ANÁLISE. “Era impossível imaginar isto há um ano: a melhor tecnologia da NATO nas mãos da Ucrânia e a Rússia apenas capaz de ‘ladrar’ a sua frustração” - TVI

ANÁLISE. “Era impossível imaginar isto há um ano: a melhor tecnologia da NATO nas mãos da Ucrânia e a Rússia apenas capaz de ‘ladrar’ a sua frustração”

  • CNN
  • Nick Paton Walsh
  • 26 jan 2023, 18:00

Envio de tanques Leopard 2 e Abrams pelo Ocidente: “Isto é novo, e corajoso, e retrata uma NATO sem medo”. Análise do editor de Segurança Internacional da CNN

Porque é que enviar tanques para a Ucrânia é um novo e destemido passo do Ocidente

 

Mesmo desarticulada, a mensagem acabou por ser de unidade.

Depois de semanas de pressão aberta da Polónia e de outros membros da NATO sobre a Alemanha, para que permitisse o envio de tanques Leopard 2 para a Ucrânia, finalmente parece que os Estados Unidos e alguns dos seus aliados da União Europeia irão enviar blindados - uma medida impensável meses atrás - para a linha da frente contra a Rússia.

É uma decisão importante, em parte porque estes sistemas - ao contrário dos de defesa aérea, ou dos mísseis antitanque - não são armas defensivas. Tal como os sistemas de artilharia e mísseis que os precederam, destinam-se a atingir duramente as tropas russas numa ofensiva terrestre. Mas ao contrário desses sistemas, estes são inequivocamente sobre reconquistar território da Ucrânia. Isto é novo, e corajoso, e retrata uma NATO sem medo.

A decisão combinada dos EUA e da Europa de enviarem tanques para a Ucrânia não é uma exibição de democracias fraturantes.

Ao longo das semanas de debates e mau humor em torno da relutância de Berlim em ajudar Kiev, alguns responsáveis em Moscovo terão visto algo diferente de uma desunião: um Ocidente a contemplar a possibilidade de enviar o seu armamento mais agressivo para um Estado que há um ano considerava inapto até para discutir seriamente a adesão à NATO.

Uma aliança da dimensão - e com a variedade histórica - da NATO teria sempre divergências sobre como lidar com a maior guerra terrestre na Europa desde a Segunda Guerra Mundial.

A Polónia já teve a experiência do domínio soviético, e muitos dos seus cidadãos são capazes de se lembrarem de como sentiam essa versão do imperialismo russo. A Alemanha - sob o jugo dos nazis - largou pela última vez os seus tanques naquele que foi o pior episódio de derramamento de sangue do Continente até agora. Muitas figuras superiores do seu imponente Partido Social-Democrata (SPD) - casa do chanceler alemão, Olaf Scholz - têm estado perigosamente próximas do Kremlin. Teria sido notável se todas estas potências europeias tivessem estado desde o primeiro dia na mesma página no que respeita a esta luta.

Mas os planos americanos de enviar 30 tanques Abrams para a Ucrânia - o que, de acordo com dois funcionários americanos familiarizados com as decisões, é também enormemente simbólico - , encorajaram a Alemanha a abandonar as suas objeções de enviar os Leopard. Isso deu um “guarda-chuva” da NATO à mudança, mesmo que demore meses, talvez anos, a pôr em marcha o principal mas logisticamente complexo tanque de batalha americano.

Servir e manter estes tanques através das enormes extensões da Ucrânia será um grande desafio. Mas a vontade de Washington de assumir esta tarefa fala alto sobre o seu empenho na guerra e sobre a forma como encara as perspetivas de uma vitória mais ampla da Ucrânia.

Este último impulso de ajuda ocidental diz duas coisas.

Primeiro, que estas nações não estão preocupadas em quebrar as “linhas vermelhas” russas. A crença de longa data de que alguns elementos da assistência da NATO à Ucrânia poderiam correr o risco de provocar uma potência nuclear demasiado longe está a desmoronar-se.

Segundo, que estes membros da NATO estão menos preocupados em serem atacados pela própria Rússia num futuro iminente: estão a entregar armas de que precisariam urgentemente na eventualidade de um tal conflito. A decisão dos dinamarqueses de enviar a sua artilharia César e a decisão norueguesa de enviar uma grande parte dos seus Leopard são prova disso. Estes membros da NATO consideram que o conflito decisivo com a Rússia será na Ucrânia e com a Ucrânia. E isso pode sugerir que eles acreditam que Moscovo não vencerá.

Os stocks ocidentais podem ser reconstruídos ou reconstituídos, mas isso leva tempo - talvez décadas. E os membros da NATO estão a disponibilizar equipamento a um ritmo tal que o último anúncio não estará em prática antes do anúncio seguinte.

Há apenas cerca de um mês, os EUA prometeram sistemas de defesa antimísseis Patriot à Ucrânia, e eles ainda não chegaram. Agora, o tanque M1 Abrams pode estar a caminho. Os efeitos práticos podem não ser sentidos a tempo de uma ofensiva na Primavera de ambos os lados, Rússia ou Ucrânia. Mas a mensagem é palpável muito antes disso. A ajuda ocidental parece interminável, constante e crescente.

E isto será sentido dentro das paredes do Kremlin. Os militares russos estão a ter problemas para elaborar um plano estratégico em torno da sua liderança em constante mudança, e para converter em ganhos substanciais a utilização brutal da mão-de-obra, que estão a fazer como se fosse um recurso infinito e dispensável.

Para aqueles que rodeiam o Presidente russo, Vladimir Putin, a ajuda colossal da NATO é inescapável, e pesa certamente na forma como o seu apoio a Putin é ou não duradouro. Isto não está a acabar.

No entanto, uma nota de prudência deve soar. É tão precário para o Ocidente acreditar que a Rússia já não tem linhas vermelhas, como o é cederem à chantagem nuclear que tanto tem obstinado à invasão da Rússia.

Moscovo pode parecer relativamente impotente neste momento, mas a sorte desta guerra já mudou antes e pode voltar a mudar.

Talvez as semanas de debate público sobre a escalada da ajuda fossem destinadas a mostrar a Moscovo que o Ocidente é cauteloso e respeitoso com o que resta do ego do Kremlin.

Mas estamos aqui em território que era impossível imaginar há um ano, com a melhor tecnologia de ataque da NATO em breve em mãos ucranianas, e a Rússia aparentemente capaz apenas de ladrar a sua frustração.

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