Desemprego aumenta e bate previsões do Governo e do Banco de Portugal. Economistas esperam aumento adicional, mas moderado - TVI

Desemprego aumenta e bate previsões do Governo e do Banco de Portugal. Economistas esperam aumento adicional, mas moderado

  • Filipe Maria
  • 8 fev 2023, 18:00
Baixa de Lisboa, turismo, pessoas. Foto: Jorge Mantilla/NurPhoto via Getty Images

A taxa de desemprego referente aos três últimos meses de 2022 aumentou, tanto face ao trimestre anterior, como face a igual período de 2021. A sensação é a de um fim de ciclo

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A taxa de desemprego em 2022 fixou-se nos 6%, segundo os dados divulgados esta quarta-feira pelo INE. Um valor que representa uma melhoria face aos 6,6% registados em 2021 e que é mesmo o melhor resultado dos últimos 20 anos, sendo preciso recuar até 2002 para encontrar uma taxa de desemprego tão baixa, altura em que era de apenas 5%.

Estas poderão ter sido, no entanto, as únicas boas notícias divulgadas pelo Instituto Nacional de Estatística (INE). Desde logo, porque o valor alcançado em 2022, já fica acima das previsões do Governo, que apontava para um valor de 5,6%, e acima da previsão do Banco de Portugal, que previa uma taxa de 5,9%. Por outro lado, a taxa de desemprego registada 2022 já ultrapassa as previsões para 2023, uma vez que tanto o Governo como o Banco de Portugal preveem para este ano o mesmo valor que previam para 2022.

Ao mesmo tempo, apesar de os dados de 2022 revelarem uma taxa de desemprego historicamente baixa, a tendência dos últimos meses tem sido a de um aumento do desemprego. No segundo trimestre a taxa de desemprego atingiu os 5,7%, no terceiro subiu para 5,8% e no último trimestre do ano foi de 6,3%. Uma tendência que também já tinha sido evidenciado pelo Instituto do Emprego e Formação Profissional (IEFP). Segundo esta entidade, as inscrições nos centros de emprego do país já sobem há cinco meses consecutivos, superando as 307 mil pessoas.

O "final de um ciclo"?

Para o economista João Cerejeira, especialista em questões de trabalho e professor de economia na Universidade do Minho, a sensação é a de que, provavelmente, “estamos no final de um ciclo de forte crescimento do emprego”, já que o aumento da taxa de desemprego (nos últimos três meses de 2022) se deu tanto em comparação com o trimestre anterior, como face a igual período de 2021.

Em linha com os dados divulgados, o professor na Universidade do Minho destaca que houve um aumento da taxa de desemprego tanto face ao registado no trimestre anterior (5,8%), como em comparação com igual trimestre de 2021 (6,3%). Ou seja, mais 37 mil desempregados face ao trimestre anterior e mais 12 mil face a igual trimestre do ano de 2021.

Por um lado, continua o economista, existe uma transição de pessoas de uma situação de inatividade para o desemprego, algo que acontece “quando os inativos veem que há perspetivas de emprego”. O efeito até pode parecer contraditório face ao aumento trimestral do desemprego, admite João Cerejeira, mas este acrescenta que existe um “lag” de expectativas dos inativos. “Se eles procuram emprego, é porque visualizam oportunidades”.

Por outro lado, tendo em conta que os dados mensais já mostravam um aumento, o economista considera agora que o desemprego irá continuar a crescer em termos de volume. “Não muito, mas irá crescer”, acrescenta. Para João Cerejeira, não está em cima da mesa o cenário de uma taxa de desemprego superior a 7% no final de 2023, mas considera que esta ficará acima dos 6%.

A alimentar o crescimento da taxa de desemprego esteve também um contexto de “condições climáticas desfavoráveis”, que acabaram por ter um efeito “significativo” em atividades como a construção, agricultura e o turismo. Neste sentido, o economista considera que também pode estar em jogo um contexto sazonal, sendo que estas atividades podem retomar a atividade normal nos próximos trimestres, havendo assim espaço para número mais favoráveis.

A ameaça vem do exterior, mas o desagravamento fiscal pode ser útil

Para o economista Ricardo Ferraz, investigador do ISEG e professor na universidade Lusófona, desde agosto do ano passado que a taxa de desemprego tem estado a aumentar, pelo que considera “bastante otimistas” as projeções existentes tanto do Governo, como do Banco de Portugal.

Em dezembro, a nossa taxa de desemprego voltou novamente a ultrapassar a da média da Zona Euro e da União Europeia. Se olharmos para a taxa de desemprego jovem, vemos que, em dezembro, Portugal regista mesmo a 11.ª taxa de desemprego mais elevada nos 27 da União Europeia”, Ricardo Ferraz, investigador do ISEG e professor na universidade Lusófona.

Se desagregarmos a população desempregada por escolaridade, é possível verificar que “o grande aumento do número de desempregados parece ter sido na população sem curso superior”, sublinha o economista. Como tal, salienta a importância das pessoas se qualificarem, mas também de olharem para aquilo “que o mercado de trabalho deseja” e está disponível a receber.

Na opinião do economista, a alimentar o aumento do desemprego está a aceleração da inflação, que acaba por penalizar o poder de compra e conduzir a uma subida das taxas de juro por parte do BCE. Este aumento, embora seja um “remédio”, não é isento de efeitos secundários, como a subida das prestações do crédito à habitação. Isto leva a que as pessoas tenham menos rendimento disponível, afetando o consumo e o investimento. Por conseguinte, isto afeta o crescimento e o emprego, pelo que o economista explica que a subida do desemprego “acaba por não surpreender”.

Este contexto acaba por ter reflexos mais tangíveis. O economista partilha que, em visita a uma empresa “com alguma dimensão do setor industrial”, quando questionou se a entidade já sentia os efeitos da inflação, a resposta obtida foi que, a nível de trabalhadores, “havia pessoas com contratos mais precários que já estavam em risco de poder ir embora”. Por outro lado, “temos também instituições que vão relatando que aumentou o número de pessoas que pedem ajuda”, acrescenta.

“Quanto mais esta guerra se prolongar e não se espera que termine já, então maior a incerteza no cenário macroeconómico”, pelo que existe um “escalar das tensões”, destaca Ricardo Ferraz. O economista prossegue ao defender que a nossa economia, que "já era pouco competitiva", está desta forma a ser penalizada, nomeadamente ao nível do mercado de trabalho.

Embora a ameaça venha do exterior, sublinha Ricardo Ferraz, este considera que seria útil um desagravamento do IRS, que é “elevadíssimo e penaliza os nossos salários, que já são baixos”. Na visão do economista, esta medida seria mais útil “do que os muitos milhões que andamos a colocar em empresas falidas e a pagar salários milionários a alguns setores públicos”.

Como tal, o investigador e professor sugere a redução para as empresas de todas as componentes da taxa do IVA da energia para a taxa mínima de 6%, ou ainda a suspensão da contribuição da taxa audiovisual. Por outro lado, destaca que há quem defenda a redução da taxa de IVA nos produtos essenciais, como o caso da Espanha, para 6%.

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