Há mais de uma semana que se exige cada vez mais respostas sobre o destino da menina palestiniana Hind Rajab, de seis anos, que ficou presa num carro com os familiares mortos depois de a viatura ter sido alvo de fogo israelita em Gaza.
O mistério também envolve o paradeiro de duas ambulâncias da Sociedade do Crescente Vermelho Palestiniano (PRCS), que foram enviadas para a encontrar a 29 de janeiro.
"Precisamos de saber o que aconteceu a Hind e à equipa de ambulâncias da PRCS", afirmou a PRCS na sua última declaração no X.
So many wonderful things can happen in a week, but for those waiting for news or for information a week is anguish. Each moment is marked by worry and sadness. This case which is representative of all the suffering and brutality of the past few months is really affecting the… pic.twitter.com/CdSMdPDdtP
— PRCS (@PalestineRCS) February 5, 2024
"Tantas coisas maravilhosas podem acontecer numa semana, mas para quem está à espera de notícias ou de informações, uma semana é uma angústia. Cada momento é marcado por preocupação e tristeza", continua a publicação.
A CNN deu ao exército israelita detalhes sobre o incidente na passada sexta-feira, incluindo as coordenadas fornecidas pelo PRCS. Em resposta, as Forças de Defesa de Israel (IDF) disseram que "não estavam familiarizadas com o incidente descrito".
Contactadas novamente pela CNN na segunda-feira sobre a rapariga desaparecida e a tripulação do PRCS, as IDF disseram que "ainda estavam a investigar".
Hind viajava num carro com o tio, a mulher deste e os quatro filhos, fugindo dos combates no norte de Gaza, quando foram alvo de fogo israelita, segundo o PRCS.
A prima de Hind, Layan Hamadeh, de 15 anos, fez um angustiante pedido de ajuda aos serviços de emergência que foi gravado pelo PRCS e partilhado nas redes sociais.
No vídeo, ouve-se a adolescente a falar com um paramédico, a pedir ajuda e a descrever um tanque que se encontrava por perto.
"Estão a disparar contra nós. O tanque está mesmo ao meu lado. Estamos no carro, o tanque está mesmo ao nosso lado", grita Layan, no meio de um intenso tiroteio ao fundo.
Layan cala-se e os tiros param.
O paramédico ao telefone tenta falar com ela, dizendo repetidamente: "Estou? Alô?", mas não obtém resposta.
O PRCS acredita que as outras seis pessoas que estavam no carro com Hind, incluindo Layan, foram mortas quando o carro foi alvejado.
Sozinha, aterrorizada e encurralada no carro com os corpos dos familiares à volta, Hind fez um pedido desesperado de ajuda.
"Venham buscar-me. Vêm buscar-me? Estou tão assustada, por favor, vem!" ouve-se numa gravação do apelo aos socorristas, divulgada pelo PRCS.
O PRCS disse que os seus funcionários ficaram ao telefone com Hind durante mais de três horas, enquanto tentavam enviar uma equipa de ambulância - os paramédicos Yousef Zieno e Ahmed Almadhoun - para a encontrar.
Na altura, o grupo disse que as ambulâncias não tinham conseguido chegar à área porque os militares israelitas consideravam-na uma zona militar fechada e tinham como alvo qualquer pessoa que tentasse deslocar-se nas proximidades.
Rana Al-Faqueh, uma coordenadora de resposta da PRCS que permaneceu na chamada com a rapariga, disse que Hind perguntou as horas porque estava a escurecer. "Tenho medo do escuro", disse, de acordo com a responsável.
"Há tiros à tua volta?", perguntou. "Sim. Venham buscar-me", respondeu Hind.
Em comunicado, o PRCS afirma que a equipa de salvamento chegou à zona onde a jovem estava presa no carro, perto de uma estação de serviço de Fares, às 18:00 locais.
Perderam então o contacto com a equipa e com Hind. Não se sabe se a equipa conseguiu chegar à menina.
Há oito dias que não se sabe nada sobre eles.
Ministério da Saúde responsabiliza Israel
No sábado, o Ministério dos Negócios Estrangeiros e Expatriados da Palestina (PMOFA) declarou que considera o governo israelita "total e diretamente responsável" pelas vidas de Hind e dos dois paramédicos, Zieno e Almadhoun, que foram socorrê-la.
"O seu destino permanece desconhecido", declarou o Ministério dos Negócios Estrangeiros.
Em 29 de janeiro, a CNN questionou as forças armadas sobre as suas operações nas imediações e as IDF afirmaram que as suas tropas encontraram e mataram dezenas de terroristas armados em combates no centro de Gaza.
"As tropas foram assistidas por fogo de tanques sob a direção de observadores de campo e soldados de infantaria. Além disso, as tropas localizaram grandes quantidades de armas na área", disseram as IDF na segunda-feira.
O PRCS intensificou o apelo por respostas, emitindo mais de duas dúzias de declarações e publicações na rede social X, exigindo saber o que lhes aconteceu.
"Onde está Hind? Onde estão Yousef e Ahmed? Ainda estão vivos? Queremos saber o destino deles", disse o grupo humanitário na segunda-feira.
O PRCS disse que o caso era "representativo de todo o sofrimento e brutalidade dos últimos meses", em que a intensa campanha de bombardeamento de Israel em Gaza matou 27.478 pessoas, de acordo com o Ministério da Saúde controlado pelo Hamas, e desencadeou uma crise humanitária catastrófica em todo o território palestiniano, obrigando cerca de dois milhões de pessoas a abandonar as suas casas.
A falta de informações sobre os paramédicos e a menina desaparecidos "está a afetar a saúde mental do pessoal e dos voluntários do PRCS", afirmou ainda o grupo.
A mãe de Hind espera por respostas à porta do hospital
Ninguém está mais desesperado por respostas do que a mãe de Hind, que estava à espera à porta de um hospital de Gaza, na esperança de que a filha chegasse "a qualquer momento".
Em vídeo filmado pela CNN na sexta-feira, Wissam Hamada disse ter levado os pertences da filha para o hospital e espera angustiada por notícias.
"Se a minha filha não morreu com as balas, vai morrer com o frio, com a fome... Apelo a todo o mundo para que me tragam a minha filha.... Queremos a nossa menina inocente. A Hind é demasiado nova para estar a passar por isto. Ela é demasiado jovem", disse Wissam à CNN.
"Ela é uma menina, o seu único sonho é ser médica e tratar as pessoas".
A avó da rapariga, Hind Hamada, disse que tinha "esperança" de que a neta fosse devolvida "sem demora".
Hind, na chamada feita a partir do carro, deixou o seguinte apelo: "Venham buscar-me, quero ir para casa e quero a minha família".
"Queremos levar a Hind para um hospital para a tratar, porque ela estava ferida", recorda a avó.
Embora a família espere que a equipa de salvamento do PRCS esteja a "cuidar da sua" filha, não o pode afirmar com toda a certeza.
"Sempre que ouço o som de uma ambulância, vou à porta e penso que a minha filha está a chegar", revela a mãe de Hind à CNN.
"Sempre que ouço o som de um ataque, de um projétil ou de uma bala, o meu coração dói-me porque penso que essa bala está tão perto da minha filha. Qualquer impacto, sinto que está a chegar à minha filha".