A Ucrânia e a Rússia assinaram esta sexta-feira dois acordos para retomar a exportação de cereais a partir dos portos ucranianos. Em duas reuniões separadas que decorreram em Istambul, e que tiveram a participação do ministro da Defesa e do presidente da Turquia e do secretário-geral da Organização das Nações Unidas (ONU), as duas partes comprometeram-se individualmente a colocar um fim ao bloqueio dos cereais nos portos ucranianos, situação que está a levar a uma crise global que afeta vários países, nomeadamente em África. Os acordos são válidos para os próximos quatro meses, podendo ser renovados.
Apesar de a cerimónia ter contado com as bandeiras dos dois países, em conjunto com as da ONU e da Turquia, representantes de Rússia e Ucrânia não se sentaram na mesma mesa, só se tendo cumprimentado na formalização do acordo.
O lado ucraniano foi o primeiro assinar, com o ministro das Infraestruturas, Oleksandr Kubrakov, a encontrar-se com Hulusi Akar e António Guterres, que depois, numa reunião separada, receberam o ministro da Defesa da Rússia, que representou Moscovo nas negociações. O governante ucraniano partilhou uma fotografia do encontro, aproveitando para agradecer a António Guterres "pessoalmente por apoiar a iniciativa do transporte seguro de cereais".
Unblocking 🇺🇦 ports is a great contribution to the 🌍 food security. I’m grateful to the 🇺🇳 UN and @antonioguterres personally for supporting the Initiative on safe transportation of grain. pic.twitter.com/xnWCokyJmc
— Oleksandr Kubrakov (@OlKubrakov) July 22, 2022
Depois de dois meses de duras negociações, o acordo visa a criação de um centro de controlo em Istambul, dirigido por representantes das partes envolvidas: um ucraniano, um russo, um turco e um representante da ONU, que devem estabelecer o cronograma de rotação de navios no Mar Negro.
O acordo implica também que passe a ser feita uma inspeção dos navios que transportam os cereais, para garantir que não levam armas para a Ucrânia. Estas inspeções, que serão realizadas tanto à saída como à chegada dos navios, devem acontecer nos portos de Istambul.
Na confirmação do acordo, numa sala onde estiveram representantes de todas as partes, o secretário-geral da ONU falou num "acordo para o mundo", aproveitando para agradecer especialmente à Turquia pelo papel de intermediário: "Hoje existe um farol no Mar Negro. Um farol de esperança. Um farol de possibilidade. Um farol de alívio num mundo que precisa disto mais do que nunca."
Os agradecimentos estenderam-se a Ucrânia e Rússia, países que António Guterres disse que "ultrapassaram obstáculos, colocaram de lado diferenças para construir o caminho para uma iniciativa que vai servir os interesses de todos".
"Que não existam dúvidas. Este é um acordo para o mundo. Vai trazer alívio aos países em desenvolvimento que estão à beira da bancarrota e às pessoas mais vulneráveis à beira da fome", acrescentou, falando ainda na importância da estabilização dos preços dos alimentos no mercado mundial.
O antigo primeiro-ministro português assumiu um papel decisivo para que se chegasse a este dia, atravessando várias críticas até ao momento, nomeadamente por aquilo que se disse ser a inação da ONU. Na cerimónia de assinatura António Guterres puxou dos galões para destacar o seu papel nas negociações: "Em abril, depois de ser recebido pelo presidente Erdogan, encontrei-me com os presidentes Putin e Zelensky para propor um plano de solução e temos trabalhado todos os dias desde então."
"Recebi um grande esforço e comprometimento de todos os lados durante as negociações. O comprometimento e a dedicação são ainda mais vitais hoje. Esta iniciativa deve ser totalmente implementada, porque o mundo precisa desesperadamente de atacar a crise alimentar global", concluiu.
O presidente da Turquia salientou que o acordo assinado para a exportação de cereais vai prevenir que milhares de milhões de pessoas enfrentem a fome. Segundo Recep Tayyip Erdogan, os tratados alcançados também vão ajudar a gerir a inflação global, que se tem refletido nos preços dos alimentos.
O chefe de Estado turco esclareceu ainda que será um centro de coordenação baseado em Istambul que vai coordenar o acordo. “A guerra não afeta apenas as partes envolvidas, mas toda a Humanidade”, acrescentou Erdogan, pedindo depois que se chegue a um cessar-fogo.