Fenómeno climático recente que aquece Portugal equivale a estar dentro de um recipiente a ferver com uma tampa por cima - TVI

Fenómeno climático recente que aquece Portugal equivale a estar dentro de um recipiente a ferver com uma tampa por cima

  • CNN Portugal
  • MJC
  • 1 ago, 13:51
Onda de calor

O país vai estar quase todo acima dos 40ºC a partir deste domingo. É uma antecipação do futuro: "Não é honesto dizer que vamos ter uma temperatura mais amena nos próximos anos ou décadas"

Este domingo começa uma nova vaga de calor, com temperaturas máximas na generalidade do território português na ordem dos 43 graus, de acordo com o Instituto Português do Mar e da Atmosfera (IPMA). Também a Agência Estatal de Meteorologia de Espanha (Aemet) explica que, pelo menos até quarta-feira, as massas de ar que sobrevoarão a Península Ibérica "serão mais quentes do que o normal", confirmando que tanto no centro como no sul da península as temperaturas podem ultrapassar os 40 graus.

#Tempo: A semana de 28 de julho a 03 de agosto deverá ter o céu pouco nublado ou limpo, com temperaturas bem acima da média até dia 31 de julho.
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— IPMA (@ipma_pt) July 25, 2025

Uma depressão ou uma pequena Depressão Isolada em Níveis Altos (DANA) entre a Madeira e os Açores ajudará a impulsionar uma massa de ar extremamente quente proveniente do norte de África. Espera-se que o pico da onda de calor seja na segunda-feira, quando as subidas térmicas continuarão e se estenderão a praticamente toda a Península Ibérica, com valores próximos dos 40 graus e, muito provavelmente, superiores a 42 graus no Vale do Guadiana. A partir de quarta-feira, dia 6 de agosto, as temperaturas começam a descer.

⚠️AVISO ESPECIAL | Ola de calor.
 

🌡️ A partir del domingo, 3 de agosto, las temperaturas serán muy altas en amplias zonas de la Península.


→ El episodio durará por lo menos hasta el martes 5, aunque podrá prolongarse en la mitad sur.
 

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— AEMET (@AEMET_Esp) July 31, 2025

Será uma situação semelhante à que ocorreu há precisamente um mês, quando se registaram temperaturas superiores a 46 graus em algumas localidades do Alentejo, o que demonstra que as ondas de calor estão a tornar-se fenómenos cada vez mais comuns.

"Nos últimos 24 anos, o número de ondas de calor é muito superior à dos 60 anos anteriores", confirma à CNN Portugal o climatologista Pedro Garrett. "Isto é uma consequência direta da emissão de gases de efeito estufa e daquilo que é o aquecimento geral da atmosfera. Isto é bastante preocupante. Temos um conjunto de outros fenómenos que conseguimos medir, que de alguma forma ainda potenciam mais ou agravam também os incêndios, nomeadamente a expansão do anticiclone dos Açores, que é muitas vezes responsável pelo tempo mais quente e mais seco no Mediterrâneo. E há também um efeito que é relativamente recente, aquilo a que chamamos 'efeito de cúpula', que prolonga os períodos mais secos e mais quentes na zona do Mediterrâneo e noutros sítios, como por exemplo nos Estados Unidos."

Na prática, a "cúpula de calor" é como se uma tampa gigante fechasse o oceano em redor, impedindo a libertação de energia, o que acaba inevitavelmente por aquecer o ar. Como se estivéssemos dentro de um recipiente a ferver.

"Não é honesto dizer que vamos ter uma temperatura mais amena"

"A tendência é para um aumento da temperatura média global, em especial na Europa. Isto porque o hemisfério norte tem mais superfície terrestre do que o hemisfério sul. Nesse sentido, há um potencial de aumento da temperatura que é superior àquilo a que nós chamamos 'média global'", explica Pedro Garrett. "Portanto, não é honesto pensar que durante os próximos anos ou décadas possamos vir a ter uma temperatura mais amena. As tendências não são essas e nós sabemos isso desde o início deste século - são dados perfeitamente conhecidos e estudados. Hoje em dia conseguimos medir os impactos causados pelo aumento de gases de efeito de estufa e isso é que torna a investigação científica que tem sido feito até à data muito mais relevante, porque hoje conseguimos medir efetivamente o que está a acontecer."

Os impactos são também medidos em termos económicos, explica o climatologista. "Se contabilizarmos os impactos causados por eventos climáticos e meteorológicos extremos, entre 1980 e 2000, em média, Portugal gastava por ano cerca de 70 milhões de euros. Isto são dados corrigidos à inflação de 2023, incorporando os impactos diretos e indiretos. Os impactos indiretos têm que ver com os efeitos na mortalidade e na morbilidade, nos serviços dos ecossistemas, por exemplo, quando uma fábrica pára a sua atividade devido aos incêndios. Portanto, durante a década de 80 até 2000, nós conseguimos, tínhamos uma média de 70 milhões de euros por ano de custos devidos ao aumento das temperaturas. Desde 2000 até 2023, e com dados corrigidos novamente à inflação, gastamos cerca de 600 milhões de euros com impactos diretos e diretos. É cerca de quase 10 vezes mais."

É expectável também que se observe um aumento da mortalidade associada ao calor extremo, confirma Pedro Garrett. "Os mais idosos, pessoas com doenças cardiovasculares, doenças respiratórias, são mais vulneráveis. O aumento da mortalidade é um impacto direto das ondas de calor e da pobreza energética - estamos a falar do conforto térmico nos edifícios. Estes são impactos que podem ser transversais à nossa sociedade, do ponto de vista ambiental, económico e social."

Solos entram em stress

Este é um cenário preocupante também para o combate às chamas, de acordo com o IPMA: "Temos um período prolongado sem chuva e portanto os solos começam a entrar em stresse, ficam cada vez mais secos, e isso aumenta o risco de incêndio. Depois, com o disparar das temperaturas e algum vento nas terras altas, claro que o risco de incêndio vai aumentar".

Pedro Garrett sublinha que a maioria dos incêndios em Portugal tem origem humana, seja por negligência, seja por origem criminosa. "A tempestade perfeita é precisamente a combinação entre as ignições e as condições meteorológicas que tornam estes focos de incêndio muito mais gravosos e mais extensos, como já tem vindo a acontecer nestas últimas décadas, nomeadamente em 2003, 2007. Todos estes incêndios têm dimensões a que não estávamos habituados. Mas temos de aprender sempre com os eventos passados e tentar redimensionar a nossa resposta para combater, por um lado, as ignições e, por outro lado, gerir de uma forma correta a nossa floresta para que os impactos sejam minimizados."

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