As peças do xadrez mundial movimentam-se sem surpresas. A exceção é Macron - TVI

As peças do xadrez mundial movimentam-se sem surpresas. A exceção é Macron

    João Rodrigues dos Santos
    Economista e Professor Universitário
  • 12 abr 2023, 13:45
Xi Jinping e Emmanuel Macron (AP Photo/Ng Han Guan, Pool)

Emmanuel Macron afirmou que deseja ver uma Europa com um "ritmo" independente das dinâmicas impostas pelos Estados Unidos da América e China. A probabilidade de uma “nova ordem mundial” está longe de ser nula. Este quadro pode levar-nos a desconfiar do posicionamento do Presidente francês. E são vários os pontos de vista possíveis.

O ministro dos Negócios Estrangeiros russo, Sergei Lavrov, afirmou, com todas as letras, que o objetivo da Rússia, ao invadir a Ucrânia, é pôr um fim à “ordem unipolar” dos Estados Unidos. A grande ambição da Rússia é criar uma “nova ordem mundial”. Se dúvidas houvesse, elas ter-se-iam dissipado de vez.

Em pleno século XXI, poderia até parecer impossível que um qualquer ser humano ainda considerasse aceitável a morte de pessoas (ucranianas e russas) em nome da criação de uma “ordem mundial” desligada do controlo dos Estados Unidos. Mas a verdade é que nem mesmo o século XXI nos trouxe o nível de sofisticação intelectual necessário ao fim de monstruosidades como esta. Temos, portanto, uma imensa margem de progressão civilizacional pela frente.

Para já, sobra-nos o atual tabuleiro do xadrez mundial. As peças deste xadrez têm vindo a mover-se. Nesta fase, a vantagem está claramente do lado do grupo tripartido China, Rússia e Índia.

Do lado do Ocidente, o mais recente movimento da "peça" Macron deixou mais desprotegido o "Rei" Estados Unidos. Aparenta ter sido uma má jogada, a do Presidente francês. Não nos devemos esquecer que os Estados Unidos, apesar de reconhecidamente ultracapitalistas, estão do lado do tabuleiro que condena veementemente barbáries em nome de interesses próprios ou coletivos. Neste lado, faz-se apologia ao diálogo e à diplomacia. Havendo dois lados divergentes a propósito desta matéria, assumir uma posição de maior neutralidade é um sinal ambíguo.

Do outro lado do tabuleiro, o “Rei” (China) vai estando cada vez mais protegido. Não tarda nada, juntar-se-á mais uma “Torre” (a Coreia do Norte).

Estará Emmanuel Macron a distanciar-se estrategicamente do Estados Unidos para não perder capacidade de diálogo e de negociação com a Rússia, e com a China?

Ou estará o Presidente francês, atual líder da Europa, a gerir interesses próprios, afastando-se da parte cuja tendência hegemónica parece estar a inverter-se, para, ao mesmo tempo, se aproximar daquela que aparenta estar a ganhar cada vez mais preponderância global?

Aguardemos agora para ver se Macron nos surpreende pela positiva nesta história da criação de uma “nova ordem mundial”.

A dúvida não se desvanecerá no futuro próximo. Certo é que numa partida de xadrez se opõem apenas duas cores. É assim há pelo menos quinhentos anos, neste jogo de estratégia. Mas A política será sempre A política. 

Portugal tem razões para ficar de pé atrás quando se trata de Macron. O Presidente francês nunca deixou de alimentar a possibilidade de concretização das interconexões de gás e de eletricidade entre a Península Ibérica e a Europa. Estas ligações são vitais para o futuro da Economia portuguesa. Apesar de tudo, foi sendo sempre reconhecido algum cinismo nesta posição de Emmanuel Macron. É que o lóbi nuclear dita as regras em França. E, segundo essas regras, as interligações que interessam a Portugal são incompatíveis com os interesses energéticos franceses.

Aguardemos agora para ver se Macron nos surpreende pela positiva nesta história da criação de uma “nova ordem mundial”.

Para já, a última jogada do líder europeu francês deixa-nos muitas reticências.

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