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Os dados são de 2021 mas tornaram-se agora públicos: dizem que o salário médio de quem tem o ensino superior está nos 2.414€ brutos e nos 1.126€ para quem fez até ao 9.º ano. Já a mediana diz que metade dos trabalhadores têm salários abaixo dos 1.050€. Os números diferem em larga medida entre si mas estão todos corretos. Acontece que se olharmos apenas para a moda, média ou mediana, então vamos chegar a diferentes conclusões, pelo que é preciso analisar as três variáveis.
Os mesmos dados divulgados pelo Instituto Nacional de Estatística (INE), tirados a partir da informação de quatro milhões de trabalhadores junto da Autoridade Tributária (AT), concluem que existe uma “elevada concentração de trabalhadores em rendimentos baixos”. Vamos, então, pegar por uma das pontas.
A desigualdade entre áreas profissionais
O sector da "eletricidade, gás, vapor, água quente e fria e ar frio" é uma categoria profissional que abrange a produção, transporte, distribuição e comércio destes mesmos elementos. Esta área é uma das mais bem pagas do país e a mediana deste sector diz que metade dos seus trabalhadores ganha até 3.100€ brutos por mês. A outra metade recebe acima deste valor.
Na maioria das outras áreas, a mediana salarial (ou seja, o número que está no meio da lista de todos os salários, organizados por ordem crescente) está em valores mais modestos. No sector do "alojamento, restauração e similares", por exemplo, metade dos trabalhadores recebe até 850€ brutos, um valor que também se aplica ao setor da "agricultura, produção animal, caça, floresta e pesca".
Contudo, também existe desigualdade salarial dentro das próprias áreas profissionais. O sector das "atividades financeiras e de seguros", por exemplo, tem metade dos trabalhadores a ganhar até 2.400€ brutos mensais. A outra metade não só recebe acima como 1,6% ganham mesmo, no mínimo, 10.000€ brutos por mês.
Mesmo que as pessoas a receber mais de 10 mil euros sejam uma minoria, existe uma diferença tão grande para o número de pessoas a receber menos, que a média salta para os 2.800-2.850€ brutos. O mesmo acontece na generalidade da força de trabalho portuguesa, pelo que se olharmos só para a média, estamos a ver apenas uma parte da realidade.
No entanto, também a mediana tem as suas limitações. No sector de "atividades financeiras e seguros", se dividirmos todos os trabalhadores em dois grupos verificamos que a primeira metade não recebe toda por igual.
A proporção de trabalhadores a receber entre 1.800-1.850€ brutos é de 1,8%. Contudo, existe uma quantidade igualmente relevante de trabalhadores a receber menos de 250€ brutos (0,9%), outra camada de pessoas no patamar dos 850-900€ brutos (1,3%) e assim subsequentemente. Como tal, dizer que metade dos trabalhadores desta área recebe até 2.400€ é uma simplificação que não destaca os trabalhadores precários.
Desigualdade aumentou? Depende do ponto de vista
Regressando agora ao mote inicial do artigo publicado há uma semana - as diferenças no salário consoante a escolaridade -, se pegarmos na moda podemos ver que é mais frequente encontrar um baixo ordenado do que o contrário. A moda mostra qual o salário em particular que mais se repete e, em 2021, este era o intervalo entre os 850€ e 900€ brutos, independentemente do nível de escolaridade. Ou seja, há mais pessoas neste intervalo salarial do que em qualquer outro.
Embora o número de pessoas a ganhar 850€-900€ brutos esteja em queda desde 2019, a moda mostra que este continua a ser o patamar mais comum, quer uma pessoa tenha ensino básico ou o ensino superior. Aliás, entre todos os trabalhadores portugueses, 7,6% estão especificamente neste intervalo salarial.
A desigualdade salarial também pode ser vista de outro ângulo. Em termos globais, o INE destaca que, em 2021, o rendimento dos 20% mais ricos foi 5,7 vezes superior ao dos 20% mais pobres. Contudo, o INE também destaca que este fosso tem estado a encolher desde 2019, altura em que os 20% dos mais ricos ganhavam 6 vezes mais que os 20% mais pobres.
Se, por outro lado, compararmos os 5% mais ricos contra os 5% mais pobres, então o fosso salarial cresceu, já que este rácio aumentou de 18,8 em 2020 para 19 em 2021.
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