Em Espanha, cozinhar uma tortilha de batata é 24% mais caro - TVI

Em Espanha, cozinhar uma tortilha de batata é 24% mais caro

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  • Joana Nabais Ferreira
  • 18 mar 2023, 10:00
tortilha

Fazer um bolo caseiro está 31% mais caro e o custo de fritar batatas aumentou 26%. O governo espanhol desceu o IVA de bens alimentares, mas o impacto foi limitado

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Em Espanha, não pode faltar a tortilha de batata em cima da mesa. Mas cozinhá-la em casa, com uma receita para quatro pessoas, passou a custar mais 24,3%, comparativamente a janeiro de 2022. A fatura é, agora, de 4,46 euros, em vez de 3,59 euros. Alguns dos seus ingredientes chave, nomeadamente ovos e azeite, aumentaram na ordem dos 30%. Mas não só. Fazer um bolo caseiro está 31% mais caro e fritar batatas 26%. E encomendar uma pizza ou beber uma cerveja também encareceu.

Em 2022, a inflação em Espanha foi de 8,4%, o nível mais elevado das três últimas décadas, e 2023 começou com uma baixa nos preços dos bens alimentares essenciais. A redução do IVA aprovada pelo governo espanhol em dezembro fez-se notar — ainda que ligeiramente — em janeiro, sobretudo nos produtos frescos e de primeira necessidade, como o pão, o leite, os ovos e as batatas (nestes produtos, o IVA baixou de 4% para 0%). Ainda assim, comparando com os preços praticados no início do ano passado, não há dúvidas que encher o carrinho das compras do supermercado passa uma fatura mais cara.

“A redução do IVA não teve um impacto muito significativo para baixar os preços dos alimentos. Em primeiro lugar, porque a redução (de 4% para 0% e de 10% para 5%) não representa, na maioria dos casos, mais do que uns cêntimos de poupança numa cesta de compras normal. Além disso, o IVA das carnes e pescado, os produtos com os preços talvez mais elevados, não se alterou“, comenta Juan Carlos Martínez Lázaro, professor de economia da IE University, em Espanha, em declarações ao ECO.

Por outro lado, diz ainda o economista, as reduções do IVA não são, muitas vezes, repercutidas no preço final que paga o consumidor. “O governo reduz ou elimina o IVA, mas os retalhistas dificilmente alteram os seus preços, ou fazem-no durante os primeiros meses, mas depois restabelecem os seus preços, mantendo o montante da redução do IVA e aumentando, assim, as suas margens“, diz.

Resumindo, o economista não é partidário deste tipo de medidas que diminuem o IVA. “O Governo recolhe menos, as margens dos comerciantes costumam aumentar, os efeitos para as famílias são mínimos e o impacto sobre o IPC [Índice de Preços no Consumidor] é muito pequeno”, sustenta.

Uma opinião partilhada pelo economista e professor na Universidade de Barcelona, Gonzalo Bernardos, que considera que a redução do IVA não faz mais nada além de melhorar as margens dos na cadeia de valor dos alimentos. “É algo que está mais do que estudado, documentado, analisado e explicado”, reforça.

Juan Luis Jiménez, professor de Economia na Universidade de Las Palmas de Gran Canaria, levanta ainda outra questão. “Para além do (claro) risco de que a redução não se repercuta sequer nos preços e seja convertida em lucros para os produtores, mais um detalhe: as taxas super-reduzidas beneficiam em maior medida rendimentos mais elevados“, escreveu numa publicação no Twitter.

Nesta linha, vários economistas e organizações têm insistido na importância de focalizar as iniciativas de ajuda contra os efeitos da inflação nos grupos sociais mais desfavorecidos. Segundo os cálculos da Fundación de Estudios de Economía Aplicada (Fedea), a redução do IVA nos produtos alimentares originará, em média, uma poupança durante a primeira metade do ano de “menos de 40 euros” por família. “No total, o custo fiscal será de cerca de 700 milhões de euros, dos quais apenas 31% serão transferidos sob forma de poupança para “os dois quintis de rendimento mais baixos”, explica a Fedea ao El Economista.

Assim, acrescenta a fundação, “se substituíssemos a redução do IVA por ajudas diretas concentradas nos 40% das famílias com os rendimentos mais baixos, custo da medida um diminuiria para um terço do atual ou, em alternativa, poderíamos multiplicar por três a ajuda média por família beneficiária com o mesmo custo agregado.”

A Mercadona apresentou esta terça-feira as suas contas anuais. Globalmente, os lucros líquidos da companhia espanhola subiram 5%, para 718 milhões. O presidente Juan Roig reconheceu que a cadeia teve de aumentar “muito” os preços, defendendo que não havia outra opção. “Temos de garantir a sustentabilidade de toda a cadeia de produção. Se não o tivéssemos feito, teria sido um desastre“, afirmou durante a apresentação de resultados. “Podemos fazer coisas para que os preços baixem, mas, se o fizermos, teremos de compensar com outros produtos, ou reduzir a qualidade”. E garante: “Artificialmente não vamos baixar os preços”, recordando que no ano passado a Mercadona mais 12% aos fornecedores e subiu os preços em torno de 10% aos consumidores. “Atuámos com contenção.”

Juan Roig garante que “os últimos meses têm sido muito maus em termos de inflação. Vamos lutar até à morte para baixar os preços”, assegura, mas atira: “É uma ilusão fixar os preços. É o mesmo que dizer que a água não molha.”

Em Portugal, mercado onde a empresa já tem 39 lojas, a Mercadona fechou o ano passado com um volume de vendas de 737 milhões de euros, uma subida de quase 78% face aos 415 milhões de euros registados no mercado nacional em 202.

Preço do açúcar dispara mais de 50%

Açúcar, manteiga, molhos e condimentos são os três produtos alimentares que registam a maior subida de preços nos supermercados espanhóis, comparativamente a janeiro de 2022. De acordo com os dados publicados pelo elDiario.es (acesso livre, conteúdo em espanhol), com base nos dados do Instituto Nacional de Estadística (INE) espanhol, estes produtos registaram um aumento de 52,1%, 38,2% e 33,9%, respetivamente.

Segue-se o leite (33%), óleo (32,1%), azeite (30,5%), produtos de padaria (28,2%), farinhas e outros cereais (28,1%), outros produtos lácteos (27,6%) e ovos (27,2%).

Ainda que esta escalada de preços tenha começado com o aumento dos preços da energia, como luz e gás, o que mais encareceu no último ano foi, contudo, a alimentação. Ir ao supermercado em Espanha está 15,4% mais caro do que há um ano.

“A energia (gasóleo, gás e eletricidade), os fertilizantes (devido à guerra na Ucrânia, sendo a Rússia um grande produtor de fertilizantes), bem como os episódios de seca, são os principais responsáveis pelo forte aumento dos preços dos alimentos. Alguns custos, tais como os custos energéticos, já caíram, mas ainda se encontram a níveis mais elevados do que antes do início da guerra. Este ano podíamos assistir a uma estabilização, e mesmo a um ajustamento dos preços de alguns alimentos, mas, de um modo geral, estes permanecerão em níveis elevados“, prevê Juan Carlos Martínez Lázaro.

O aumento dos preços traduz-se em coisas simples tão simples como fazer um bolo, algo que está, agora, 31% mais caro, tendo passado a custar 3,58 euros. Também fritar batatas encareceu em 25,7%, de 2,63 euros para 3,31 euros.

Já cozinhar uma tortilha de batatas para quatro pessoas passou a ser 24,3% mais caro (4,46 euros, em vez de 3,59 euros) e tomar um pequeno-almoço doce em casa (com café com leite, sumo de laranja e algum produto de pastelaria) encareceu 21,3%, de 96 cêntimos para 1,16 euros. Cozinhar lentilhas com chouriço para duas pessoas passou a custar 2,33 euros, um aumento de 14%.

Mas não só. Encomendar comida para o domicílio também encareceu. Pedir duas pizzas para casa, por exemplo, custa agora quase 23 euros, em vez dos 20,60 euros, em janeiro do ano passado (um aumento de quase 10%). E sair para tomar três cervejas passou a custar quase seis euros (mais 7,1%).

Apesar do aumento recorde dos preços dos alimentos, Espanha fechou o ano passado com a taxa mais baixa da União Europeia, depois de no primeiro semestre de 2022 ter tido dos valores mais elevados e de em julho ter registado a inflação mais alta no país desde 1984 (10,77%).

Para tentar responder à escalada dos preços, entrou em vigor no início do ano um conjunto de medidas que incluem a suspensão do IVA de alguns alimentos e produtos considerados básicos, bem como a atribuição de um cheque de 200 euros às famílias mais vulneráveis, com um rendimento inferior a 27.000 euros por ano. A medida prevê abranger mais de 4,2 milhões de famílias.

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