Trump em tribunal: eis o que precisa de saber sobre este momento histórico - TVI

Trump em tribunal: eis o que precisa de saber sobre este momento histórico

Ainda não se sabem as acusações concretas que o antigo presidente vai enfrentar, e que têm como base pagamentos feitos à ex-atriz pornográfica Stormy Daniels, mas já se sabe o que o distingue dos demais arguidos do tribunal de Manhattan: vai sem algemas e com um forte aparato policial. E sabe-se também que, independentemente do desfecho, este é um momento decisivo para o seu futuro político

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É um momento histórico nos Estados Unidos. Depois de semanas de especulação, o tribunal de Manhattan concedeu a Donald Trump o título de primeiro presidente norte-americano a ser formalmente acusado pela justiça. A investigação centra-se no pagamento de 130 mil dólares (120 mil euros) feito à ex-atriz de filmes pornográficos Stormy Daniels durante a eleição presidencial de 2016, mas as acusações específicas serão conhecidas na terça-feira - o mesmo dia em que o republicano discursará em Mar-a-Lago, em Palm Beach.

É na Florida, aliás, que Trump tem passado os últimos dias, assumindo uma postura que a CNN Internacional qualifica como "surpreendentemente calma", entre partidas de golfe e uma preparação cautelosa da resposta a esta projeção mediática. A declaração prevista para esta terça-feira deverá contribuir neste sentido, com um discurso que provavelmente reforçará as alegações de "perseguição política" e "caça às bruxas" que Trump e os seus apoiantes têm vincado há várias semanas, ainda antes do indiciamento ter sido conhecido. 

Enquanto o antigo chefe de Estado prepara o próximo discurso, os advogados de Trump já argumentaram, no domingo, que o caso é "fundamentalmente errado" do ponto de vista jurídico e que "não vai sobreviver a um desafio em tribunal", apontando como desfecho mais provável o arquivamento do processo por um juiz. O ex-presidente, entretanto, continua a "preparar-se para a batalha", como garante o advogado Joe Tacopina, e esta tarde já se encontrava a caminho de Nova Iorque, a bordo do seu avião privado. A renovação do Boeing 757, com o logótipo "TRUMP" recém-pintado a dourado e uma bandeira dos Estados Unidos na parte traseira, sugere confiança de que voltará a ser utilizado várias vezes em breve, quiçá para comícios ou campanhas presidenciais. 

Seja como for, um ponto parece certo: este é um evento inédito nos Estados Unidos, com consequências que se estendem para lá de Trump e que provavelmente se repercutirão em todo o partido republicano.

O que vai acontecer esta terça-feira?

Donald Trump de algemas e a resistir a uma detenção violenta é, por enquanto, apenas uma projeção da Inteligência Artificial. A comparência do republicano no tribunal de Manhattan será bem mais moderada - sem contar, claro, com o forte aparato policial e a reforçada rede de segurança instalada no local. Para começar, todos os julgamentos e atividades do tribunal previstos para terça-feira estão suspensos até à chegada do ex-presidente, que será recebido à entrada pelo Departamento da Polícia de Nova Iorque e outros agentes federais destacados para o evento.

Os Serviços Secretos devem então acompanhar Trump ao gabinete do procurador, onde será submetido a um ritual sem precedentes para um antigo chefe de Estado: o bilionário terá de declarar nome, idade, ocupação e submeter-se à recolha de impressões digitais. O passo seguinte e obrigatório para todos os arguidos é tirar uma fotografia, mas é incerto se tal acontecerá com Trump - a exposição mediática do caso abre a possibilidade de uma eventual utilização indevida da fotografia pelos meios de comunicação ou redes sociais, o que constituiria uma violação da lei estatal.

Mas não é só a fotografia: a visibilidade de Donald Trump deverá exigir outras alterações naquilo que são as normas previstas para os arguidos. Em vez de aguardar numa cela, o antigo presidente deverá ser levado para a sala de audiências através de uma série de corredores e elevadores, sempre acompanhado por agentes federais armados que, para além de o protegerem de eventuais ataques, também dispensam a necessidade de algemas.

No momento da saída, em vez de abandonar o edifício pelas portas da frente, deverá regressar novamente ao gabinete do procurador por uma série de elevadores e corredores e recebido pela sua comitiva, que o acompanhará até ao aeroporto. E será a partir da sua residência em Mar-a-Lago que fará o tão esperado discurso, às 20:15 da hora local (04:47 em Lisboa).

Entre protocolos de segurança e rituais judiciais mais ou menos definidos, a maior incógnita é, por enquanto, o que acontecerá nas horas em que permanecerá no interior da sala de audiências, e onde irá conhecer as acusações que enfrenta.

"Muito do que vai acontecer na terça-feira está ainda por definir", afirmou o advogado Joe Tacopina. "Com exceção de um facto: vamos, alto e orgulhosamente, proclamar «inocente»".

O que está em causa?

A acusação central surge na sequência de uma investigação liderada por Alvin Bragg, procurador de Manhattan, e diz respeito a um alegado suborno de 130 mil dólares (120 mil euros) pago à ex-atriz pornográfica Stormy Daniels para que esta escondesse uma relação extraconjugal durante o ano das presidenciais de 2016. Este pagamento, alegadamente registado como uma despesa legal no âmbito da campanha de 2016, poderá constituir uma infração das leis de financiamento de campanha e, como tal, um crime.

Mas há outros processos judiciais e investigações que envolvem o nome de Trump, alguns deles já posteriores ao seu mandato finalizado em 2021. O ataque ao Capitólio em janeiro desse ano será um dos casos mais mediáticos, e também o que poderá resultar em sanções mais sérias. No ano passado, uma comissão parlamentar (de maioria democrata) determinou que existiam "provas significativas" de que Trump procurou "perturbar a transição pacífica de transferência de poder" para o seu sucessor, Joe Biden, com o incitamento aos motins que resultaram na invasão em Washington.

Acusações de tentativa de interferência no poder político e fraude eleitoral não são, de resto, uma novidade para Donald Trump, tendo sido abertas várias investigações nos últimos anos para averiguar a influência do ex-presidente nas operações eleitorais de 2020, em que o rival democrata se sagrou vencedor. Mas, para além de fraude eleitoral, Trump poderá também enfrentar acusações de fraude financeira e fiscal. Em janeiro, a Trump Organization foi multada por um juiz de Nova Iorque em 1,6 milhões de dólares (1,48 milhões de euros) por executar um esquema que teria como objetivo ocultar das autoridades fiscais compensações financeiras de altos dirigentes.

Por fim, os documentos de Mar-a-Lago. Uma lei de 1978 obriga qualquer presidente norte-americano a transitar todos e-mails, cartas e outros documentos de trabalho para o Arquivo Nacional dos Estados Unidos. No entanto, Trump devolveu apenas 15 caixas de documentos e manteve mais de 30 arquivos com documentos classificados na sua residência em Palm Beach. Um novo desenvolvimento, noticiado pelo The Washington Post este domingo, vem agora agravar o cenário para o ex-chefe de Estado. Fontes do FBI e do Departamento de Justiça dos Estados Unidos indicam que Donald Trump terá tentado obstruir a investigação na sua casa na Florida e que, quando confrontado com a necessidade de devolver as caixas ao Arquivo Nacional, fez uma seleção de mais de 100 documentos que pretendia manter na sua posse.

Como poderá Trump defender-se e quais serão as consequências para o seu futuro político?

O nome de Juan Merchan, o juiz que vai decidir o caso, não é novidade para Donald Trump. O magistrado - "que consegue ser duro", como admite o advogado Timothy Parlatore - já tinha presidido o julgamento de fraude fiscal da Trump Organization e surpervisionado o caso de fraude criminal do ex-conselheiro Steve Bannon. Apesar de não ser um juiz "fácil", Parlatore diz-se confiante de que esta postura "não vai mudar a sua capacidade de avaliar os factos e a lei".

A posição da Defesa, por outro lado, é evidente - a inocência de Donald Trump será mantida até ao último momento, apesar de ainda não serem conhecidas as acusações ou provas contra o antigo presidente. "Vamos olhar para todas as questões que possamos contestar, e vamos contestá-las", garantiu o advogado Joe Tacopina. De acordo com a CNN, uma das estratégias poderá passar por argumentar que o alegado delito federal não pode ascender a estatuto de crime por ter ocorrido há sete anos e, portanto, já ter prescrito.

No entanto, a grande defesa de Donald Trump acontece nas ruas e nas redes sociais, onde os apoiantes do antigo chefe de Estado norte-americano insistem em falar numa "caça às bruxas" e "perseguição da extrema-esquerda" com motivações políticas.

A proximidade temporal do indiciamento com o anúncio de que Trump pretende candidatar-se às eleições presidenciais de 2024 é um dos argumentos mais fortes para sustentar esta alegada "perseguição política". Beneficiando de uma exposição mediática mais intensa do que aquela que tem conhecido nos últimos tempos, em que se limitou a publicações na sua rede social Truth Social, o antigo presidente republicano tem agora aproveitado para denunciar os "ataques" dos democratas e a tentativa de boicote às suas ambições presidenciais. Por sua vez, o partido democrata desvaloriza estas acusações como tentativas de vitimização e manipulação política.

A acreditar nos dados apresentados pela equipa de defesa de Trump, o caso do tribunal de Nova Iorque e as declarações incendiárias que têm marcado as últimas semanas - factuais ou não - têm contribuído para a crescente popularidade do republicano. Apesar de reunir uma fortuna avaliada em cerca de três mil milhões de euros, Trump diz já ter angariado mais de cinco milhões de dólares (cerca de 4.631.695 milhões de euros) para financiar a campanha presidencial de 2024 e refere ainda sondagens, conduzidas pela sua equipa, que demonstram uma vantagem crescente sobre Ron DeSantis, atualmente considerado o seu maior rival.

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