Logo, um cargo de topo na entidade que zela pelo cumprimento das obrigações fiscais no país.
Os documentos da filial do banco, em Genebra, são peremptórios. Está lá tudo: nome, data e local de nascimento, estado civil (incluindo o nome de solteira), morada, contactos telefónicos, número de passaporte, perfis de cliente associados à pessoa (familiares e não só), os IBAN – os números de conta.
Na ficha de cliente, surge uma firma com sede num paraíso fiscal associada à funcionária pública. O nome é Bordel Investment Holdings Limited, das Ilhas Virgens Britânicas. Em causa, estavam, em 2006/2007 (anos a que remontam os dados), cerca de 428 mil dólares (403 mil euros).
A FICHA DE CLIENTE
Esta ficha do HSBC é a de Filomena Maria Amaro Vieira Martinho Bacelar. Trabalha na Inspecção-Geral de Finanças, mas exerceu durante anos cargos de responsabilidade em empresas públicas como, por exemplo, o Metro do Porto, as Águas e Portugal, a ANA – Aeroportos e Navageção Aérea, a Transtejo, a Parque Expo 98, a Docapesca ou o Hospital Distrital de Santarém.
O seu nome está associado ao de outros parentes seus também com ficha na mesma filial do mesmo banco, na Suíça. O primeiro é António Mouteira da Rocha Bacelar: 1.639.218 dólares (1.544.537 euros). O segundo é António Lourenço Bacelar: 397.204 dólares (374.261 euros).
Feitas as contas, estamos a falar de qualquer coisa como 2,5 milhões de dólares, isto é, mais de 2,3 milhões de euros, ao câmbio atual.
EXPLICAÇÕES RECUSADAS, FINANÇAS DEMARCAM-SE
Ter dinheiro não é crime. Ter contas no estrangeiro, também não.
A TVI pediu esclarecimentos à chefe de equipa da Inspecção-Geral de Finanças: não sabe de nada, mas reconhece os nomes invocados e diz que só pode dar entrevistas com autorização do ministério das Finanças.
A TVI tentou, portanto, obter junto do Executivo autorização para escutar a funcionária pública.
Esta foi a resposta do ministério das Finanças:
Trata-se «de um assunto exclusivamente do foro pessoal sem qualquer relação com a sua atividade profissional e, consequentemente, com a instituição que representa»
DINHEIRO LIGADO A PARAÍSOS FISCAIS
O dinheiro está ligado a duas offshores: a Pernell Enterprises Limited e a Bordel Investments Holdings Limited. Segundo os documentos confidenciais do banco, António Mouteira da Rocha Bacelar mostrou a sua intenção de fechar uma conta numérica e abriu outra em nome de uma empresa das Ilhas Virgens Britânicas, que funcionam como paraíso fiscal.
Esta informação está preto no branco na acta confidencial que o próprio HSBC produz a partir das reuniões com os clientes, como pode ver na reportagem de vídeo.
É o que apurou a investigação – uma parceria do jornal francês Le Monde com o Consórcio Internacional de Jornalistas de Investigação e a TVI.
A ficha de Filomena Bacelar indica que parte do dinheiro está em nome da Bordel, a firma detentora de uma outra empresa sediada nesta Torre das Amoreiras, em Lisboa, a Searchouse, Imobiliária, Unipessoal, Lda., gerida pela advogada Ana Oliveira Bruno, nome que esteve relacionado com a maior rede de fraude fiscal e de branqueamento de capitais em Portugal: o caso Monte Branco. A advogada negou, na altura, qualquer envolvimento com a operação em causa.