As imagens de centenas de militares e centenas de carros de combate a atravessar as ruas de Varsóvia, na Polónia, multiplicaram-se nas redes sociais, numa altura em que a tensão com a Bielorrússia levou a que o governo polaco ordenasse o reforço da fronteira com a presença de dez mil soldados. No entanto, o motivo desta presença musculada é outra: celebrar o dia do Exército no aniversário de uma vitória militar sobre a União Soviética.
Streets of Warsaw, Poland in preparation for the August 15th military parade. In my humble opinion, the parade route should include Crimea, Mariupol, Donetsk, and Luhansk. pic.twitter.com/ksmDzqCI3v
— Igor Sushko (@igorsushko) August 13, 2023
"Depois de três anos, o maior desfile do Exército polaco regressa no dia 15 de agosto às 14:00 na Wisłostrada de Varsóvia. Apresentaremos 200 unidades militares e 92 aeronaves acompanhadas DE dois mil soldados! Soldados de todos os tipos das Forças Armadas polacas vão apresentar os mais modernos equipamentos de produção polaca, coreana e americana adquiridos nos últimos anos”, escreveu o Ministério da Defesa polaco, numa publicação nas redes sociais.
O dia da celebração das Forças Armadas polaco acontece todos os anos no aniversário da Batalha de Varsóvia, quando a Polónia derrotou decisivamente o exército soviético em 1920. Ainda assim, esta parada é interpretada pelos especialistas como uma demonstração de força do governo polaco, que pretende enviar uma mensagem de segurança para “consumo interno”, uma vez que se aproximam as eleições legislativas no país, marcadas para 15 de outubro.
“A Polónia é hoje um país capaz do ponto de vista militar, mas não se consegue perceber as decisões polacas com base na presença do grupo Wagner na Bielorrússia. Eu olharia para o facto de a Polónia vir a ter eleições em outubro, uma vez que o partido no poder tem hipóteses de voltar a chegar a uma maioria absoluta”, diz o comentador da CNN Portugal Azeredo Lopes.
Ainda assim, Varsóvia parece determinada em enviar uma mensagem a Vladimir Putin de que não se deixará intimidar. Nos últimos dois anos, o número de incidentes entre a Polónia e a Bielorrússia têm-se multiplicado. Ainda antes da invasão russa da Ucrânia, a Polónia acusou Minsk de causar artificialmente uma crise migratória na fronteira. Recentemente, a situação tornou-se um pouco mais complexa, com a presença de mercenários do grupo Wagner na Bielorrússia, após uma alegada tentativa de golpe de Estado na Rússia.
Esta segunda-feira, a polícia polaca deteve dois homens de nacionalidade russa que distribuíam material de recrutamento do grupo Wagner nas cidades polacas de Cracóvia e Varsóvia. Os dois cidadãos são acusados de espionagem e estão a aguardar julgamento.
“É claro que tudo isto tem simbolismo. A Polónia adquiriu muito material militar. Só carros de combate foram mil. A Polónia quer demonstrar força internamente e externamente. Mas eu não daria demasiado relevo. Parece-me uma mensagem interna para eleições e, em simultâneo, uma oportunidade para mostrar músculo para fora”, reforça o major-general Agostinho Costa.
No início de agosto, o Ministério da Defesa polaco voltou a acusar o governo de Lukashenko de provocação militar. Em causa está um exercício militar bielorrusso na região de Bialowieza, onde dois helicópteros Mi-24 e Mi-8 voaram a baixa altitude em espaço aéreo polaco, tornando a sua deteção em radares bastante difícil. Minsk rejeita as acusações e garante que estas têm como único propósito a justificação do aumento do número de tropas na fronteira.
Durante o impasse, o primeiro-ministro polaco, Mateusz Morawiecki, garantiu que perto de uma centena de mercenários russos estão a ser destacados para a região do estreito corredor de Suwalki - que liga a Polónia à Lituânia. Esta região é particularmente sensível para a NATO porque os 100 quilómetros deste corredor esmagado entre o enclave russo de Kaliningrado e a Bielorrússia representam a única ligação terrestre que a NATO tem aos países Bálticos, membros da Aliança.
“O objetivo é colocar agentes agitadores no outro lado. E nesta situação a Polónia nem é o caso mais vulnerável. Os países Bálticos são países que podem vir a ser potenciais vítimas, têm elevadas populações russas e podem sempre ser vítimas dos mesmos pressupostos que levaram à invasão da Ucrânia”, considera Isidro de Morais Pereira.
Vladimir Putin acusou a Polónia de ter ambições territoriais na Bielorrússia e garantiu que qualquer ataque contra o território deste país será considerado uma declaração de guerra. No passado, a Rússia acusou Varsóvia de ter intenções semelhantes para com o território ocidental da Ucrânia.
“Há uma estratégia concertada para desestabilizar o outro lado e isto é apenas a Rússia a colocar mais um desafio à Polónia. O objetivo é afetar o moral da população”, conclui o major-general Isidro de Morais Pereira.