecer.
Apesar disso, a psicóloga Catarina Lucas lembra que há benefícios em dormir em cama separadas, como o de trazer uma melhor qualidade do sono e libertar a irritação que costuma surgir quando não se dorme bem e que afeta o relacionamento. E deixa uma certeza: “É possível ser feliz dormindo separados, embora não seja a escolha prioritária da maioria das pessoas devido aos valores simbólicos tão enraizados na sociedade portuguesa”.