Há estudos que dizem que são necessários 21 dias para perder um hábito velho ou ganhar um novo e há outros que apontam para dois meses. Mas, e quando a pessoa deixa um hábito – sobretudo um vício – de um momento para o outro, literalmente?
A questão foi colocada por um grupo de cientistas finlandeses e norte-americanos que decidiu mapear a rede cerebral ligada ao vício do tabaco, recorrendo para isso a um grupo de 129 fumadores ativos – com uma média de 23,1 cigarros fumados por dia – em que todos sofreram um acidente vascular cerebral. E descobriu que há partes do cérebro que, quando lesionadas, podem servir de trampolim para deixar de fumar imediatamente.
Publicado na revista Nature Medicine, o estudo mostrou que 69 pacientes (53%) continuaram a fumar após o AVC, enquanto 34 (26%) preencheram os critérios para a chamada remissão espontânea do vício, isto é, pararam de fumar sem dificuldade imediatamente após a lesão cerebral, sem recaídas ou relatos de vontade de voltar ao hábito.
Após analisarem as imagens cerebrais captadas pós-AVC, os cientistas concluíram que há uma área ou circuito específico no cérebro que ajuda a justificar a remissão espontânea. Na prática, o estudo revela que há danos cerebrais que podem, de facto, desvincular uma pessoa de um vício.
“As localizações das lesões eram altamente heterogéneas”, lê-se no estudo, publicado online esta segunda-feira e que dá conta de que as lesões associadas à remissão espontânea estão localizadas em várias áreas do cérebro, mas que, na verdade, todas podem estar ligadas a uma rede específica, a um circuito concreto que necessita de mais análise e estudos.
Segundo os autores, uma lesão com probabilidade de levar à remissão do vício de forma espontânea afetaria partes do cérebro como o córtex cingulado dorsal, o córtex pré-frontal dorsolateral e o córtex insular, mas não o córtex pré-frontal medial.
Mais estudos serão necessários para se conseguir um ‘mapa’ mais preciso, mas os autores desta investigação já conseguiram provar que estas descobertas poderão ser úteis para a formulação de novos tratamentos contra vícios, seja o do tabaco ou do álcool. E isto porque analisaram dados sobre o cérebro de ex-veteranos de guerra - que estavam a ser acompanhados há anos - e notaram uma associação entre um menor risco de consumir álcool de forma viciante e danos nos mesmo circuitos cerebrais dos ex-fumadores que deixaram o vício logo após o AVC.