O Japão inicia esta semana a descarga no oceano de milhares de toneladas de água tratada da central nuclear de Fukushima, anunciou o primeiro-ministro japonês, Fumio Kishida, após uma reunião do governo.
Se as condições climatéricas o permitirem, a descarga começa já esta quinta-feira, antecipou Fumio Kishida, de acordo com o jornal New York Times.
Apesar de a Agência Internacional de Energia Atómica garantir que o procedimento está em linha com os padrões de segurança da agência e que, por isso, a descarga de água provavelmente não colocará nenhum risco para a saúde pública, alguns cientistas têm manifestado algumas preocupações. Desde logo, duvidam que o governo japonês e a empresa responsável pela central nuclear, a Tokyo Electric Power, estejam a ser totalmente transparentes sobre que tipo de material radioativo pode estar nos tanques de retenção.
De acordo com o site da Tokyo Electric Power, apenas 30% de 473 mil toneladas de água armazenada nos tanques foi tratada. "A ideia é apenas 'confiem em nós'", ironizou Ken Buesseler, um especialista em radioquímica da Woods Hole Oceanographic Institution, citado pelo NYT.
Tendo em conta a relutância dos cientistas, o governo chinês advertiu esta terça-feira que vai tomar "todas as medidas necessárias" para salvaguardar os oceanos, a saúde pública e a segurança alimentar. Também da Coreia do Sul surgem vozes de oposição à descarga de água, bem como do próprio Japão, nomeadamente entre grupos dedicados à pesca.
Estando ciente dessas preocupações, Fumio Kishida visitou a central nuclear na segunda-feira e reuniu-se com líderes da indústria da pesca local, a quem prometeu que a atividade dos pescadores não vai ficar em risco após a descarga de água. Masanobu Sakamoto, presidente da Federação Nacional das Associações Cooperativas de Pesca, foi um dos responsáveis da indústria convidados para a reunião com o primeiro-ministro. Embora muitos dos seus membros tenham aceitado as garantias do governo, Sakamoto continua a opor-se à descarga de água, manifestando preocupações com os potenciais impactos da mesma para a indústria.
As associações nacionais de atividade piscatória admitem mesmo ter receio de que, assim que a água for libertada, tanto a população doméstica como os clientes internacionais deixem de procurar o peixe da região.
Ainda assim, o governo japonês não cede, até porque está numa corrida em contrarrelógio desde março de 2011, quando o país foi atingido por um sismo seguido de um tsunami que devastou a central nuclear de Fukushima. De acordo com as previsões do governo, em 2024 a central deverá ficar sem espaço para armazenar cerca de 1,33 milhões de toneladas de água proveniente de chuva, água subterrânea ou injeções necessárias para arrefecer os núcleos dos reatores nucleares que entraram em colapso em 2011. O executivo estima que a descarga de água possa prolongar-se ao longo de 30 anos.
Mas nem todos estão contra o plano do Japão. Aliás, os próprios Estados Unidos, representados pelo secretário de Estado, Antony Blinken, já vieram a público manifestar satisfação com a forma como o governo japonês está a planear esta descarga. Também a União Europeia já veio demonstrar apoio ao executivo de Fumio Kishida, ainda que de forma mais subtil - levantou em julho todas as restrições às importações de peixe e de produtos agrícolas da região de Fukushima, que estavam bloqueadas desde a crise nuclear.
Embora a Coreia do Sul mantenha as importações de produtos de marisco das águas ao largo de Fukushima, o presidente sul-coreano, Yoon Suk Yeol, manifestou apoio ao plano do governo, o que não caiu bem aos partidos da oposição, que o acusam de defender o Japão "como um papagaio".
“Não podemos permitir que uma política governamental crucial para a vida e segurança das pessoas seja decidida pelo sentimento pessoal de amizade e intimidade do presidente em relação ao Japão”, argumentou Lee Byunghoon, um advogado da oposição, citado pelo New York Times.
Por sua vez, o governo chinês tem sido especialmente crítico em relação ao plano do Japão e rejeitou o relatório da Agência Internacional de Energia Atómica que garante a segurança do procedimento, considerando-o uma prova insuficiente de que a descarga não apresenta riscos para a saúde pública. O anúncio de que o plano vai mesmo avançar enfureceu alguns internautas, que apelaram a um boicote aos bens importados do Japão.
"O Japão iniciou uma nova forma de guerra nuclear. Deveríamos rejeitar os produtos e restaurantes japoneses”, podia ler-se num dos comentários de um artigo lançado pela Mengma News, um site de notícias local, da província chinesa de Henan.