Caso Spinumviva esbarrou numa parede. Agora os procuradores querem mais para investigar Montenegro - TVI

Caso Spinumviva esbarrou numa parede. Agora os procuradores querem mais para investigar Montenegro

Montenegro em Albufeira

Procuradores responsáveis pelo caso Spinumviva entenderam que deve ser aberto um inquérito formal ao primeiro-ministro. Será esta a única forma de ultrapassar os limites que a averiguação preventiva enfrenta neste momento. Em comunicado oficial, a Procuradoria-Geral da República esclarece que a averiguação vai continuar

Seis meses depois do anúncio da averiguação preventiva ao caso da empresa familiar de Luís Montenegro, os magistrados responsáveis entenderam que o primeiro-ministro deve mesmo ser alvo de um inquérito, como foi noticiado em primeira mão pela CNN Portugal esta terça-feira. Este desenvolvimento, segundo explicam procuradores, provavelmente indicia que o caso embateu numa “parede onde não se consegue avançar mais”. 

Isto porque a averiguação preventiva não mais é do que uma avaliação preliminar que é feita, por exemplo, na sequência da receção de denúncias, e que limita a investigação dos procuradores ao uso de fontes abertas e da documentação que o próprio visado, neste caso Luís Montenegro, esteja disponível ou não para entregar ao Ministério Público. 

Assim, para os procuradores terem acesso a tudo aquilo que está fora da esfera pública ou dependente da proatividade de Luís Montenegro, o Ministério Público terá mesmo de avançar para um inquérito formal e só assim conseguir, eventualmente, ouvir testemunhas, quebrar o sigilo bancário e avançar com buscas para a apreensão de documentação tida como revelante. 

A averiguação preventiva ao caso Spinumviva foi aberta pelo Ministério Pública em março deste ano após a receção de três queixas relacionadas com a empresa da família do primeiro-ministro. Na altura, Amadeu Guerra explicou que a Procuradoria-Geral da República (PGR) esteve a “recolher elementos”, sendo que naquele momento não havia “fundamento para abrir qualquer inquérito”

Mas o tom foi mudando desde março, com Amadeu Guerra, em várias entrevistas, a admitir a possibilidade de um inquérito ser instaurado. Na última que fez, ao Nascer do Sol, sublinhou que iria fazer um ponto de situação com o diretor do Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP) sobre vários inquéritos e indagar as razões da demora da averiguação preventiva, que, disse, queria ter visto concluída antes das férias judiciais.

Agora que o Ministério Público terminou de analisar ao detalhe todas as denúncias que recebeu, os procuradores responsáveis pelo caso entenderam que, em algumas das queixas, a qualidade e o pormenor era tal que indiciava conhecimento de causa e acesso privilegiado. 

Indícios esses que, como explicam magistrados que falaram com a CNN Portugal, só o inquérito poderá esclarecer. E aí poderá, desde logo, aparecer um problema logístico: à partida, todo o trabalho que os magistrados encarregues do caso têm reunido nos últimos meses terá de ser reconstituído se e quando o inquérito avançar. 

MP ainda aguarda por documentação

Montenegro reagiu à notícia da CNN Portugal durante uma ação de campanha em Albufeira. Diz-se "revoltado" / LUSA

A existir, esse inquérito teria de ser comandado por um procurador-geral Adjunto e teria também de ser formalmente aberto no Supremo Tribunal de Justiça, dado o cargo do principal alvo da investigação - foi o que aconteceu com António Costa logo no início da Operação Influencer, por exemplo. Para que isso aconteça, contudo, a palavra final é do procurador-geral da República, Amadeu Guerra, que até ao momento mantém o jogo em aberto. 

Como explica o especialista em direito penal Rogério Alves, Amadeu Guerra "não tem prazo" para tomar a decisão sobre se concorda ou não com a perspetiva dos procuradores, uma vez que a "averiguação preventiva carece de regulamentação dessa natureza e o único que prazo que tem é um, que ainda é longo, que é o da prescrição". Ainda assim, o advogado garante que a "pressão pública" pode ter um efeito no calendário. "O pior de tudo é não haver decisão, é a perpetuação desta incerteza".

Em reação à notícia da CNN Portugal, a PGR avançou com um comunicado em que explica que ainda não recebeu, formalmente, nenhuma proposta sobre este assunto. A averiguação também ainda não terminou e o Ministério Público continua a aguardar documentação que, depois, carecerá de análise. “Não há, assim, neste momento, qualquer convicção formada que permita encerrar a referida averiguação preventiva”, afirma o gabinete de imprensa da PGR.

Quais são as prioridades da investigação do MP?

Para já, sabe-se que a investigação terá como prioridade quatro eixos: a prestação de serviços da Spinumviva a diferentes clientes, a aquisição de dois apartamentos em Lisboa por Montenegro, a relação entre o primeiro-ministro e a construtora ABB (que forneceu o betão para a construção da sua casa de Espinho) e, por último, as férias que Montenegro passou no Brasil, em 2023.

Entre as prioridades do Ministério Público está a intenção de querer conhecer a fundo os contratos e as datas em que foram celebrados para prestação de serviços da Spinumviva a diferentes empresas. A ideia é assegurar se foram reais e se não coincidiram com os tempos em que Luís Montenegro já desempenhava funções de líder parlamentar do PSD e depois mesmo como primeiro-ministro. 

Sobre a aquisição dos dois apartamentos em Lisboa - um investimento no total de 715 mil euros -  os procuradores querem que seja apurado o circuito financeiro até à origem dos fundos, algo que só será possível através de quebras de sigilo bancário. 

Há ainda a intenção dos magistrados de analisar a contabilidade da Spinumviva com o objetivo de esclarecer denúncias que chegaram ao MP de que a empresa familiar do primeiro-ministro serviu para financiar despesas de uma viagem de férias que Montenegro fez ao Brasil, no verão de 2023, já como chefe do Governo.

Em reação, durante um evento de campanha autárquica em Albufeira, Montenegro disse estar “completamente tranquilo”, mas “absolutamente estupefacto” e “revoltado com o teor das notícias”. “A virem de alguém ligado ao processo configuram uma situação que é uma pouca vergonha, de uma deslealdade processual, democrática, que é intolerável e que eu não aceito de maneira nenhuma”.

O chefe do Executivo assegurou que estas notícias “não o intimidam” e pediu aos portugueses que “não se deixem levar por manobras” – que classificou como obscuras - “a três ou quatro dias do encerramento de uma campanha eleitoral e de uma escolha que devem fazer em total liberdade”.

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