Grande fuga de informação do Pentágono: o que se sabe até agora - TVI

Grande fuga de informação do Pentágono: o que se sabe até agora

  • CNN
  • Zachary Cohen, Natasha Bertrand e Kylie Atwood
  • 11 abr 2023, 09:56
Tiroteio nas imediações do Pentágono

Documentos secretos norte-americanos despejados nas redes sociais incluem informações de espionagem sobre países inimigos e aliados. Incluindo da Rússia… e da Ucrânia.

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A Administração Biden está a fazer tudo para avaliar e conter as consequências de uma grande fuga de documentos secretos do Pentágono, que nos últimos dias tem agitado responsáveis oficiais dos Estados Unidos, membros do Congresso e aliados chave.

O Departamento de Justiça norte-americano está a investigar como é que um “tesouro” de documentos altamente sensíveis, que incluem detalhes sobre como os EUA espia tanto amigos como inimigos, bem como informações sobre a guerra na Ucrânia, foram parar a sites das redes sociais.

No entanto, até à data, pouco se sabe sobre quem pode ter sido o responsável pela fuga ou como é que alguns dos segredos mais bem guardados da nação acabaram em sites de redes sociais.

O Departamento de Defesa ainda está a analisar o assunto e tomou medidas para apertar o fluxo de documentos altamente sensíveis, segundo disseram as autoridades, documentos estes que normalmente estão disponíveis para centenas de pessoas em todo o aparelho do Estado.

O Pentágono pôs a possibilidade de um “esforço interagências” para avaliar o impacto da fuga, mas os responsáveis oficiais dos EUA e aliados próximos já receiam que as revelações possam pôr em risco fontes sensíveis e comprometer relações estrangeiras importantes.

Os legisladores do Congresso também expressaram preocupações sobre o aparente alcance da fuga e sensibilidade dos documentos colocados online, mas permanecem em grande parte no escuro sobre o que ocorreu.

Tanto os líderes da Câmara como da Comissão de Informações do Senado estão a exigir respostas da Administração Biden. O Presidente da Comissão de Informações da Câmara, o deputado Mike Turner, ficou agendado receber um briefing, tendo os seus homólogos do Senado conjuntamente solicitado o mesmo.

Eis o o que sabemos sobre a fuga de informação até agora:

O que aconteceu?

Os documentos apareceram online no mês passado na plataforma de rede social Discord, de acordo com capturas de ecrã das publicações analisadas pela CNN.

Os posts são fotografias de documentos amarrotados em cima de revistas e rodeados por outros objetos aleatórios, tais como sacos com fecho de correr e tubos de cola Gorilla. É como se tivessem sido apressadamente dobrados e enfiados num bolso antes de serem retirados de um local seguro, disse à CNN uma fonte familiarizada com este tipo de documentos.

Um porta-voz do Discord confirmou, numa declaração este domingo, que a empresa está a cooperar com as autoridades policiais na investigação.

Todos os documentos descobertos na sexta-feira continham marcas classificadas, algumas de “top secret” - o mais alto nível de classificação.

Não é claro quem está por detrás das fugas de informação e de onde, exatamente, elas tiveram a sua origem.

O que está nos documentos?

A CNN analisou 53 documentos que vazaram, e todos parecem ter sido produzidos entre meados de fevereiro e princípios de março.

Eles contêm uma vasta gama de informação altamente classificada - fornecendo uma “janela” rara sobre a forma como os espiões americanos espiam tanto aliados como adversários.

Alguns dos documentos, que funcionários oficiais americanos dizem serem autênticos, expõem a extensão das escutas dos EUA sobre os principais aliados, incluindo a Coreia do Sul, Israel e Ucrânia.

Outros revelam o grau de penetração dos EUA no Ministério da Defesa russo e na organização mercenária russa do Grupo Wagner, em grande parte através de comunicações intercetadas e de fontes humanas, que podem agora ser cortadas ou colocadas em perigo.

Outros ainda divulgam fraquezas chave no armamento ucraniano, na defesa aérea, e no tamanho e prontidão de batalhões num ponto crítico da guerra, à medida que as forças ucranianas se preparam para lançar uma contraofensiva contra os russos - e à medida que os EUA e a Ucrânia começaram a desenvolver uma relação mais de confiança mútua sobre a partilha de informações.

Um dos documentos revela que os EUA têm espiado o Presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky. Isto não é surpreendente, segundo afirmou uma fonte próxima de Zelensky, mas responsáveis oficiais ucranianos estão profundamente frustrados com a fuga de informação.

O relatório dos serviços secretos dos EUA - que tem como fonte informações obtidas por sinais - diz que, em finais de fevereiro, Zelensky “sugeriu atacar locais de destacamento russos no Oblast de Rostov, na Rússia”, utilizando veículos aéreos não tripulados, uma vez que a Ucrânia não possui armas de longo alcance capazes de chegar tão longe.

A inteligência de sinais inclui comunicações intercetadas e é amplamente definida pela Agência de Segurança Nacional (a norte-americana NSA) como “inteligência derivada de sinais eletrónicos e sistemas utilizados por alvos estrangeiros, tais como sistemas de comunicações, radares e sistemas de armas”.

Outro documento descreve, com um detalhe notável, uma conversa entre dois altos funcionários de segurança nacional sul-coreanos sobre as preocupações do Conselho de Segurança Nacional do país relativamente a um pedido de munições dos EUA.

Os funcionários receavam que o fornecimento das munições, que os EUA enviariam então para a Ucrânia, violaria a política da Coreia do Sul de não fornecer ajuda letal a países em guerra. De acordo com o documento, um dos funcionários sugeriu então uma forma de contornar a política sem realmente a alterar - vendendo as munições à Polónia.

O documento já suscitou controvérsia em Seul, com funcionários sul-coreanos a dizerem aos jornalistas que tencionam levantar a questão junto de Washington.

Entretanto, um relatório dos serviços secretos sobre Israel provocou a indignação em Jerusalém. O relatório, produzido pela CIA e proveniente de várias fontes de informação, diz que a principal agência de inteligência de Israel, a Mossad, tinha estado a encorajar protestos contra o novo governo do país – “incluindo vários apelos explícitos à ação”, alega o relatório.

Como é que os aliados dos EUA estão a reagir?

Enquanto os aliados americanos estão conscientes de que a comunidade dos serviços secretos dos EUA recolhe informações sobre nações amigas, os diplomatas de alguns dos países mencionados disseram à CNN que era frustrante - e prejudicial para a reputação dos EUA - ver essa informação exposta publicamente.

Os aliados dos EUA estão a fazer avaliações de danos, e a analisar para determinar se alguma das suas próprias fontes e métodos foi comprometido pela fuga.

“Esperamos que os EUA partilhem connosco uma avaliação dos danos nos próximos dias, mas não podemos esperar pela sua avaliação. Neste momento estamos a fazer a nossa”, disse um responsável oficial de um país que faz parte do acordo de partilha de informações “Five Eyes” [à letra, “Cinco Olhos”] com os EUA, que inclui a Austrália, o Canadá, a Nova Zelândia e o Reino Unido.

“Estamos a analisar estes documentos para descobrir se algum dos serviços secretos teve origem na nossa coleção”, disse o responsável.

Um segundo responsável do “Five Eyes” expressou preocupação com a fuga de informações de guerra da Ucrânia, que prejudicam o país no campo de batalha.

O responsável salientou também que é alarmante ver um dos documentos de fevereiro, intitulado “Rússia-Ucrânia: Batalha para a Região do Donbass Está Provavelmente em Direção a um Impasse ao Longo de 2023”. O documento assinala os desafios na avaliação da “resistência das operações da Ucrânia”.

“Os ganhos para a Ucrânia serão difíceis de alcançar, mas não ajuda ter a avaliação privada dos EUA a apontar para um provável impasse de um ano”, disse o responsável.

Mykhailo Podolyak, o conselheiro do chefe do Gabinete do Presidente da Ucrânia, disse no seu canal no Telegram na sexta-feira que acredita que os documentos que foram divulgados não são autênticos, não têm “nada a ver com os planos reais da Ucrânia” e baseiam-se “numa grande quantidade de informação fictícia” divulgada pela Rússia.

Ainda assim, a Ucrânia já alterou alguns dos seus planos militares devido à fuga de informação, disse uma fonte próxima de Zelensky à CNN.

Funcionários do Estado dos EUA “estão a dialogar com aliados e parceiros a alto nível sobre isto, incluindo com objetivo de os tranquilizar quanto ao nosso compromisso de salvaguardar a inteligência e a fidelidade de assegurar as nossas parcerias” na sequência da fuga de informação, disse segunda-feira o porta-voz principal adjunto do Departamento de Estado, Vedant Patel.

No Departamento de Estado, a secretária de Estado Adjunta Wendy Sherman foi contactada para liderar a resposta diplomática, de acordo com um funcionário norte-americano familiarizado com o assunto.

Patel não quis entrar em detalhes sobre com que países os EUA se envolveram, dizendo apenas “que o trabalho está em curso”.

Os principais aliados que fazem parte do acordo de partilha de informações “Five Eyes” (Austrália, Canadá, Nova Zelândia e Reino Unido) ainda não foram informados pelos EUA sobre em que ponto se encontram na avaliação dos danos ou nos esforços para identificar o “leaker” [quem fez a fuga de informação], disseram dois diplomatas do “Five Eyes” à CNN na segunda-feira.

Um dos diplomatas disse esperar um briefing de informação dos funcionários norte-americanos nos próximos dias e notou que as férias da Páscoa tinham abrandado o ritmo das discussões nos últimos dias.

Quem está a investigar?

O Departamento de Justiça lançou uma investigação e o Departamento de Defesa está também a analisar o assunto.

“O Departamento de Defesa continua a rever e a avaliar a validade dos documentos fotografados que circulam nos sites das redes sociais e que parecem conter material sensível e altamente classificado", disse a assessora de imprensa adjunta do Pentágono, Sabrina Singh, numa declaração durante o fim-de-semana. “Foi levantado um esforço interagências, centrado na avaliação do impacto que estes documentos fotografados poderiam ter na segurança nacional dos EUA e nos nossos aliados e parceiros”.

Singh acrescentou que responsáveis dos EUA falaram com aliados e parceiros durante o fim-de-semana sobre a fuga de informação, e informaram “comissões relevantes do Congresso”.

O Equipa Conjunta, que abrange a liderança mais graduada do Departamento de Defesa que aconselha o Presidente Joe Biden, está a examinar as suas listas de distribuição para ver quem recebe estes relatórios, segundo disse um funcionário da Defesa. Muitos dos documentos tinham marcas indicando que tinham sido produzidos pelo braço da inteligência do Estado-Maior Conjunto, conhecido como J2, e parecem ser documentos de briefing.

A equipa do Pentágono que trabalha para determinar a escala e o alcance da fuga inclui os assuntos legislativos do Departamento de Defesa, relações públicas, política, conselho geral, inteligência e segurança, e gabinetes conjuntos, disse na segunda-feira Chris Meagher, assistente do Secretário da Defesa para os Assuntos Públicos.

Questionado sobre se o governo tem alguma noção de quem divulgou os documentos, o Coordenador do Conselho de Segurança Nacional para as Comunicações Estratégicas, John Kirby, disse segunda-feira que o Departamento de Defesa tinha remetido o caso para o Departamento de Justiça para investigação criminal, e direcionado as perguntas para ele.

“Não tenho conhecimento de que eles tenham chegado a qualquer conclusão neste momento sobre a sua origem”, disse Kirby.

Questionado sobre se a Administração acreditava que a fuga estava contida ou se havia uma ameaça em curso, Kirby respondeu: “Não sabemos. Não sabemos mesmo”.

Alex Marquardt, Jeremy Herb, Jennifer Hanlser e Haley Britzky, da CNN, contribuíram para esta notícia.

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