Covid-19. Três anos depois do primeiro caso em Portugal, persistência de sintomas leva milhares às consultas - TVI

Covid-19. Três anos depois do primeiro caso em Portugal, persistência de sintomas leva milhares às consultas

Covid-19 (AP Photo/Andy Wong)

Nem todos estiveram internados ou apresentaram sintomas graves durante a infeção, mas muitos continuam com queixas, sobretudo respiratórias, e há quem precise mesmo de fazer reabilitação física. As consequências pós-covid são ainda várias e os hospitais públicos e privados tentam dar resposta a uma condição que ainda vive refém da incerteza e que tem levado milhares a procurar ajuda

As estimativas são assustadoras: entre 10% a 20% das pessoas infetadas com covid-19 pode desenvolver covid de longa duração, caracterizada pela persistência de sintomas após as 12 semanas, uma condição que a ciência ainda estuda, mas que já se assume incapacitante e pronta para colocar ainda mais pressão sobre o SNS. Em Portugal, o número de pessoas com covid de longa duração pode ascender aos 400 mil. Alguns hospitais já tomaram a iniciativa de criar consultas dedicadas a estes casos, mas a oferta ainda é limitada e confusa. Os especialistas pedem mais atenção a este tema e defendem a criação de uma rede organizada para fazer frente a esta sequela da covid-19.

A CNN Portugal contactou os vários hospitais que disponibilizam esta consulta e é possível perceber que o acompanhamento pós-covid anda a dois ritmos: algumas unidades de saúde públicas e privadas, como o Centro Hospitalar Universitário Lisboa Norte e o Hospital da Luz (ainda numa PPP com o Hospital Beatriz Ângelo), por exemplo, criaram a consulta ainda em 2020, muito focada no pós-alta, mas agora aberta até a quem não esteve internado. Outras unidades fizeram-no em 2021 ou apenas em 2022.

Quanto a números, não há uma contabilização oficial das pessoas que estiveram infetadas com SARS-CoV-2 e que, passadas 12 semanas, continuam com sintomas e procuraram ajuda para os colmatar, mas os dados facultados à CNN Portugal por alguns hospitais públicos dão conta de um total de 1.345 utentes acompanhados em consulta nestes três anos de pandemia - número que será certamente maior, já que algumas unidades hospitalares não responderam.

Já nos privados, tanto o Hospital da Luz como a CUF apresentaram apenas “números redondos” e que, somados, ultrapassam os quatro mil pacientes seguidos devido à persistência dos sintomas.

Gustavo Tato Borges, presidente da Associação Nacional de Médicos de Saúde Pública, olha para a questão da covid de longa duração com preocupação, não apenas na perspetiva médica e dos sintomas, algumas vezes incapacitantes, mas sobretudo do tratamento e do acesso ao mesmo - afinal, não são assim tantas as unidades hospitalares com consultas dedicadas e os cuidados de saúde primários continuam fragilizados e com escassez de médicos de família capazes de dar vazão a uma condição onde reina ainda a incerteza e que a própria ciência continua a estudar. 

Há uma incerteza muito grande sobre o pós-covid, há muitos estudos a serem feitos para perceber a dimensão do problema e as ramificações do problema, mas não estamos preparados, não sabemos o que vem aí, não temos noção de quantas pessoas vão precisar apoio, felizmente serão menos do que as que tiveram covid-19, mas pode ser um desafio pela duração da sintomatologia”, alerta, lamentando o facto de “não termos grande oferta terapêutica para algumas destas situações”.

Mas a questão não é apenas a terapêutica, que se pode e se vai adaptando a cada caso, a cada sintoma que persiste. A questão é que nem todos os hospitais portugueses oferecem este tipo de acompanhamento.

“Seria sempre interessante haver um plano organizado para estas questões, para o cidadão, independentemente de onde está, saber o que fazer e onde recorrer. Isso implica formação nos hospitais e médicos de família para saber reconhecer o que se passa com os utentes”, sublinha o médico de Saúde Pública.

Manuel Carmo Gomes, epidemiologista e um dos peritos que trabalhou de perto com a DGS durante a pandemia, acredita que o número de pessoas com covid prolongada é grande, mas não necessariamente grave, pois tudo depende dos sintomas que persistem. 

Numa estimativa conservadora”, diz-nos, considera-se que “pelo menos 10% das pessoas infetadas desenvolvam covid de longa duração”, por isso, desafia: “Basta pensar que tivemos cerca de quatro milhões de pessoas infetadas pelo menos uma vez e uma estimativa de 10% dá para ver a quantidade de gente.”

Contas feitas, só em Portugal seriam 400 mil. “Isso causa pressão no sistema hospitalar”, alerta o epidemiologista, salientando também a importância de se organizar “uma rede de consulta e apoio” para estes casos.

A persistência de sintomas após a infeção aguda por SARS-CoV-2 começou a fazer-se notar logo no verão de 2020, semanas depois dos primeiros casos de covid-19 no mundo. À data, afetava sobretudo quem desenvolvia doença grave, tinha estado internado e até entubado. Hoje o cenário é diferente: até quem teve infeção ligeira pode ficar com sintomas prolongados. E três anos depois do primeiro caso de covid-19 em Portugal, que foi a 2 de março de 2020, há ainda quem continue a sentir no corpo as marcas da pandemia.

Apesar de as pessoas mais idosas e com mais comorbidades serem as que têm maior risco de sofrer com a prevalência de sintomas, a covid prolongada afeta também jovens. (AP Photo/Nam Y. Huh)

Hospitais criam equipas multidisciplinares para milhares de doentes 

Segundo o relatório A Visão Geral da Saúde 2022, da Comissão Europeia e da OCDE, alguns, mas não todos, países da União Europeia, criaram consultas para o chamado pós-covid, ou covid de longa duração. “Portugal, Áustria e Letónia desenvolveram algoritmos clínicos nacionais, rotas de pacientes e recomendações de tratamento para pacientes suspeitos e confirmados de long covid”, exemplifica o documento.

Em Portugal, as consultas pós-covid seguem estratégias de terapêutica e avaliação definidas internamente em cada unidade hospitalar, seja pública ou privada, de acordo com as diretrizes da Direção-Geral da Saúde, que, há um ano, emitiu uma norma que define as linhas orientadoras de diagnóstico e de abordagem clínica da condição pós-covid-19. 

A médica Margarida Serrado está na consulta pós-covid do Hospital Pulido Valente, do Centro Hospitalar Lisboa Norte, que recebeu pacientes não só do Santa Maria, como de outras unidades hospitalares da capital. Tal como no Hospital da Luz, foi ainda em 2020 que foi criada a consulta de acompanhamento, primeiramente focada nas questões pulmonares, mas agora adaptada à nova realidade do pós-covid. 

Houve necessidade de organizar uma consulta para o acompanhamento posterior dos doentes mais graves. No início não fomos vocacionados para o acompanhamento e tratamento de todo o pós-covid, mas não quer dizer que não o tenhamos feito”, explica, frisando que são várias as especialidades médicas chamadas.

Nos quase três anos de acompanhamento após infeção aguda, continua a médica, foram realizadas 1.192 consultas, tanto iniciais como de seguimento, tendo sido avaliados “416 pacientes”. “A minoria são pacientes que não foram internados, a maioria são pacientes com patologia grave”, continua. 

Foi em março de 2021 que nasceu a consulta de Pneumologia pós-pneumonia covid-19 no Centro Hospitalar Universitário Cova da Beira. Ao todo, foram acompanhados 162 utentes em 332 consultas realizadas, mas esta unidade hospitalar da Beira Interior criou ainda, na mesma altura, a consulta de Medicina Pós-Covid, mais abrangente na tipologia de sintomas, tendo já sido seguidos 31 utentes num total de 61 consultas.

No Centro Hospitalar Barreiro Montijo, a consulta pós-covid foi criada em abril de 2021 e até ao final do ano passado foram acompanhados 235 doentes, num total de 591 consultas. Nesta consulta, que é realizada quinzenalmente, estão envolvidos um total de oito médicos especialistas em Medicina Interna e Pneumologia. Já no Centro Hospitalar de Leiria, a consulta pós-covid é focada na parte respiratória, estando sob a alçada da especialidade de Pneumologia. Foram já seguidos 204 doentes. Mas, tal como acontece noutros hospitais, em Leiria há também a consulta de Medicina Covid, que envolve outras áreas e especialidades, incluindo a Psiquiatria.

Miguel Toscano Rico, especialista em Medicina Interna e responsável pela Clínica Ambulatória pós-Covid (CAP-Covid) do Centro Hospitalar Universitário de Lisboa Central, tem estado desde o início da pandemia a prestar atenção ao pós-infeção, mas foi apenas em março de 2021 que esta clínica foi criada, tendo sido já “atendidos cerca de 450 doentes, referenciados a partir do internamento (70%), de outras especialidades hospitalares (20%) e da Medicina Geral e Familiar (10%)”, indica.

A equipa que compõe esta clínica é variada, tal como acontece com a generalidade das consultas pós-covid nas unidades hospitalares públicas e privadas. Para além de Pneumologia e Medicina Interna, conta ainda com profissionais de Neurologia, Cardiologia, Medicina Física e Reabilitação, Psiquiatria, Nutrição e Psicologia.

O Centro Hospitalar Universitário de Coimbra criou a consulta a 15 de março do ano passado e desde então “foram referenciados 85 doentes até ao final de 2022, tendo sido realizadas 145 consultas”. No final do ano passado, foi ainda inaugurada a unidade de Reabilitação Cardiorrespiratória no Hospital Geral do Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra (CHUC), um espaço focado nas especialidades de Fisiatria, Cardiologia e Pneumologia e onde alguns pacientes com sintomas pós-covid são acompanhados e fazem reabilitação, como noticiou a TSF.

A médica Sofia Furtado diz que mais recentemente têm chegado à consulta casos de persistência de tosse, às vezes devido a um agravamento da asma. (Pexels)

Quanto ao setor privado, desde que foi criada, em 2021, “só no Hospital CUF Tejo foram avaliados milhares de doentes” na consulta pós-covid “com o propósito de identificar potenciais impactos e necessidades de reabilitação após a infeção”, revela Vanessa Mendes, coordenadora de Medicina Geral e Familiar deste hospital. Outras unidades do grupo também disponibilizam esta consulta, havendo a sinergia entre especialidades médicas consoante os sintomas que persistem.

Em 2020, o [Hospital] Beatriz Ângelo teve uma afluência muito grande de doentes com covid-19, foi uma afluência brutal, percebemos rapidamente que precisávamos de dar resposta ao pós-alta e começámos ali a montar a consulta”, diz a médica Sofia Furtado. 

Sofia Furtado é agora diretora da Pneumologia do Hospital da Luz Lisboa, mas no começo da pandemia estava também no Hospital Beatriz Ângelo, na altura uma parceria público-privada com o grupo Luz Saúde. Ficou responsável por organizar a resposta pós-covid e é agora quem lidera a consulta na unidade privada.

“Tenho a particularidade de ter assistido ao impacto da doença quer num hospital público, quer num hospital privado, e posso dizer que em qualquer estrutura hospitalar o impacto da covid foi absolutamente dramático”, conta. 

A incerteza e o aumento do número de pacientes com queixas - e todas elas variadas -  levou a que o Hospital Beatriz Ângelo percebesse que iria “precisar de estruturar esta consulta” e fê-lo “em dezembro de 2020”. “Foi uma coisa relativamente precoce em relação à maior parte das consultas. E fizemo-lo de uma forma muito estruturada” e já em sintonia com o Hospital da Luz Lisboa, explica, revelando que na consulta são vários os especialistas que podem ser chamados a intervir, havendo agora também uma equipa de reabilitação focada para os casos mais severos. 

Quando questionada sobre números, Sofia Furtado diz que, em 2021, foram acompanhados “cerca de quase dois mil doentes na consulta no Hospital da Luz Lisboa e, depois, em 2022 não chegaram aos dois mil”, mas apressa-se a dizer que outras unidades do mesmo grupo, espalhadas pelo país, também têm esta consulta, o que engrossa, desde logo, os números mencionados.

No grupo Lusíadas, foram realizadas “cerca de 1.500 consultas”, não tendo sido, porém, avançado o número de pessoas atendidas. Na consulta pós-covid estão envolvidos médicos das especialidades de Medicina Geral e Familiar, Medicina Interna, Pneumologia, Cardiologia, Infeciologia e Medicina Física e Reabilitação.

Foram ainda pedidos dados ao Hospital Distrital de Santarém e ao Centro Hospitalar Universitário São João, mas não obtivemos resposta até à publicação deste artigo. A consulta dedicada ao pós-covid no Hospital Prof. Doutor Fernando Fonseca (Amadora-Sintra) foi extinta em dezembro de 2022 e os doentes com sequelas passaram a ser seguidos nas distintas especialidades, consoante a sintomatologia que persiste. 

Mais de 200 sintomas que levam meses a passar

A ciência diz que foram relatados mais de 200 sintomas pós-covid, sintomas esses que afetam todos os órgãos do corpo humano e que não se limitam entre si, derrubando até os sistemas imunitários mais fortes. A perda do paladar e do olfato - que para alguns foi apenas durante meros dias, para outros ainda persiste após semanas - e uma saúde mental mais fragilizada são exemplos da complexidade desta condição. 

Entre as queixas mais comuns nas consultas pós-covid, exemplifica o Centro Hospitalar Barreiro Montijo, estão “o cansaço, a dispneia para pequenos esforços, perda de memória, queda de cabelo”.

Miguel Toscano Rico, médico do CHULC, diz que na sua consulta “foram também muito frequentes a sensação de opressão/dor torácica, a falta de ar, a astenia (fraqueza generalizada) e a dificuldade de concentração/perda de memória”, a já chamada névoa mental (brain fog em inglês). “Além disso, tivemos também uma incidência considerável de sintomatologia depressiva, tosse persistente, entre outras”, acrescenta.

A variedade dos sintomas e da intensidade dos mesmos faz com que o tratamento seja, muitas vezes, multidisciplinar, mas sempre individualizado, variando, por isso, o tempo em que a pessoa é acompanhada. Em alguns casos, algumas semanas são suficientes para perceber qual a sequela ou sintoma persistente e atuar num tratamento eficaz, noutros, pode levar meses. 

No Centro Hospitalar Barreiro Montijo, por exemplo, o tempo médio de tratamento é de cinco meses. Já no CHULC, os pacientes ficam, em média, três meses a serem acompanhados, mas há casos que requerem mais tempo de recuperação. “Os doentes das primeiras vagas precisaram de acompanhamento muito mais prolongado e entre 5 e 10% destes continuam a ser seguidos”, adianta o médico Miguel Toscano Rico.

O grupo Lusíadas diz que o tempo de recuperação tem sido “variável”, algumas pessoas são seguidas durante três meses, outras durante 12. “A título de exemplo, os doentes mais graves ainda persistem na consulta, muitos dos asmáticos mantêm seguimento e os restantes foram tendo alta após melhorarem, embora alguns retornem após a segunda infeção”, explica.

Lembro-me de uma senhora que estava à espera do dia do seu casamento, mas que, devido à gravidade da covid, teve de o adiar. Uma doente nova, muito grave, que levou uns seis meses a ser reabilitada do ponto de vista motor. Não fazia nada sozinha, mas depois casou-se e veio ter comigo satisfeita com a sua recuperação”, conta Margarida Serrado, do Pulido Valente, por onde passaram doentes variados e com tempos de recuperação também diversos, alguns perto de um ano.

Já em Coimbra, diz-nos o hospital, “38% dos doentes tiveram alta ao fim de três meses por terem melhorado e não terem existido intercorrências, 5% tiveram alta aos seis meses e os restantes mantêm seguimento por apresentarem patologia importante – tromboembolismo pulmonar (TEP) crónica, miopericardite a necessitar de seguimento, fibrose pulmonar e/ou bronquiectasias, pré-diabetes e hipertensão arterial (HTA)”. Em Leiria, a estimativa é de “12 meses” de acompanhamento para uma total recuperação pós-covid.

Embora ainda seja cedo para medir o pulso aos resultados a longo prazo, as vacinas têm-se mostrado, para já, eficazes na prevenção da long covid. (AP Photo/Matt Rourke, File)

Covid de longa duração não é uma coisa de velhos

Quanto à tipologia dos doentes com sintomas pós-covid, o cenário é bastante heterogéneo e se muitos consideram que são apenas as pessoas mais velhas as afetadas, os dados facultados à CNN Portugal mostram outra realidade: a média de idades é de 50 anos, mas há casos de jovens, com 18 ou menos anos, saudáveis e desportistas a lutar contra os sintomas persistentes causados pela infeção.

Damien Ridge, professor de Estudos de Saúde na Universidade de Westminster, revela que a long covid é uma realidade para 2,7% das pessoas entre 17 e 24 anos e 3,6% nas pessoas entre 25 e 34 anos - nestes casos, os sintomas perduram para lá de quatro semanas após a infeção.

“É óbvio que, numa primeira fase, em 2021, vi casos mais graves, vi mais alterações difíceis no pulmão e vi isso em adultos jovens. Aquela coisa de que a covid grave era só com doentes com comorbilidades e graves e mais velhos também não é verdade”, diz Sofia Furtado, do Hospital da Luz de Lisboa.

“O que teve um impacto em mim foi a quantidade de doentes que tiveram covid grave e que tive de seguir algum tempo por envolvimento pulmonar de jovens, desportistas até, que demoraram meses à vida normal”, recorda a médica.

No Centro Hospitalar Universitário Cova da Beira, a consulta pós-pneumonia já atendeu um paciente com menos de 19 anos e quatro com menos de 29, a título de exemplo. No total, foram 162, a maior parte acima dos 60 anos, faixa etária na qual a probabilidade de haver outras comorbilidades é maior à medida que os anos vão passando. Já na consulta de Medicina Pós-Covid, foi também seguida uma pessoa com menos de 19 anos. Ao todo, nesta consulta foram acompanhadas 31 pessoas. Já na consulta da CUF Tejo, por exemplo, foram seguidas, sobretudo, pessoas entre os 30 e os 50 anos.

O estudo COVID Longa em crianças e adolescentes: Ficção ou realidade?, levado a cabo por especialistas do Centro Materno-Infantil do Norte, do Centro Hospitalar Universitário do Porto, passou a pente fino vários estudos sobre a temática e concluiu que “a prevalência de Long Covid em crianças e adolescentes foi altamente variável entre os estudos, variando de 2 a 66%”, mas a verdade é que nem todas as unidades hospitalares acompanham crianças e jovens, o que dificulta a capacidade de se ter uma perceção real do problema.

Tal como o próprio estudo indica, a evidência sobre a long covid em crianças e jovens é limitada, porém, a própria Organização Mundial da Saúde já incluiu a covid de longa duração nos Arquivos de Doença na Infância. E suspeita-se que os sintomas possam evoluir com o passar do tempo

Quanto a géneros, a estas consultas chegam em maior número mulheres, revelam os hospitais contactados.

Vacina desacelera o ritmo e os sintomas

Em 2021, um estudo publicado na revista The Lancet já levantava o véu sobre o efeito do escudo-protetor que a vacina tem contra a covid de longa duração. E o que aconteceu no Hospital da Luz de Lisboa espelha isso mesmo. Se nesse ano chegavam à consulta “muitos doentes com pós-covid grave”, sobretudo a recuperar de pneumonia, “em 2022 já tivemos muito doentes que tiveram covid ligeiro e que vieram à consulta por uma persistência de tosse, por um agravamento da sua asma”, exemplifica Sofia Furtado, frisando o papel da vacinação e das doses de reforço.

“Temos notado uma diminuição no número de doentes que recorrem à consulta”, diz a médica pneumologista Sofia Furtado, do Hospital da Luz de Lisboa, para quem “isso resulta do impacto que a vacina teve”. “ A doença é menos grave e as queixas pós-infeção aguda também são um bocadinho diferentes”, explica.

No Hospital Pulido Valente também já se nota a diferença, adianta Margarida Serrado. Atualmente, esta consulta ainda está aberta, mas a mudança no quadro da pós-covid pode trazer alterações. “Agora, devido à vacinação em massa, as formas graves têm sido em menor número” e, por isso, o hospital está “a pensar remodelar” a consulta, “porque as necessidades para que foi criada são menores”, revela a médica, explicando que hoje chegam à consulta “doentes menos graves” e, por isso, a “abordagem terapêutica ficou diferente”.

Também o grupo Lusíadas quis destacar o papel da vacinação, dizendo que, em relação à pneumologia, “existe um período pré-verão de 2021 e pós-verão 2021, com clara relação com a vacinação e a mudança de gravidade da doença”. 

Na fase pré-verão 2021 predominavam os doentes com quadros respiratórios graves com acompanhamento prolongado que durou mais de 1 ano, nos doentes pós-verão de 2021 predominam os quadros de tosse arrastada, cansaço fácil sem lesão estrutural do pulmão”, esclarece o grupo Lusíadas.

Já em 2022, a Nature dava conta de um estudo que indica que o risco de desenvolver long covid cai em 15% após a vacinação. Igualmente no final do ano passado, a Universidade de Cambridge revelou que a vacinação antes e depois de ter covid-19 diminuiu significativamente as condições pós-infeção, embora a eficácia varie.

“Hoje verificamos que as pessoas chegam sobretudo com condicionamento respiratório e fadiga, que tem componente psicológica”, adianta a médica do Pulido Valente, salientando também como comuns as alterações de sono, que são “mais frequentes agora”.

Mas Margarida Serrado não se esquece do que viu, casos clínicos complexos, por vezes difíceis de decifrar. “Vimos pessoas em estado muito grave, que demoraram muito tempo a voltar à vida normal.”

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