«Prefiro jogar para subir na II Liga do que jogar na Liga para não descer» - TVI

«Prefiro jogar para subir na II Liga do que jogar na Liga para não descer»

Luís Rocha (FOTO: Santa Clara)

Entrevista com Luís Rocha, o central de 36 anos que já conta quatro subidas à Liga: este ano voltou a fazê-lo, com o Moreirense, e saiu para na próxima época tentar somar mais uma promoção, agora no Santa Clara.

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A história de Luís Rocha é verdadeiramente encantadora. Natural de Guimarães e formado no Vitória, teve de percorrer uma longa travessia do futebol português, até ganhar o direito a assinar o primeiro contrato profissional. Tinha na altura 27 anos.

Até então, até aos 27 anos, fez um pouco de tudo para poder continuar a alimentar a paixão pelo futebol, enquanto jogava nas divisões inferiores. Chegou até a trabalhar no McDonalds. Hoje tem 36 anos e tornou-se o rei das subidas à Liga.

Depois de conseguir a promoção com Famalicão, Farense e Desp. Chaves, este ano voltou a fazê-lo com o Moreirense. Na próxima época, vai tentar com o Santa Clara. Só não gosta que lhe chamem rei das subidas, porque a idade já lhe ensinou que não há poções mágicas.

Há, sim, grupos fortes e com toda a gente a remar para o mesmo lado.

Sente que está para os jogadores como o Vítor Oliveira estava para os treinadores?

Não, nada disso. Nem gosto de falar disso, porque eu, como jogador, nem metade das conquistas de Vítor Oliveira consegui. O que eu quero é fazer o trabalho da melhor forma, ser bom profissional, ajudar os colegas e corresponder ao que a equipa técnica quer de mim.

Mas admite que pode ser visto como um talismã para as equipas que querem subir?

Sim, estaria a mentir se dissesse que não, até porque ouço os comentários dos colegas. Mas, lá está, o mais importante é atingir os objetivos dos projetos em que estou envolvido. Isso é que faz a diferença, a qualidade do trabalho, e por isso não quero pensar se sou um talismã ou não.

De todas as subidas, qual foi para si a mais saborosa?

Todas elas tiveram um sabor especial. O Famalicão já não estava há muitos anos na Liga, por exemplo, o Farense também tinha feito uma longa travessia do futebol português. O Desp. Chaves e o Moreirense tinham descido e voltaram a subir. É sempre um sabor especial, subir é sempre uma coisa fantástica. Mas acho que esta última foi diferente. O Moreirense andou em primeiro o campeonato todo, conseguiu mostrar que era uma equipa realmente forte e foi campeão com dez pontos de vantagem. Por isso esta pode ter sido ligeiramente mais saborosa.

Pois, porque esta foi a quarta subida, mas foi o primeiro título de campeão.

Já tinha sido campeão no Mirandela, mas foi da III Divisão, quando subimos à II B. Ser campeão numa II Liga é especial.

Porquê?

Porque temos a festa com palco, a medalha, levantamos uma taça, enfim, a festa é mais rica. A satisfação é a mesma, sendo campeão ou não, a subida é o mais importante, mas a festa é um bocadinho diferente.

Prefere lutar para subir ou lutar para não descer?

Sem dúvida, lutar para subir. O estado espírito é outro. Quando estás num projeto em que ganhas mais vezes do que perdes, o sentimento é melhor, há mais alegria no treino, sentes mais satisfação, sentes que estás a fazer as coisas bem e o gosto no trabalho é outro.

Mas prefere lutar para subir numa II Liga do que para não descer na Liga?

Lutar para não descer na Liga é muito complicado, e eu digo isso aos meus colegas. Vais perder mais vezes, estás mais exposto à comunicação social, o que é normal, os próprios adeptos não estão tão satisfeitos e as redes sociais carregam com comentários menos positivos. Por isso digo que é melhor lutar para subir, num clube que acredita em ti. Estás constantemente a ser valorizado. Para mim é mais positivo e prefiro um projeto assim.

E é por isso que sempre que sobe depois sai da equipa?

Não, depende dos casos. Eu vou para onde me querem. Já aconteceu conseguir subir e optar eu por voltar à II Liga, porque me apresentaram melhores projetos, como já tive casos em que subi e o clube não quis continuar comigo.

O Luís Rocha já tem 36 anos e só teve uma curta experiência no estrangeiro…

Sim, seis meses no Dínamo Minsk.

Exato. O estrangeiro nunca o atraiu?

Nunca se proporcionou. Houve algumas oportunidades, que não se concretizaram. Concreta apenas houve essa do Dínamo Minsk. Foi uma experiência enriquecedora, embora desportivamente não tenha corrido muito bem, não me adaptei. A mentalidade é totalmente diferente, nós somos mais calorosos, mais atenciosos com os estrangeiros, até porque eu sou uma pessoa que gosta de interagir muito no balneário e na Bielorrússia não conseguia porque muito poucos falavam inglês.

Quem o contrata já sabe que está a contratar também um líder de balneário?

Sim, quem me contrata tem sempre a preocupação de me pedir para transmitir a minha experiência, para falar com os mais jovens e para alertar o grupo para as dificuldades da luta pela subida. Tenho a perfeita noção que os clubes me contratam também por causa disso.

E sente que no balneário os outros jogadores já olham para si como uma certa deferência?

Este ano, por exemplo, tinha colegas que brincavam: Ah e tal, este ano temos o Rocha, portanto vamos subir. Mas eu não gosto e digo-lhes para não fazerem esse tipo de comentários. O futebol vale pelo coletivo e não é por causa deste ou daquele que vamos subir. O Rocha é mais um para ajudar e todos somos importantes. Se não estivermos todos, jogadores, treinadores, dirigentes, adeptos, todos envolvidos no mesmo sentimento, não vamos conseguir.

Mas pelo seu passado, a responsabilidade agora no Santa Clara vai ser maior?

Não, a responsabilidade é igual para todos. Os jogadores que já lá estão, os que vão chegar, o staff de apoio, enfim, temos de construir um bom grupo de trabalho, coletivamente forte e que esteja consciente da importância de remar junto para o mesmo lado para poder ter sucesso. Eu sei que tenho de transmitir a minha experiência, mas a responsabilidade é todos igual.

Agora vai para os Açores, mas é curioso porque olhando para a sua carreira, ela foi quase toda feita no Minho ou perto do Minho.

Sim, eu sou de Guimarães, fiz a formação toda no Vitória e no primeiro ano de sénior fui emprestado ao Torcatense, aqui também da zona. Depois andei pela Oliveirense, de Famalicão, Merelinense, de Braga, andei pelo Vizela, e só quando fui para o Covilhã assinei o primeiro contrato profissional.

Já tinha 27 anos quando se tornou profissional...

Sim, foi o primeiro ano em que fui profissional. No Torcatense cheguei a trabalhar no McDonalds, na Oliveirense trabalhei numa loja de roupa, no Mirandela só joguei futebol, mas no Merelinense era instrutor num ginásio, enfim.

Ou seja, antes de ser o rei das subidas, lutou muito para chegar onde está.

Orgulho-me muito do meu trajeto, sem dúvida. Eu vim mesmo de baixo, tive de subir todos os degraus a pulso e é uma satisfação muito grande agora ser reconhecido. Não gosto dessa coisa do Rei das subidas, mas gosto de ser reconhecido como um bom profissional, um bom colega, um jogador de grupo e que dá tudo em campo. Mas claro que eu às vezes penso no passado, olho para o que fiz e sinto um grande orgulho no que consegui conquistar. Os sacrifícios que fiz ao longo da minha vida, foram recompensados.

E durante esse processo alguma vez lhe passou pela cabeça abandonar o futebol?

Não, nunca. Eu adoro isto. Adoro o futebol, adoro o balneário, adoro o contacto entre os jogadores, as brincadeiras do dia a dia, adoro mesmo o treino. Por isso nunca pensei desistir. Mas admito que também nunca pensei chegar à Liga. Nem em sonhos. Aliás, estaria a mentir se dissesse que sonhava chegar à Liga, porque naquela altura parecia inatingível. Mas cheguei. Aos 30 anos, mas cheguei e é um orgulho enorme que sinto por o ter conseguido.

Então e agora, aos 36 anos, com o que é sonha?

É verdade que tenho 36 anos, mas também é verdade que nesta altura não consigo dizer quando vou parar. Não sei se é daqui a dois, três ou quatro anos. Enquanto me sentir bem fisicamente e estiver motivado, vou continuar a jogar futebol. Claro que se continuar a conquistar subidas de divisão, melhor, mas a ambição é sempre ajudar aos objetivos do clube. O clube agora é o Santa Clara e o objeitvo é subir de divisão.

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