O Ministério da Educação está a preparar um despacho que pretende alargar a possibilidade de docência a licenciados pós-Bolonha. O objetivo, diz o ministro da Educação, é resolver o “problema de falta de professores” - sobretudo em Lisboa e Vale do Tejo e Algarve e na disciplina de Informática -, sendo esta apenas “uma medida num conjunto de várias medidas”. Descartando que se trata de um “remendo”, João Costa atira, em entrevista à rádio Observador, que “o pior seria termos alunos sem aulas”.
Contactado pela CNN Portugal, o secretário-geral da Fenprof mostra-se reticente quanto a esta nova medida, sobretudo pela falta de clareza e pelo risco de desqualificação da profissão. “Esperamos que seja possível termos um esclarecimento maior e se vai sair um despacho que seja conhecido antes da publicação, para que se possa avaliar se há um desqualificar [da profissão]. Se for é muito mau, é absolutamente reprovável”.
Mário Nogueira diz estar preocupado com a possibilidade de o Ministério da Educação estar a tentar ou a pretender resolver o problema da falta de professores "não através de criação de atratividade de jovens devidamente qualificados para a profissão, e passe a abrir [a docência] para qualquer pessoa, desqualificando assim a profissão e a formação, no sentido de poderem resolver um problema que não querem resolver, e que se resolveria atraindo jovens”.
Afinal, quem vai poder dar aulas?
Licenciados pré e pós-Bolonha (ou doutorados com conhecimento científico adequado), mas apenas enquanto professores com habilitação própria, com contratação direta pela escola, fora do concurso nacional. Para a carreira de docência, deixa claro o ministro, continua a ser necessário o mestrado em Ensino.
“Estamos apenas a falar de habilitação própria e a habilitação própria não confere acesso à carreira de professor, ou seja, alguém que queira integrar a carreira de professor terá de fazer a carreira pedagógica”, esclarece João Costa.
O ministro da Educação explica ainda que o Executivo está a preparar um “decreto-lei de execução orçamental” que passe a incluir também licenciados pós-Bolonha - com três anos de licenciatura - para a contratação em escolas (para situações de substituição e contratados diretamente pelas escolas, por exemplo), mas cada licenciatura será avaliada, assim como os créditos e conhecimento científico dos licenciados. “Olhando para o facto de, no pós-Bolonha, termos um leque muito mais amplo de licenciaturas, em vez de fazermos uma lista em função da designação dos cursos, o que vamos ver é, em número de créditos nas diferentes áreas científicas, as que têm créditos que habilitem ou que conferem uma formação científica sólida para se poder lecionar”, continua o ministro.
E dá um exemplo na entrevista ao Observador: “Este despacho não se vai circunscrever a licenciados, ou seja, eu posso ter alguém que é doutorado e que ao longo do seu percurso formativo, desde a licenciatura ao doutoramento, frequentou disciplinas nas diferentes áreas científicas. Alguém que tenha formação sólida científica em matemática poderá ser docente de matemática, mesmo que não tenha a formação de ensino em matemática”.
Sobre este ponto, Mário Nogueira reconhece que, se for esse o caminho a seguir, a nova medida do Governo poderá ser positiva, embora não resolva o problema-base da profissão: a fixação de professores. “Se o Ministério da Educação considerar cursos pós-Bolonha cujos créditos sejam semelhantes ao de pré-Bolonha [que podem ser contratados enquanto professores com habilitação própria], não haverá problema. Se for esse o caminho, tudo bem, mas tememos que possa nao ser. Tememos que o Ministério da Educação, perante a dificuldade de ter professores, em vez de atrair os que existem, aceite desqualificar a profissão através da formação abaixo do mínimo exigido”, atira o secretário-geral da Fenprof.
Quando questionado se esta nova medida poderá trazer questões quanto a alguns professores serem vistos como de segunda categoria, o ministro rejeita essa associação. “Não falamos de professores de segunda, mas sim de necessidades permanentes no sistema que devem ser preenchidas por professores profissionalizados e necessidades temporárias que, por vezes, temos de recorrer a outras pessoas, como já era e como continuará a ser”, referindo-se aos professores com habilitação própria (licenciados pré-Bolonha) que podem ser contratados pelas escolas quando as vagas não são preenchidas em concurso.
Apesar de reconhecer que esta medida pretende resolver questões pontuais, o ministro defende a importância da profissionalização, tendo anunciado ainda um trabalho conjunto a com universidade “para que estes [licenciados pós-Bolonha] que são contratados por esta via [para substituições em escolas, por exemplo] possam fazer a sua profissionalização”.