Participam em desfiles militares, aprendem a lançar granadas e a manusear armas e estudam o "Renascimento do neo-nazismo" na Ucrânia. Parece a descrição de um curso destinado a militares russos, mas é mesmo o dia a dia das crianças russas no ensino escolar e pré-escolar.
De acordo com a CNN Internacional, há crianças com sete ou oito anos a receber treino militar nas escolas. Em Belgorod, por exemplo, as crianças já atribuem alcunhas para se identificarem em chamadas, tal como acontece no campo de batalha, e participam em exercícios que incluem o manuseamento de armas automáticas e corridas de obstáculos. O governador de Belgorod, Vyacheslav Gladkov, sugeriu a realização destes exercícios de forma regular com crianças em idade escolar e pré-escolar.
Em Krasnodar, dezenas de crianças com a mesma idade participaram em maio num desfile militar, envergando uniformes da Armada e da Marinha. Algumas empunhavam imitações de armas automáticas.
Até nas creches as crianças brincam com carros estampados com a letra 'Z', o símbolo de apoio à "operação militar especial" na Ucrânia, utilizado pela propaganda russa.
"Militarização das escolas": dos livros para as armas
Tudo isto faz parte da crescente "militarização das escolas russas", como descreve a CNN Internacional, que fala num "investimento enorme" por parte do Ministério da Educação para incutir nos mais jovens os "valores militares e patrióticos". Para tal, foram criados clubes "militares-patrióticos" nas escolas e universidades russas, onde, de acordo com o ministro da Educação, milhares de pessoas trabalham para incutir nos alunos esses mesmos valores.
Esta campanha inclui uma revisão radical do currículo escolar, introduzindo aulas obrigatórias, como a disciplina "Fundamentos da Segurança e Defesa da Rússia". Os livros de história, por exemplo, foram atualizados para acentuar os triunfos militares da Federação Russa. O livro sobre a "História da Rússia" tem agora a ponte da Crimeia ilustrada na capa e inclui um novo capítulo dedicado à história recente da Ucrânia. Existem tópicos intitulados “Falsificação da História”, “Renascimento do neo-Nazismo” e “Rússia é um país de heróis”.
A CNN Internacional escreve que o novo livro parece ter sido desenhado para despertar um sentimento de ressentimento histórico nas crianças russas, como se o país estivesse a enfrentar uma batalha existencial pela sobrevivência da nação.
No âmbito deste novo programa curricular o ministro da Educação anunciou ainda outras iniciativas, como excursões a unidades militares, jogos desportivos militares e encontros com personalidades e veteranos militares. Os estudantes do ensino secundário estão a aprender a manusear armas com munições reais, "sob a orientação de oficiais de unidades militares experientes".
Esta revisão do currículo escolar tem como objetivo incutir nos alunos “uma compreensão e aceitação da estética dos uniformes militares, dos rituais militares e tradições de combate”, pode ler-se num documento do Ministério da Educação, disponibilizado pelos media independentes russos.
Putin e a história do avô que pediu ao filho para "vencer a escória" na II Guerra Mundial
O próprio presidente russo está a liderar a campanha pelo patriotismo nas escolas russas. A CNN Internacional conta um episódio recente, ocorrido este mês, quando Putin recebeu um grupo de crianças no Kremlin e lhes contou uma história pessoal, sobre uma carta que o seu avô terá enviado ao seu pai, que então combatia os nazis na Segunda Guerra Mundial. "Vence a escória", terá dito o seu avô, de acordo com Putin.
“Percebi então porque vencemos a Grande Guerra Patriótica. As pessoas com essa atitude simplesmente não podem ser derrotadas. Éramos absolutamente invencíveis, tal como o somos agora”, continuou.
Alguns professores não pareceram muito entusiasmados com esta revisão do currículo escolar, conta a CNN Internacional, que diz mesmo que alguns acabaram por ser demitidos. Em relação aos pais, alguns também manifestaram a sua oposição às alterações curriculares, mas, segundo a mesma fonte, a maioria parece apoiar esta campanha "militar-patriótica". Pelo menos, a avaliar pelas sondagens da opinião pública. Segundo a agência de notícias estatal RIA Novosti, 79% dos pais apoiam a exibição de vídeos sobre a guerra aos seus filhos.