O empresário Francisco Pessegueiro, arguido no processo Vórtex, disse esta quinta-feira em tribunal que o ex-presidente da Câmara de Espinho Pinto Moreira lhe pediu 50 mil euros para aprovar dois projetos urbanísticos, o que foi negado pelo ex-autarca do PSD.
Durante o início do julgamento que começou esta quinta-feira no Tribunal de Espinho, no distrito de Aveiro, Francisco Pessegueiro referiu que o dinheiro foi pedido pelo então presidente da Câmara de Espinho, durante um encontro num café no centro da cidade, numa altura em que estavam em discussão três projetos estratégicos, para a construção de um lar, um hospital e um hotel.
“Foi aí que me foi pedido pelas ‘démarches’ políticas dele, que seriam necessários 25 mil euros para o lar, 25 mil euros para o hospital e, relativamente ao hotel não conseguiu quantificar porque era muito problemático a zona onde estava inserido”, disse o empresário.
Questionado pelo juiz presidente, Pessegueiro disse que aceitou pagar os valores pedidos para evitar que os seus projetos fossem “atirados para uma gaveta”.
“É muito complicado para um cidadão comum que precisa da câmara dizer o que quer que seja. A resposta é tácita porque a probabilidade de os meus projetos entrarem para uma gaveta e não se verem mais era total”, disse o empresário, adiantando que não fez queixa porque poderia ter um processo de difamação ou outro tipo de problemas.
Pessegueiro esclareceu ainda as ‘démarches’ de Pinto Moreira seriam para garantir a aprovação dos referidos projetos com caráter estratégico na reunião de câmara, adiantando que o dinheiro seria pago após a venda dos equipamentos, o que nunca chegou a acontecer.
Questionado pelos jornalistas à saída do tribunal, após a pausa para o almoço, Pinto Moreira negou ter pedido qualquer dinheiro a Francisco Pessegueiro.
“Eu nunca pedi dinheiro a ninguém e isso vai ser provado em julgamento”, afirmou o ex-autarca que em Tribunal disse que apenas iria prestar declarações “no momento que entender mais adequado”.
“O senhor Francisco Pessegueiro disse numa primeira instância que me tinha entregue dinheiro e hoje acabou por reconhecer que não me entregou dinheiro nenhum. Portanto, a coerência das declarações está demonstrada”, acrescentou.
O processo Vórtex, em que se investigam atos de corrupção envolvendo dois antigos presidentes da Câmara de Espinho, está relacionado com "projetos imobiliários e respetivo licenciamento, respeitantes a edifícios multifamiliares e unidades hoteleiras, envolvendo interesses urbanísticos de dezenas de milhões de euros, tramitados em benefício de determinados operadores económicos”.
A operação culminou em 10 de janeiro de 2023 com a detenção do então presidente da Câmara de Espinho, Miguel Reis (PS), o chefe da Divisão de Urbanismo e Ambiente daquela autarquia, um arquiteto e dois empresários por suspeitas de corrupção ativa e passiva, prevaricação, abuso de poderes e tráfico de influências.
Em 10 de julho do mesmo ano, o Ministério Público deduziu acusação contra oito arguidos e cinco empresas, incluindo dois ex-presidentes da Câmara de Espinho, Miguel Reis e Pinto Moreira, que também viria a ser constituído arguido no âmbito deste processo, após ter sido ouvido no Departamento de Investigação e Ação Penal Regional do Porto.
O primeiro está acusado de quatro crimes de corrupção passiva e cinco de prevaricação e o segundo responde por dois crimes de corrupção passiva, um de tráfico de influência e outro de violação das regras urbanísticas.
Já o empresário Francisco Pessegueiro foi acusado de oito crimes de corrupção ativa, um de tráfico de influência, cinco de prevaricação e dois de violação das regras urbanísticas.
Os empresários João Rodrigues e Paulo Malafaia foram acusados de oito crimes de corrupção ativa, um de tráfico de influência, cinco de prevaricação e dois de violação das regras urbanísticas.
Foram ainda acusados mais três arguidos, que à época desempenhavam funções de chefe de divisão na autarquia, e cinco empresas de diversos crimes económico-financeiros.
Defesa de Pessegueiro compara corrupção a pagamento de "taxa de urgência"
A defesa do empresário Francisco Pessegueiro, arguido no processo Vórtex, procurou desvalorizar os atos praticados pelo seu cliente, que podem consubstanciar o crime de corrupção, alegando que o mesmo limitou-se a pagar “uma taxa de urgência”.
Nas disposições introdutórias, o advogado que defende o empresário disse que a generalidade dos factos relacionados com o seu cliente descritos na acusação do Ministério Público (MP) “estão corretos”, apesar de algumas incorreções.
Disse ainda que Francisco Pessegueiro, que está acusado dos crimes de corrupção ativa, tráfico de influência, prevaricação e violação das regras urbanísticas, pretende provar que nunca foi sua intenção determinar qualquer agente político ou funcionário administrativo à prática de atos contrários à Lei.
“Procurou, isso sim, que fosse conferida celeridade àqueles que eram os seus projetos. Não uma , não uma celeridade extraordinária, mas a celeridade que resultaria de uma boa prática administrativa e que asseguraria a viabilidade económico-financeira dos seus projetos”, esclareceu o causídico, acrescentando que o seu cliente se dispôs a “garantir o pagamento de uma taxa de urgência”.
O advogado disse ainda que “não corresponde à verdade os montantes que o MP diz terem sido pagos” pelo empresário, adiantando que, não obstante esta disponibilidade para pagamento, o arguido “não logrou obter benefícios com a sua atuação” e, ao longo da condução dos seus projetos, não procedeu à violação de quaisquer regras urbanísticas.
Na mesma ocasião, o advogado do empresário Paulo Malafaia, coarguido no processo, sublinhou que o seu cliente "teve a sua vida profissional e pessoal escrutinada pela Polícia Judiciária, pelo MP e pelos juízes de instrução criminal durante demasiado tempo", adiantando que as escutas “consubstanciaram mera devassa da vida privada”.
“Causa aliás perplexidade que, apesar da devassa continuada, o arguido não tenha ao longo dos anos sido travado, demovido, impedido de prosseguir a atividade criminosa que alegadamente se encontrava sob investigação”, realçou.
O advogado de Malafaia, que se encontra detido à ordem do processo Babel, considerou ainda irrelevantes e inconsequentes as escutas, alegando que “às conversas porventura estúpidas, inconsequentes e irresponsáveis, não se seguiram quaisquer atos de execução de quaisquer dos crimes que lhe são imputados”.