Come chocolate negro por ser "mais saudável"? Atenção a isto (com dicas para escolher o melhor) - TVI

Come chocolate negro por ser "mais saudável"? Atenção a isto (com dicas para escolher o melhor)

Chocolate (Nerudol/Adobe Stock)

Uma equipa de investigadores encontrou elevados níveis de metais pesados em diversas tabletes de chocolate de várias marcas

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Se costuma optar pelo chocolate negro no momento em que lhe apetece algo doce, por ser aparentemente a opção “mais saudável”, há um estudo que vem contrariar essa ideia. A investigação, divulgada em dezembro passado pela Consumer Reports, revela que este tipo de chocolate contém substâncias tóxicas associadas a várias doenças, nomeadamente doenças ósseas e cardiovasculares e até o aumento do risco de cancro.

Partindo de uma análise a 28 tabletes de chocolate negro (de 21 marcas), uma equipa de investigadores descobriu níveis elevados de cádmio e chumbo em diversas marcas, da Lindt à Hershey's. Para avaliar o risco destes chocolates para a saúde, os investigadores utilizaram a dose máxima destes metais pesados permitida pelas autoridades reguladoras na Califórnia - 0,5 microgramas de chumbo e 4,1 microgramas de cádmio - por considerarem que é naquele estado norte-americano que "os níveis [daqueles metais] oferecem mais proteção".

Os resultados mostraram que comer apenas um quadrado de chocolate de 23 das 28 tabletes analisadas colocaria um adulto acima da dose máxima de pelo menos um dos metais pesados permitidos pelas autoridades de saúde. A tablete da marca Green & Black's de chocolate orgânico com 70% de cacau foi a que registou os níveis mais elevados dos dois metais pesados (143% de chumbo e 181% de cádmio), enquanto a tablete da marca Mast de chocolate orgânico com 80% de cacau foi considerada a "mais segura", com 14% de chumbo e 40% de cádmio.

A descoberta não surpreende as nutricionistas contactadas pela CNN Portugal, que apontam a inevitabilidade de encontrar estes metais pesados na cadeia alimentar. Isto porque tanto o chumbo como o cádmio estão naturalmente presentes no meio ambiente e acabam por contaminar os alimentos em diferentes estágios da cadeia alimentar, desde a degradação química do solo ao processo de armazenamento e preparação.

Assim, é "praticamente impossível" não encontrar produtos alimentares contaminados com estes metais pesados, admite a nutricionista Iara Rodrigues. De acordo com a nutricionista Magda Roma, os peixes e frutos do mar também são portadores de cádmio e chumbo, bem como os vegetais e legumes de produção intensiva, que estão suscetíveis à contaminação "devido ao uso intensivo de contaminantes e políticas ambientais limitadas", o que, por sua vez, contamina a ração de animais como vacas e porcos.

O que torna estes metais perigosos para a saúde é "a frequência e dose em que são consumidos", indica a nutricionista Lillian Barros, acrescentando que "existem chocolates com mais e menores teores destes metais", pelo que "fará todo o sentido procurar-se um que já tenha sido analisado e que apresente menores níveis". No site da organização As You Sow, é possível verificar os níveis de cádmio e chumbo em produtos de várias marcas de chocolate, com indicadores por cores - vermelho indica se os níveis dos metais estão acima da dose permitida pelo estado da Califórnia, enquanto o verde indica o contrário.

Os riscos do cádmio e do chumbo para a saúde

Embora a adoção de práticas sustentáveis na agricultura e pecuária possa contribuir para minimizar os riscos associados à presença destes metais pesados na cadeia alimentar, uma vez contaminados os alimentos, não há volta a dar - e há mesmo motivos para preocupações, sobretudo para os mais novos, advertem as nutricionistas.

"A presença de metais pesados nos alimentos pode realmente representar um risco para a saúde, dependendo do nível de contaminação e da frequência de consumo desses alimentos", confirma a nutricionista Daniela Duarte.

No caso do chumbo, de acordo com a nutricionista Iara Rodrigues, "uma vez absorvido, é transportado no sangue e distribuído para o cérebro, fígado, rins e ossos, onde persiste por mais de 30 anos". Nos adultos, a exposição crónica, isto é, a ingestão de baixas doses por longos períodos, pode provocar "doenças cardiovasculares com aumento da pressão arterial e danos nos rins". Além disso, também pode afetar o sistema nervoso e causar problemas reprodutivos.

Nas crianças, "os riscos são mais graves", aponta a nutricionista. "Na fase de desenvolvimento do cérebro (desde a formação do feto até os primeiros 6 anos de vida), a exposição crónica ao chumbo causa perda auditiva progressiva, fadiga crónica e lentidão, défice de aprendizagem e redução do quociente de inteligência (QI), possíveis comportamentos antissociais e síndrome de TDAH (défice de atenção e hiperatividade)."

Já a ingestão de pequenas doses de cádmio por muitos anos "pode causar problemas renais, hipertensão, doenças cardiovasculares, osteoporose", além de aumentar o risco de cancro. "As crianças parecem estar sujeitas aos mesmos riscos que os adultos, como uma fraqueza óssea mais acentuada. No entanto, faltam estudos sobre a toxicidade do cádmio nas fases iniciais da vida", ressalva Iara Rodrigues.

Devo deixar de comer chocolate negro?

Apesar de todos estes potenciais riscos, as nutricionistas acreditam que a solução não passa por eliminar o chocolate negro da dieta, até porque o cacau está associado a alguns benefícios para a saúde, como explica Daniela Duarte: "O chocolate contém cacau que, por sua vez, contém polifenóis, em particular as catequinas e epicatequinas, substâncias com capacidades antioxidantes e protetoras das células."

Mas o chocolate também contém açúcar e gordura saturada, principalmente devido à manteiga de cacau. Além disso, é "densamente calórico", razão pela qual "deve ser consumido com moderação", recomenda a nutricionista.

"Não é necessário parar de consumir chocolate negro completamente. No entanto, torna-se importante verificar a proveniência do chocolate, assim como informações acerca do teor de metais pesados presentes no produto antes de consumir", resume Daniela Duarte.

A palavra-chave aqui parece ser precisamente a "moderação", uma vez que todas as nutricionistas concordam que o consumo "pontual" e "excecional" é mais benéfico do que a ingestão diária e permanente de chocolate negro. Assim, a ideia generalizada de que comer um quadrado de chocolate por dia não faz mal, sendo até benéfico, pode não ser assim tão correta. Pelo menos, não para toda a gente.

Para a nutricionista Lillian Barros, esta regra "depende sempre de caso para caso, nomeadamente se existe alguma patologia, como a diabetes, ou se há o consumo de outros alimentos igualmente ricos em calorias, gordura e açúcar, bem como de cádmio e chumbo". "Apenas com base nestas individualidades podemos definir uma dose diária aceitável", sustenta.

Também a nutricionista Magda Roma defende que "não há regra para consumir chocolate diariamente", mas não exclui um consumo "esporádico" caso se trate de um chocolate com "cacau originário de um país com regras e controlo de qualidade" e de "produção biológica, reduzindo significativamente a contaminação por parte da utilização de alguns agrotóxicos (não estando isentos devido às contaminações ambientais)".

Por sua vez, a nutricionista a Iara Rodrigues diz concordar com a regra de comer um quadrado de chocolate por dia, equivalente a 25 ou 30 gramas, considerando esta dose "suficiente para satisfazer a necessidade de comer um doce".

Tendo em conta que os investigadores aconselham a alternar entre chocolates com diferentes percentagens de cacau, a nutricionista recomenda a substituição do cacau por alfarroba, "um produto bem português", que segue "políticas ambientais e de controlo de produção completamente diferentes às dos países onde é produzido a maioria do cacau", além de ser rico em antioxidantes e fibra e ter "um sabor igualmente delicioso".

Qual o chocolate mais saudável?

Na hora de comprar um chocolate saudável para saciar o desejo de algo doce, não basta escolher entre o chocolate amargo ou de leite - é preciso ter em conta outros detalhes do rótulo, que podem passar despercebidos.

De acordo com a nutricionista Iara Rodrigues, o chocolate negro é mesmo "o mais interessante" entre as variedades disponíveis no mercado, desde que contenha níveis reduzidos dos metais pesados, não sendo possível encontrar uma opção sem contaminação.

Entre as diferentes opções de chocolate negro, há detalhes que fazem a diferença e para os quais devemos estar atentos, nomeadamente a lista de ingredientes. "Deve ter, no máximo, três ingredientes e o açúcar deve estar no fim da lista, indicando assim ter menos quantidade. Já o cacau ou pasta de cacau, deve ser o primeiro da lista", indica a nutricionista Iara Rodrigues.

Ainda sobre o cacau, as nutricionistas lembram que o chocolate é mais saudável quanto maior for o teor de cacau, uma vez que isso significa uma "menor quantidade de açúcar e outros ingredientes adicionados". "Por isso se recomenda que contenham acima de 70% de cacau", sustenta Iara Rodrigues.

Além disso, acrescenta, "quanto menos gordura tiver, melhor - e essa gordura deve ser proveniente da manteiga de cacau". No entanto, ressalva a nutricionista, "vai ser difícil encontrar percentagens de gordura abaixo de 40 ou 50%". 

É importante também optar por chocolates que não contenham ingredientes artificiais, nomeadamente conservantes, corantes e aromas artificiais.

A nutricionista Daniela Duarte recomenda ainda que opte pelo chocolate orgânico, uma vez que este "é produzido sem o uso de pesticidas e fertilizantes químicos, o que pode reduzir o risco de contaminação por metais pesados", como o cádmio e o chumbo. Da mesma forma, acrescenta, é importante "verificar a proveniência do chocolate", isto é, "devemos optar por escolher marcar confiáveis e produtos com informações claras acerca da origem do cacau utilizado na confeção do chocolate".

"Em caso de dúvida, olhe para a cor do chocolate. Evite os brancos, que são mais cremosos porque têm mais gordura, ou os que têm recheios, que são mais açucarados. No topo dos piores chocolates, estão os que contêm álcool", resume Iara Rodrigues.

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