Tem 23 anos, mas a dura vida que levou carrega-lhe as feições. Precisou de salvar a própria vida, por isso teve de fugir. Tudo começou no Iraque. O medo maior era passar pela Síria, mas era assim que tinha de ser. Atravessou quilómetros de deserto até chegar à Turquia. Em Lesbos, foi detido no campo de Moria. Não gosta de lhe chamar campo, quando fala de Moria prefere a palavra prisão. Aquilo que Moria é, na verdade e em outras palavras, é um campo de detenção onde registam quem chega.
PRISÃO DE MORIA
Pouco importa se são mulheres, homens, crianças. Prendem famílias inteiras. Há relatos de alegadas agressões a refugiados por parte da polícia e dos militares. Colocam todos os refugiados sob tensão e quando há conflitos, evacuam o campo. Ficam lá apenas os refugiados a destilar ódios e a queimar caixotes de lixo. A pergunta que quem lá trabalha faz é «que gerações está a criar a Europa ao tratar estas pessoas assim?». É uma pergunta à qual só o futuro pode responder. Mas, a avaliar pelo que se vê do interior, esta gente não está certamente a receber os valores europeus. Não há acomodação capaz para todos, não há água potável, a comida varia entre massa e batatas com queijo. Nada mais. São vários meses sob estas condições. A TVI pediu autorização para conhecer este campo, mas o pedido foi sempre rejeitado pelo governo grego, mesmo com a insistência ao longo de mais de seis meses.
O REFUGIADO QUE QUER IR PARA PORTUGAL
“Só falta Portugal aceitar-me”, desabafa Omar. Já tem tudo aquilo de que precisa para começar uma nova vida, graças a um grupo de voluntários de Ovar. Casa, trabalho, bolsa para pagar as propinas da faculdade. Só falta um bilhete de avião e a vontade do governo português para desbloquear a situação de Omar. Neste momento está num vazio legal, chegou depois do acordo da União Europeia com a Turquia. Foi obrigado a pedir asilo na Grécia, mesmo não sendo o país onde quer viver. Se a Grécia rejeitar, é enviado de volta para a Turquia. Por agora, continua à espera de uma vontade política que lhe salve a vida.
Atoo Qerany é yazidi, uma minoria religiosa que o autoproclamado Estado Islâmico quer erradicar. A aldeia onde vivia, no Iraque, foi atacada e teve de fugir. Ficou escondido numa montanha durante 9 dias, sem roupa, sem agasalho, sem comida nem água. Só quando os Peshmerga, combatentes curdos, chegaram é que conseguiu sair. Esteve num campo de refugiados no Iraque, sempre soube que o futuro não podia passar por ali. Agarrou na mulher e começou o caminho até à Europa.
Foi até à Síria, chegou à Turquia e aí entrou no barco para a travessia até à ilha de Lesbos. Assim, resumido, nem parece que demorou três anos a fazer esta viagem. Correu risco de vida, viu gente a morrer pelo caminho, teve um encontro direto com o autoproclamado Estado Islâmico. O inferno vive-se, às vezes dá para contar. A mulher pouco ou nada fala. Tentou suicidar-se três vezes.
O maior sonho de Atoo é ter um pequeno apartamento com dois quartos. Um para ele e para a mulher, outro talvez para os filhos que um dia gostava de ter. Não sabe se algum dia será pai, mas sorri assim que se fala no assunto. Para já, está preso em Lesbos. Espera sair e viver num país sem a ameaça constante da morte. Talvez Portugal.