As propriedades de luxo de Lyudmila, ex-mulher de Putin, que escaparam às sanções - TVI

As propriedades de luxo de Lyudmila, ex-mulher de Putin, que escaparam às sanções

  • CNN Portugal
  • MJC
  • 3 fev 2023, 16:53
Lyudmila Putina (hoje Ocheretnaya) com Putin, em 2012 (AP)

Investigação do Politico revela as casas que a ex-mulher de Putin e o seu atual marido foram adquirindo na Europa

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Com casas luxuosas em Moscovo, Marbella, Davos e Biarritz, a ex-mulher de Putin, Lyudmila Ocheretnaya, e o seu atual marido, Artur Ocheretny, têm motivos para querer ficar longe da alçada das autoridades europeias. A jornalista Leonie Kijewski, do Politico, está há semanas a investigar as propriedades de luxo que Lyudmila Ocheretnaya acumulou desde o fim do casamento com o presidente russo, há mais de uma década. E conseguiu mesmo visitar um dos apartamentos, em Marbella, que foi colocado à venda.

"Não é difícil entender por que os Ocheretny queriam vender o apartamento", explica a jornalista. "O casal não está na lista de sanções da União Europeia, mas isso pode mudar a qualquer momento; afinal, Londres já colocou Ocheretnaya e os seus filhos adultos sob sanções. Se Bruxelas seguisse o exemplo, isso poderia colocar o apartamento e o resto do seu portefólio europeu em risco."

A jornalista "nunca" chegou a falar com Ocheretnaya ou com o seu marido enquanto cruzava o continente no rasto dos seus investimentos imobiliários. "Mas o que descobri durante a minha investigação levantou-me questões sobre o que exatamente é necessário para colocar alguém sob sanções", afirma. 

Lyudmila e Vladimir foram casados 30 anos

Lyudmila foi casada com Vladimir Putin durante 30 anos. Casaram-se em 1983, quando Putin era um oficial de baixo escalão da KGB em Leninegrado (atual São Petersburgo) e Lyudmila era comissária de bordo da Aeroflot. Ela acompanhou-o até Dresden, na Alemanha Oriental, onde ele foi colocado como agente. Após a queda do Muro de Berlim, o casal e as duas filhas voltaram para São Petersburgo, onde Putin iniciou a carreira política como funcionário do gabinete do presidente da câmara.

Como esposa de político, Ocheretnaya - então chamada Lyudmila Putina - manteve um perfil relativamente discreto. Seguiu a sua própria carreira até que Putin foi eleito primeiro-ministro e depois ajudou a criar e a administrar um centro dedicado à promoção da língua russa. Putina comparecia a jantares oficiais ocasionais e desempenhava outras funções de primeira-dama, como abrir as cerimónias da árvore de Natal no Kremlin, mas geralmente ficava longe dos holofotes.

"É difícil imaginar, mas na altura eles pareciam bastante provincianos, bastante inseguros sobre como se deveriam comportar", disse Nina Khrushcheva, professora de relações internacionais na The New School em Nova Iorque e bisneta do ex-líder soviético Nikita Khrushchev. “Lembro-me que o modo de vestir dela era um pouco estranho, embora ela tentasse contratar os melhores estilistas russos”, contou.

Lyudmila com Putin, em 2008 (AP)

À medida que Putin consolidava o poder, começaram a surgir relatos sobre o aparecimento de outras mulheres na sua vida, incluindo a ginasta vencedora de uma medalha de ouro olímpica Alina Kabaeva. Ocheretnaya tornou-se “quase invisível”, disse Khrushcheva. “Gradualmente, ela começou a sair de cena e ele parecia cada vez mais sozinho.” Então, em 2013, o casal anunciou que o casamento tinha acabado por “decisão comum”.

O casamento pode ter acabado, mas a relação financeira continua, afirma agora a jornalista Leonie Kijewski. 

Quando Putin foi questionado pela agência de notícias estatal, em 2014, se planeava casar-se novamente, o presidente russo respondeu com uma piada: “Preciso de casar a minha ex-mulher Lyudmila primeiro e depois pensarei em mim próprio.”

Propriedades de luxo e dúvidas sobre a origem do dinheiro

Desde o divórcio, Ocheretnaya levou uma vida bastante privada; até mesmo o casamento em 2015 com Artur Ocheretny - um aficionado do triatlo Ironman, 20 anos mais novo do que ela - foi mantido em segredo até que os jornalistas descobriram que ela tinha mudado de apelido.

Como parte dos seus esforços para promover a língua russa, Ocheretnaya criou uma fundação chamada Centro de Desenvolvimento da Língua Russa, posteriormente chamada Centro de Desenvolvimento de Comunicações Interpessoais. Em 2016, os meios de comunicação russos revelaram que ela tinha casado com o presidente do centro, Artur Ocheretny.

Durante o governo de Putin, a fundação adquiriu um antigo prédio estatal no centro de Moscovo que tinha pertencido ao avô do escritor russo Leo Tolstoi. Supostamente a inspiração para uma mansão descrita no romance “Guerra e Paz”, a Casa Volkonsky foi remodelada e ampliada pelo departamento de propriedades do governo, que adicionou dois novos andares ao prédio histórico, de acordo com uma denúncia do dissidente russo Alexei Navalny. Só depois a propriedade foi doada à fundação de Ocheretnaya. Localizado a cinco minutos a pé do Kremlin, o prédio agora gera milhões de dólares em rendas - pagos, segundo uma investigação da Reuters, a uma empresa registada com o nome de solteira de Lyudmila.

O casamento dos Ocheretny aconteceu num período em que o portefólio imobiliário do casal estava a expandir-se rapidamente. O apartamento em Marbella que a jornalista visitou é um dos dois na cidade que Ocheretny adquiriu pouco antes do casamento. Ocheretny comprou o primeiro em 2011 por cerca de 800 mil euros e o segundo em 2014 por mais de um milhão. Os apartamentos, localizados num condomínio de luxo, continuam a ser sua propriedade, segundo os documentos consultados pelo Politico. 

A jornalista tentou perceber se Lyudmila Ocheretnaya pediu o Visto Gold a que tinha direito por investir mais de 500 mil euros no país, mas o Ministério dos Negócios Estrangeiros recusou-se a dar essa informação.

Em 2015, na mesma época em que se casou com Lyudmila, Artur Ocheretny comprou um apartamento de luxo em Davos, na Suíça, sede do Fórum Económico Mundial. Anunciado no momento da compra por um valor de cerca de três milhões de euros, o apartamento de Ocheretny está ligado por túneis subterrâneos ao AlpenGold Hotel, dando aos seus ocupantes acesso à piscina e outras instalações do hotel.

"Só o fato de Ocheretny ter conseguido comprar um apartamento na Suíça é incomum", afirma o Politico. As leis suíças restringem os estrangeiros de comprar casa, exceto num conjunto limitado de circunstâncias, como a compra de uma nova construção para casa de férias, como Ocheretny parece ter feito, ou se puderem demonstrar que trabalham e moram na Suíça.

O problema na Suíça é que a lei confia em grande parte nas entidades privadas para garantirem que as regras são cumpridas, de acordo com Maíra Martini, especialista em lavagem de dinheiro do órgão regulador de corrupção Transparência Internacional. Martini considera que é uma “grande bandeira vermelha” se o salário oficial de uma pessoa não corresponder ao dinheiro que ela tem nas suas contas. Isso poderia ter causado desconfiança no caso de Ocheretny, já que não está claro como ele poderia pagar um apartamento e várias casas com os negócios que declara administrar.

Uma das adições mais notáveis ao portefólio de Ocheretny é uma excêntrica vila Art Déco, apelidada de Villa Souzanna, a cerca de seis quilómetros da cidade turística de Biarritz, na costa basca do sudoeste da França - uma região em que Ocheretnaya e Putin costumavam passar férias antes de se tornarem conhecidos. A praia mais próxima fica a poucos passos de distância. A villa foi comprada por Ocheretny em 2013 e está em obras há sete anos.

A Villa Souzanna não é a única propriedade da cidade ligada ao presidente russo. Em 2012, Kirill Shamalov, o então marido de Katerina Tikhonova - a filha mais nova de Putin e Lyudmila - comprou uma casa de 3,5 milhões de euros com vista para o mar. A compra foi feita através da Sci Atlantic, imobiliária da qual Shamalov é diretor. A casa ainda pertence à empresa, segundo registos obtidos pelo Politico, mas foi confiscada pelas autoridades francesas depois de a UE ter sancionado Shamalov em abril. Shamalov e Tikhonova divorciaram-se em 2018.

Desde a invasão da Rússia à Ucrânia, em fevereiro de 2022, os Estados Unidos, a União Europeia e o Reino Unido sancionaram centenas de pessoas consideradas responsáveis pela guerra ou próximas a Vladimir Putin, por espalhar propaganda pró-guerra ou por fornecer uma fonte de receita para o Kremlin. A UE impôs sanções a cerca de 1.400 pessoas e entidades, os EUA quase 2.500 e o Reino Unido cerca de 1.600. No entanto, não há muito acordo sobre quem, exatamente, deve ser o alvo. Apenas 639 pessoas e entidades foram sancionadas pelos três até setembro, de acordo com uma análise de dados compilados pelo Brookings Sanctions Tracker. Entre elas estão as duas filhas de Putin e Lyudmila, bem como a suposta namorada do presidente russo, a ginasta Kabaeva - mas não os Ocheretny.

Ocheretnaya foi sancionada pelo Reino Unido, como parte de um esforço para “atingir a rede financeira de Putin, apertando o cerco sobre o presidente e seu círculo íntimo” – mas a UE e os EUA até agora deixaram-na a ela e ao marido de fora.

"Ainda assim, o fato de os Ocheretny não terem sido alvo da UE não significa que nunca serão", sublinha Leonie Kijewski.

O grupo de trabalho internacional sobre sanções russas, conhecido como grupo Yermak-McFaul, propõe que familiares de indivíduos sancionados também sejam incluídos na lista para evitar que os fundos sejam transferidos para eles - especialmente se tiverem estilos de vida inconsistentes com as sua receitas oficiais, como parece ser o caso dos Ocheretny. Não há evidências públicas de que Ocheretny tenha obtido sua riqueza e propriedades ilegalmente, mas o seu valor parece superar as fontes de renda conhecidas.

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