Uma nova sanção virtualmente perigosa para a Rússia e a queda abismal do soft power - TVI

Uma nova sanção virtualmente perigosa para a Rússia e a queda abismal do soft power

    Vanda Jorge
    Diretora da Versa
  • 4 out, 19:32

Estima-se que, desde a declaração de guerra, a Rússia perdeu cerca de 15% do seu património reputacional.

Quando o mundo parecia alinhado numa visão global (talvez romântica) de usar o soft power de cada Nação como parte da estratégia de recuperação económica no pós-pandemia, a Rússia interrompe esta aparente normal ordem mundial e, com todo o seu hard power, invade a Ucrânia. Assistimos. Incrédulos. Até que as imagens nos fizeram acreditar. Ainda que a guerra tenha territórios certamente mais urgentes e preocupantes para analisar, há um que tem a importância que tem (tem alguma…), e que para a Rússia é já uma frente perdida.

No Índice Global Soft Power 2023 da Brand Finance, a Rússia é a única Nação do mundo a perder soft power neste último ano, com a reputação mundial (um dos principiais indicadores) a cair a pique, na sequência da agressão declarada à Ucrânia. Passa da 23ª posição para a 105ª e automaticamente a Marca Rússia sai do Top10 deste Ranking. Estima-se que, desde a declaração de guerra, a Rússia perdeu cerca de 15% do seu património reputacional, o que afetou desde a capacidade comercial, ao prestígio da cultura e das suas instituições, passando da 27ª Marca Nação mais valiosa para a 58ª, no Anholt-Ipsos Nation Brands Index.

Entre outros aspetos que medem a perceção da Marca País, a Rússia também perdeu terreno face a outras Nações em indicadores como “pessoas e valores”, “boas relações internacionais”, e as sanções comerciais impostas fizeram com que a ideia de ser “um País fácil de fazer negócios” caísse 61 posições, e o “potencial de crescimento futuro” teve uma queda de 74 lugares nesta mesma avaliação. São apenas números sim, e são também apenas rankings, mas é com eles, e a partir deles, que, a partir daqui, se (re)constrói a Marca Rússia.

O soft power e o Nation Branding funcionam alinhados no posicionamento de uma Marca Nação. E o primeiro é a capacidade de um País seduzir o mundo, normalmente através de ativos intangíveis – personalidade atrativa, cultura, valores, instituições políticas e políticas legítimas aos olhos dos espetadores desse mesmo mundo. E quando uma Marca Nação é bem trabalhada junto da comunidade internacional, aumenta o poder dessa, ainda que “leve”, sedução.

Não estou certa (ainda que esteja) que este tema tenha espaço na agenda de Vladimir Putin, mas a história já nos mostrou (Segunda Guerra Mundial) que, findo um conflito, neste caso a Rússia levará pelo menos uma geração a recuperar a imagem e o valor da sua Marca. Hoje, a Alemanha e o Japão lideram o Anholt-Ipsos Nation Brands Index, mas foram precisos cerca de setenta anos até chegarem aqui.

Depois das sanções económicas já impostas, fala-se desta nova “sanção virtual” – o colapso no valor da Marca Nação Rússia (caiu quase 150 mil milhões de dólares), o que destrói o valor percebido de tudo o que o País é e faz, junto do mercado global. E ainda que com uma guerra sem fim à vista, também não se consegue precisar quanto tempo durará este efeito colateral no País. Para já, os danos autoinfligidos à sua Marca Nação fazem com que o seu valor atual seja menor, por exemplo ao da Marca Bélgica, país com uma população 12 vezes inferior.

Depois de décadas de um debate interno sobre a sua identidade e política externa no quadro da sua história e que vem desde o colapso da União Soviética, a Rússia destruiu num dia (ou assim parece…) a sua Marca Nação. E, como comecei por dizer, não é prioridade... até ser prioridade.

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