"Depois de 45 minutos no poço, as botas pareciam uma âncora". A incrível história do alentejano Luís que sobreviveu para a contar - TVI

"Depois de 45 minutos no poço, as botas pareciam uma âncora". A incrível história do alentejano Luís que sobreviveu para a contar

  • FG, editada por Lina Santos
  • 17 mai 2023, 18:40
Luis Abranja

“A água parece que puxa a gente para o fundo", contou o sobrevivente à TVI.

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Foram 45 minutos que Luís Abranja nunca esquecerá. O alentejano caiu de uma altura de oito metros dentro de um poço, quase ficou sem forças, mas a ajuda chegou e foi possível retirá-lo. 

“Depois de estar 45 minutos no poço, já estava a entrar em hipotermia, as botas que tinha calçado pareciam uma âncora a puxar-me para baixo e comecei a perder a força", conta Luís Abranja ao telefone com a TVI. "Foi aí que senti que ia morrer”, explica o sobrevivente. Acredita que foi a vontade de viver que o salvou.

A (quase) tragédia não se fez anunciar. Na manhã de 9 de maio, Luís Abranja estava com um amigo de longa data a fazer obras num terreno em Alcáçovas, Viana do Alentejo, e avistou uma placa, que julgou ser maciça, a cobrir o poço. Apenas descobriu o quão frágil a tal placa era quando a pisou. Era de esferovite e caiu, levando-o atrás, para dentro do poço. Seria também a sua tábua de salvação. 

“Tentava bater as pernas para ficar quente mas cansava-me, a água do poço parece que puxa a gente para o fundo", recorda. Sem surpresa, diz que este foi um dos piores dias dos seus 42 anos de vida. 

“O tempo de espera aumenta e o desespero começa a dominar. Nunca mais ouvia as sirenes dos bombeiros, estava num desespero”, conta Luís Abranja. "Se não me tiraram daqui vou morrer", pensou. "Comecei a cansar-me, a ficar cheio de frio".

As botas puxavam-no para baixo e Luís pensava em como se livrar delas. "Tentei descalçar as botas e não consegui porque não sentia os indicadores. A hipotermia começou a tirar-me a sensibilidade das mãos”, acrescenta. 

"O meu amigo foi um grande apoio" desabafa Luís. Foi ele que lhe atirou um corda para que Luís se pudesse apoiar. Luís enrolou-a duas vezes sobre o seu tronco, mas esse apoio serviu-lhe de conforto durante pouco tempo.  Já não eram só as botas que o puxavam, era a roupa também. "Meia hora depois uma pessoa fica aflita”, conta à TVI.

Nesta meia hora de aflição o que lhe valeu foi o amigo -  "a ajuda está a chegar, mantém-te calmo", gritava ele para dentro do poço. Diz que foram as palavras e a sua companhia que lhe deram força  para se manter otimista. 

O peso que Luís carrega desde esse dia é evidente nas suas palavras. “É um momento difícil em que se vê a morte à nossa frente. Estava com medo, não ouvia ninguém a chegar, isto afeta a nossa cabeça”, diz.

Se hoje está aqui para contar a sua história é porque, no meio da aflição, houve um momento de grande alívio: “As pessoas estavam lá perto, comecei a gritar e as pessoas aproximavam-se. Comecei a chorar".  

A ajuda chega, por fim

Luís teve que esperar por ajuda, mas, por fim, ela veio - a GNR e os vizinhos. 

Como é que se ia agarrar à corda? "Alguém tem a ideia de arranjar um ferro com um formato de S”, inseriram o objeto na corda e lançaram para o poço. Nesse momento, Luís depara-se com um dilema - ou saltava para a corda que tinha o gancho e o prendia às calças, com risco de não o conseguir fazer devido à reduzida sensibilidade nas mãos ou continuava na corda que tinha em volta do corpo que o manteve seguro nos últimos 40 minutos, mas sem expectativas que fosse salvo.

A decisão é tomada "quando eu largo a corda que me estava a dar segurança, para apanhar a outra, num segundo, prendo no cinto, na atrás nas calças, o gancho.”

O resgate

Uma vez feita a troca de cordas, a GNR e os vizinhos formaram um cordão humano e, devagar, puxaram-no para a superfície. Luís por muita vontade que tivesse “ já não tinha forma para ajudar, estava de tal maneira congelado que se estivesse mais 20 minutos não sei...”, desabafa.

O encaixe da corda nas calças foi um momento essencial do resgate. Luís estava sem forças, e quando finalmente chega perto do topo do poço, é puxado pelas mãos, algo que já não se lembrava devido à fraqueza, e acaba por cair por cima de um agente da GNR que o puxava. Luis agradece a todos os que ajudaram, e em especial ao agente da GNR. 

Foi levado ao hospital e ao seu encontro foi a mulher, preocupada, que já levava consigo roupa seca para o aconchegar. Luís teve alta no mesmo dia.

A família só descobriu o que tinha acontecido quando Luís já estava bem, o que não diminuiu a sua preocupação. Mas aquela que ficou mais emocionada e atormentada com o acidente foi a sua filha mais nova, de sete anos. "Estavam todos preocupados, mas ela ficou muito transtornada", diz Luís.

No final das contas, acredita que foi um sortudo. O facto de não ter batido em lado nenhum é um milagre. Mede 1,80 metros e o poço tem 2 metros de diâmetro. 

Partilhando a sua história, Luís Abranja deixa o alerta. "Se a pessoa souber nadar, e ficar com calma, o poço tem sempre algo onde se pode agarrar. Tem que respirar fundo, gritar e esperar pela ajuda. Temos que entender que lá dentro não dá para fazer nada, só esperar e rezar. Tudo o que fizermos só complica, porque nos cansa.”

Um dia depois do acidente, voltou ao local que pensara ser o seu jazigo para o arranjar e garantir que ninguém volta a passar pelo mesmo. 

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