Com níveis de humidade relativa no ar na ordem dos 90% a 100%, segundo os mais recentes dados do Instituto Português do Mar e da Atmosfera (IPMA), os relatos de humidade nas paredes e tetos da casa - e até em objetos - têm-se espalhado pelas redes sociais este inverno.
O fenómeno, em parte, explica-se logo pela maior quantidade de vapor de água na atmosfera, mas também pelo facto de as temperaturas terem estado acima do que é habitual para os meses de dezembro e janeiro.
“O mês de dezembro classificou-se como extremamente quente em relação à temperatura do ar e muito chuvoso em relação à precipitação. Foi o dezembro mais quente dos últimos 92 anos. O valor médio da temperatura média do ar, 12.72 °C, foi 2.76 °C acima do valor normal”, esclarece o IPMA.
Embora ainda não haja dados de 2022, segundo os indicadores de pobreza energética divulgados pela Comissão Europeia, em 2020, 25,2% dos portugueses viviam em casas com problemas de humidade, assim como de bolores e de infiltrações.
Segundo o climatologista Pedro Garrett, “com as projeções climáticas é possível estipular que, por cada grau de aumento da temperatura média global (vamos e 1,2 graus desde o período pré-industrial), a humidade na atmosfera aumenta 7%”.
Quanto aos tipos de humidade, a arquiteta Tânia Martins explica que o mais comum é aquele que é causado por condensação. “Depois é a humidade ascendente, por capilaridade e por infiltração”.
A especialista diz que “há casas que têm mais tendência a ter humidade, não necessariamente pelo tipo de construção nem pela idade do edifício, mas porque não têm qualquer tipo de isolamento”, e isso faz com que “a casa seja mais húmida”. No fundo, diz depende também “da localidade e da temperatura lá fora”.
Apesar de se achar que as construções recentes são imunes a humidade, Tânia Martins diz que tal não acontece. As casas mais recentes, apesar de terem “mais isolamento” do que aqueles que foram construídas há décadas, “podem também ter problemas de humidade porque o isolamento não é feito devidamente e há sempre zonas da casa que não tem qualquer tipo de isolamento”. O resultado? “Isso faz com que exista este choque entre o frio e quente e faz com que a casa tenha pontos de humidade junto aos tetos, onde passa uma viga ou pilar - é quase um problema geral.”
“O que as pessoas chamam 'humidade' e 'bolor' são fenómenos predominantemente decorrentes de condensação da atmosfera exterior em contacto com as paredes”, explica o arquitecto Rui Franco, que adianta que tal “depende predominantemente das características e da manutenção do edifício”, como é o caso da “impermeabilização”. “Muito frequentemente, a humidade tem que ver com o isolamento das casas”.
O que fazer quando há humidade em casa
Em primeiro lugar, recomenda Rui Franco, é perceber qual a origem da humidade, pois “às vezes essas humidades são resultado de infiltrações” e não tanto da condensação. Nestes casos, só mesmo com obras é que conseguirá travar o problema pela raiz.
Quando as manchas de humidade já estão nas paredes interiores, há sempre ‘mezinhas’ que podem ajudar. “Há muitos produtos específicos para limpezas de bolor”, que podem ser comprados em drogarias ou supermercado”, diz Tânia Martins, destacando que o “mais comum é a limpeza com lixívia” - “limpar com paninho com água e lixívia” e depois deixar secar bem a parede.
“Prepare uma solução de lixívia (uma parte de lixívia ou de detergente para cinco partes de água) ou detergente multiusos”, recomenda a DECO. Pode sempre consultar o fabricante da tinta que usou para saber qual a melhor estratégia a ter em conta. Usar “um produto antifungos” e aplicá-lo “com um vaporizador para plantas” é também uma recomendação do organismo.
Em alguns casos pode ser necessário voltar a estucar a parede ou, quando em causa está a humidade ascendente, pode ser uma mais-valia "a colocação de uma membrana de estanquidade ou a injeção de um produto hidrófugo", diz ainda a DECO.
Adaptar alguns hábitos e criar outros novos - como pode ler a seguir - são formas de atenuar a humidade existente e até de prevenir o aparecimento de nova, embora a arquiteta Tânia Martins deixe claro que é “não há muitas formas de prevenir” pois o ideal é “a casa estar bem isolada, ter estanquidade ao ar, ter ventilação, mas maior parte das casas em Portugal não consegue, é muito difícil prevenir a humidade”.
Como tentar prevenir a humidade em casa
Como “soluções” para a prevenção, o arquiteto Rui Franco destaca “reforçar o isolamento das casas, em casa preexistentes através de sistemas de isolamento exterior” e também “verificar e corrigir alguma fuga de impermeabilização que exista em coberturas e fachadas”.
Segundo explicou a DECO à CNN Portugal, todas as edificações devem ser objeto de obras de conservação pelo menos uma vez em cada período de oito anos.
E quando não há “possibilidade de isolar a casa num todo, até porque em construções mais antigas é mais difícil de fazê-lo”, a arquiteta Tânia Martins diz que o melhor “é ventilar ao máximo”. No entanto, continua, “com o tempo que está lá fora, que está muito húmido, é difícil, não há milagres” e nesses casos “temos de usar um desumidificador”.
Quando a humidade e o posterior bolor não se ficam apenas pelas paredes e tectos da casa, afetando também utensílios de cozinha, objetos, embalagens de alimentos e até roupas, há alguns critérios a ter em conta. No caso dos lençóis, por exemplo, uma vez que a humidade se acumula no tecido enquanto dormimos, puxar os lençóis ou o edredão para trás durante alguns minutos para que possam respirar antes de se fazer a cama ajuda a reduzir a humidade e a evitar ácaros e bactérias, como explica Manal Mohammed, professor de microbiologia médica na Universidade de Westminster.
No caso da roupa, pode ser vantajoso evitar secá-la dentro de casa, recomenda a DECO, que no seu site dá dicas básicas para travar a humidade. Uma delas é tapar as panelas e ligar o exaustor enquanto se cozinha.
Reduzir humidade em casa:
— BestWeather (@bestweather_) January 9, 2023
-Arejar, mesmo que esteja a chover, sem deixar arrefecer a casa.
-Nunca secar/trazer coisas molhadas para dentro.
-Manter a casa a 18-22ºC. Investir em isolamento. Radiadores sempre em paredes interiores.
-Desumidificador se ainda assim a humidade >65%.
— BestWeather (@bestweather_) January 9, 2023
Quando estas estratégias - sozinhas ou em conjunto - não são suficientes, investir num desumidificador pode ser uma opção, uma vez que este aparelho ‘capta’ a água em excesso no ar. Tânia Martins diz que o desumidificador “pode ajudar, não vai ser suficiente mas pode ajudar em zonas mais críticas da casa, que não tenham exposição solar ou nas casas de banho e na cozinha”, podendo também ser uma mais-valia para quem tem “de estender a roupa em casa”.
“Utilizar caixas desumidificadoras (encontram-se à venda na maioria dos supermercados) em locais com mais tendência a serem húmidos ou que não têm ventilação, como roupeiros ou casas de banho”, é um outro conselho dado pela arquiteta, que usa as redes sociais para dar conselhos para uma melhor manutenção do lar.
Tânia Martins recomenda ainda “tentar tomar banho com a porta fechada e depois de tomar banho manter a porta fechada” e “usar o extrator da casa de banho”. Nos quartos, a arquiteta sugere “abrir os roupeiros e não enchê-los demasiado para termos circulação de ar”.
Nas casas muito propensas à humidade, Tânia Martins diz que é essencial “evitar ter muitos objetos naturais, como cestas de verga”, pois mais facilmente podem ceder ao bolos. “As madeiras cruas têm de ser todas envernizadas, é preciso ter cuidado com cortinados encostados a paredes - que têm humidade ascendente, pois ganham bolor”.
Na hora de tentar prevenir a humidade ou, pelo menos, tentar prevenir dificuldades em lidar com a humidade, Tânia Martins recomenda “pintar [o interior da casa] com uma tinta antifúngica e de preferência semiacetinada, porque as tintas mate têm mais tendência a absorver a humidade”, enquanto as semiacetinadas “têm um ligeiro brilho” e acabam “por ter uma camada mais protetora, uma superfície mais lisa e daí acabam por ser mais eficientes para casas de banho e cozinhas”. Mas não há milagres - mesmo com tintas menos propensas a ceder à humidade, esta pode sempre aparecer.