“O FBI e outras três agências contactam miúdos doentes mentais e desequilibrados e convencem-nos a executar tiroteios em massa.” Esta é uma das frases que Jack Douglas Teixeira, jovem militar da Guarda Aérea Nacional do Massachusetts e de ascendência portuguesa, partilhou na rede social Discord no verão de 2022 – a mesma plataforma que usou para, a partir de dezembro desse ano, partilhar informação classificada do Pentágono, naquela que é já considerada uma das maiores fugas de informação confidencial a ter lugar nos Estados Unidos.
A sugestão remonta a uma teoria da conspiração surgida após um homem armado ter matado três pessoas num centro comercial no estado do Indiana dias antes da publicação. Informações apuradas pelas autoridades norte-americanas após a detenção de Teixeira, em abril de 2023, à porta de casa da mãe, no Massachusetts, demonstram o seu historial de ameaças racistas e violentas e acesso a um arsenal de variadas armas.
Chegou a suspeitar-se de que as ações do jovem lusodescendente podiam representar crimes de espionagem ilegal. Mas concluída a investigação ao caso, foi determinado que Teixeira foi movido por um único motivo: o de “impressionar os seus amigos online”, partilhando documentos secretos que, entre outras, continham informações sobre a guerra na Ucrânia.
Entre os segredos revelados incluíam-se relatórios sobre o fornecimento e entrega de equipamento militar à Ucrânia, um relatório confidencial sobre os movimentos das tropas russas e ucranianas no terreno, um relatório sobre o acesso a contas de uma empresa norte-americana por um “adversário estrangeiro” e detalhes sobre um alegado plano para atacar tropas dos EUA no estrangeiro, com detalhes sobre “onde e como” esse ataque teria lugar.
Segundo a procuradoria federal, a divulgação de informações sobre a movimentação de tropas no terreno na sequência da invasão russa da Ucrânia “pode ter comprometido” a recolha de informações secretas sobre essa guerra pelos norte-americanos e as fontes através das quais as adquire.
Na sua primeira audiência judicial, na qual Teixeira se declarou inocente das acusações de uso inapropriado e publicação de segredos da defesa nacional norte-americana, a equipa de defesa tentou pintá-lo como um jovem militar trabalhador, sem cadastro criminal e sem histórico de problemas mentais, argumentando que não representava um perigo para a sua comunidade ou um risco para a segurança nacional.
A isto o Ministério Público contrapôs com factos desenterrados do seu passado, a começar pelo facto de ter sido suspenso do liceu em 2018 por comentários “alarmantes” sobre o uso de cocktails molotov e outras armas, dedicando-se ao longo de anos a vasculhar a internet em busca de informações sobre tiroteios em massa. Nos documentos judiciais é indicado que Teixeira usou o Discord para “discussões regulares sobre violência e homicídio” e que, na casa da mãe, onde vivia quando não estava ao serviço da 102.ª unidade de inteligência militar na base da Força Aérea em Cape Cod, dormia rodeado de armas de fogo e equipamento tático.
Dez meses depois de ter sido detido, Jack Teixeira planeia agora declarar-se culpado, adiantaram duas fontes próximas do processo ao New York Times na quinta-feira, após a equipa de defesa ter pedido uma nova audiência com base na chamada regra 11, que prevê precisamente uma mudança de fundamento pelo réu. Uma investigação do mesmo jornal, que se debruçou sobre mais de 9.500 das suas mensagens no Discord, comprova a obsessão do jovem com armas, tiroteios em massa e teorias da conspiração sombrias – como a de que as secretas dos EUA procuram jovens mentalmente instáveis para levarem a cabo esses tiroteios.
Caso se declare culpado, o jovem lusodescendente enfrenta uma pena inferior à pena máxima de 60 anos prevista para casos destes, adianta o jornal nova-iorquino. Quando foi presente a um grande júri federal, em junho de 2023, confirmou-se que Teixeira enfrenta seis acusações formais de retenção e partilha de informação de defesa confidencial.
Se mantivesse a declaração de inocência podia ser condenado a penas consecutivas de prisão num total máximo de 60 anos e ao pagamento de até 1,5 milhões de dólares de multa. Declarar-se culpado abre a possibilidade de enfrentar uma pena menor, indicam os media norte-americanos. Mesmo assim, destaca a CNN Internacional, Teixeira pode passar décadas na prisão. “Tipicamente, qualquer acordo alcançado entre os advogados de defesa criminal e a procuradoria inclui uma potencial pena de prisão menor, mas qualquer eventual sentença será decidida pelo juiz” a cargo do processo. A audiência está marcada para a próxima segunda-feira de manhã.