O uso de medicamentos para a diabetes - como a liraglutida e a semaglutida - em tratamentos contra o excesso de peso é cada vez mais comum. Um estudo publicado no The New England Journal of Medicine no ano passado mostrou que a semaglutida reduzia o peso em cerca de 15% num grupo de quase dois mil pacientes e mais de 20% em cerca de um terço deles.
O sucesso da semaglutida nos Estados Unidos foi tal que o seu fabricante, a farmacêutica Novo Nordisk, ficou sem stock logo após a aprovação do seu uso para a obesidade. Mas na maioria dos países a liraglutida e a semaglutida estão aprovadas apenas para diabetes, não para obesidade.
Esses medicamentos são uma imitação das incretinas, hormonas que o nosso corpo produz quando comemos. "Mas são modificados artificialmente para que durem mais no corpo", explica ao El Pais Guadalupe Sabio, que investiga as bases biológicas de doenças como a obesidade no Centro Nacional de Pesquisa Cardiovascular (CNIC), em Madrid.
Entre outras coisas, estes medicamentos favorecem a produção de insulina pelo pâncreas e reduzem os níveis de glicose no sangue, o que os torna uma boa opção para o tratamento da diabetes. Mas como parte desse processo de regulação do que acontece no corpo quando os alimentos são ingeridos, “eles também reduzem o apetite, prolongando a sensação de saciedade e aumentam o metabolismo basal [a quantidade de energia que o corpo consome em repouso], aumentando o processo de produção de calor corporal”, sublinha Sabio.
Cristóbal Morales, endocrinólogo do Hospital Virgen Macarena, de Sevilha, e membro da Sociedade Espanhola de Obesidade, antevê que "uma vez conhecida a eficácia deste tipo de medicamentos, muitas empresas farmacêuticas vão testar os seus próprios produtos e a oferta vai aumentar".
O último destes medicamentos a ser aprovado nos Estados Unidos foi o tirzepatide, que, tal como os outros, recebeu primeiro a aprovação dos reguladores para a diabetes. Agora, a empresa farmacêutica que o produz, a Lilly, procurará ter a sua aprovação para a obesidade. “É tão poderoso que um em cada dois pacientes praticamente entra em remissão do diabetes”, aponta Morales. Com uma dose maior, esse mesmo produto mostrou um potencial surpreendente contra a obesidade. Um estudo recente publicado no The New England Journal of Medicine revelou que o medicamento produz uma perda de peso de 22,5%, em média, o que pode chegar a 25 quilos em alguns pacientes.
Estes valores fazem com que alguns especialistas considerem que os tratamentos farmacológicos podem alcançar os mesmos resultados das cirurgias para perda de peso, como a cirurgia bariátrica ou o balão gástrico. "Acho que o medicamento não substitui a cirurgia, mas pode ser uma alternativa para alguns tipos de excesso de peso", diz Carolina Perdomo, especialista em Endocrinologia e Nutrição da Clínica Universitária de Navarra. "Há pessoas que precisam perder peso antes da cirurgia e estes medicamentos podem servir como terapia de ponte antes da cirurgia", acrescenta.
Rubén Nogueiras, investigador da Universidade de Santiago de Compostela, considera que este tipo de tratamento para a obesidade pode ser usado de forma contínua, como é o caso dos diabéticos. "A obesidade é uma doença crónica e espera-se que o tratamento também o seja", afirma. Para isso, será necessário analisar a possibilidade de efeitos colaterais do uso prolongado, mas Nogueiras não considera que sejam muito prováveis.
“Os efeitos colaterais mais comuns são náuseas durante as duas primeiras semanas de tratamento, mas depois disso a maioria dos pacientes aceita bem o medicamento. A longo prazo, até agora, não foram encontrados efeitos colaterais significativos”, conclui. “São compostos que estimulam as vias normais do nosso corpo, por isso os efeitos colaterais são bastante baixos. Se a semaglutida desacelera o estômago e faz com que a comida fique mais tempo lá, pode-se ter desconforto digestivo, mas nada mais”, concorda Guadalupe Sabio.