O congresso de El Salvador aprovou quarta-feira um decreto-lei que permite julgamentos em massa para dezenas de milhares de pessoas detidas. Trata-se de um medida repressiva contra gangues, de acordo com a Reuters.
A aprovação deste decreto-lei implica que possam ser julgadas em simultâneo até 900 pessoas se forem oriundas da mesma região ou se forem acusadas de pertencer ao mesmo grupo criminoso, avança o Guardian.
Ainda de acordo com o Guardian, o governo do presidente Nayib Bukele já deteve 2% da população adulta de El Salvador e construiu a maior prisão das Américas para abrigar os 70.000 supostos membros de gangues.
Os críticos da medida afirmam que a aprovação desta lei para a realização de julgamentos em massa vai levar à corrosão do Estado de direito e a que muitas pessoas inocentes sejam injustamente presas.
O estado de emergência em El Salvador foi declarado em março de 2022 e, desde essa altura, já foram detidos mais de 71.900 alegados membros de gangues, sublinha a Reuters. Cerca de seis mil foram libertados.
As detenções estão a ser feitas de forma cada vez mais indiscriminada, sendo que está a crescer o número de visitantes estrangeiros inocentes a serem detidos e levados para as prisões salvadorenhas sobrelotadas, depois de terem sido detidos pelas tropas por terem tatuagens e estarem em bairros pobres, reporta o Guardian.
"Estes relatos estão a tornar-se mais comuns a cada dia que passa, vindos de organizações de direitos humanos, de pessoas que conseguiram sair da prisão e de famílias que denunciam detenções arbitrárias", diz ao Guardian Ruth Elonaro López, advogada da Cristosal, um grupo salvadorenho de direitos humanos. "O problema é que o estado de emergência significa que já não é necessário haver provas para deter ou prender alguém por longos períodos de tempo. As pessoas estão a ser presas porque parecem nervosas, porque se esqueceram dos seus documentos ou porque são simplesmente jovens."
Grupos de defesa dos direitos humanos já vieram afirmar que este decreto pode tornar o sistema de justiça do país uma fachada.
"Todos os seres humanos merecem a oportunidade de se defenderem em tribunal. Como é que o podem fazer eficazmente em julgamentos colectivos? Como é que os advogados e os defensores públicos podem fazer o seu trabalho desta forma?", afirma ao Guardian Carolina Jiménez Sandoval, presidente do Gabinete de Washington para a América Latina (Wola).
Os deputados do partido Novas Ideias, de Bukele, que tem maioria no Congresso, afirmaram que a medida visa aumentar a ordem e a eficiência e foi aprovada com 67 votos a favor e seis contra, avança a Reuters. Políticos da oposição e grupos de defesa dos direitos humanos afirmam que os julgamentos em grupo correm o risco de privar os detidos do seu direito a um processo justo e à presunção individual de inocência.
Mais de 6.400 violações de direitos humanos já foram documentadas durante o estado de emergência de Bukele e 174 pessoas morreram sob custódia do Estado, disse a Comissão Interamericana de Direitos Humanos no início deste mês, apesar de o governo de El Salvador e o gabinete do Procurador-Geral negarem este facto.