A cirurgia para perder peso pode prolongar vidas - TVI

A cirurgia para perder peso pode prolongar vidas

  • CNN
  • Sandee LaMotte
  • 5 fev 2023, 09:00
Cirurgia, hospital, bypass gástrico. Foto: Portra/E+/Getty Images

A gestão do peso é um processo único para cada pessoa: uma mistura de genética, cultura, ambiente, estigma social e saúde pessoal, dizem os especialistas

A cirurgia para perder peso reduz o risco de morte prematura, especialmente por doenças relacionadas com a obesidade como o cancro, diabetes e doenças cardíacas, de acordo com um novo estudo realizado ao longo 40 anos com quase 22.000 pessoas que fizeram cirurgia bariátrica no Utah.

Comparando com outras pessoas de peso semelhante, aquelas que foram submetidas a um de quatro tipos de cirurgia para perder peso tinham 16% menos probabilidades de morrer por qualquer causa, revelou a investigação. A queda nas mortes por doenças provocadas pela obesidade, tais como doenças cardíacas, cancro e diabetes, foi ainda mais acentuada.

"As mortes por doenças cardiovasculares diminuíram 29%, enquanto as mortes por vários cancros diminuíram 43%, o que é bastante impressionante", diz o autor principal Ted Adams, professor associado adjunto em nutrição e fisiologia integrativa na Faculdade de Medicina da Universidade de Utah.

"Houve também uma enorme queda percentual - um declínio de 72% - nas mortes relacionadas com a diabetes em pessoas que foram operadas quando comparadas com as que não o foram", acrescenta. Uma desvantagem relevante: o estudo também concluiu que pessoas mais jovens que foram operadas corriam um risco mais elevado de suicídio.

Sustenta investigações anteriores

O estudo, publicado no final de janeiro na revista Obesity, reforça resultados semelhantes de investigações anteriores, incluindo um estudo de 10 anos na Suécia que encontrou reduções significativas em mortes prematuras, salienta Eduardo Grunvald, professor de medicina e diretor médico do programa de gestão de peso na Universidade da Califórnia San Diego Health.

O estudo sueco também encontrou um número significativo de pessoas em remissão da diabetes, tanto dois anos como dez anos após a cirurgia.

"Esta nova investigação do Utah é mais uma prova de que as pessoas que se submetem a estes procedimentos têm resultados positivos e benéficos a longo prazo", diz Eduardo Grunvald, que foi coautor das novas diretrizes da Associação Americana de Gastroenterologia para o tratamento da obesidade

A associação recomenda vivamente aos pacientes com obesidade o uso de medicamentos recentemente aprovados para a perda de peso ou cirurgia acompanhados de mudanças no estilo de vida.  

"E a chave para os pacientes é saber que mudar a sua dieta se torna mais natural, mais fácil de fazer depois de fazer a cirurgia bariátrica ou de tomar os novos medicamentos para perda de peso", diz Grunvald, que não estava envolvido no estudo realizado no Utah.

"Embora ainda não compreendamos bem porquê, estas intervenções mudam de facto a química no seu cérebro, tornando muito mais fácil mudar a sua dieta depois."  

Apesar dos benefícios, apenas 2% dos pacientes que são elegíveis para a cirurgia bariátrica a conseguem, muitas vezes devido ao estigma relacionado com a obesidade, diz Caroline Apovian, professora de medicina na Escola de Mecidina de Harvard e codiretora do Centro de Bem-Estar e Getstão do Peso do Hospital para Mulheres Brigham, em Boston. Caroline foi a principal autora das diretrizes de prática clínica da Sociedade de Endocrinologia para a gestão farmacológica da obesidade.  

As seguradoras normalmente cobrem o custo da cirurgia para pessoas com mais de 18 anos com um índice de massa corporal (IMC) de 40 ou superior, ou um IMC de 35 se a paciente também tiver uma condição relacionada, como diabetes ou tensão arterial elevada, explica.  

"Vejo pacientes com um IMC de 50, e invariavelmente direi: «você é um candidato a tudo – medicação, dieta, exercício e cirurgia». E muitos dizem-me: «não me fale em cirurgia. Não quero». Eles não querem uma solução cirúrgica para o que a sociedade lhes disse ser um fracasso da força de vontade." 

 "Não torturamos pessoas que têm doenças cardíacas: «ó, é porque comeu toda aquela fast food». Não torturamos pessoas com diabetes: «ó, é porque comeste aquele bolo todo». Dizemos-lhes que têm uma doença, e tratamo-la. A obesidade também é uma doença, mas torturamos as pessoas com obesidade, dizendo-lhes que a culpa é delas."  

Tanto homens como mulheres podem beneficiar 

A maioria das pessoas que escolhem a cirurgia bariátrica - cerca de 80% - são mulheres, diz Ted Adams. Um dos pontos fortes do novo estudo, sublinha, foi a inclusão de homens que tinham sido submetidos ao procedimento. 

"Para todas as causas de morte, a mortalidade foi reduzida em 14% para as mulheres e em 21% para os homens", diz. Além disso, as mortes por causas relacionadas, tais como ataque cardíaco, cancro e diabetes, foram 24% inferiores para as mulheres e 22% inferiores para os homens que se submeteram à cirurgia, em comparação com aqueles que não o fizeram, argumenta.

Quatro tipos de cirurgias realizadas entre 1982 e 2018 foram examinados no estudo: bypass gástrico, banda gástrica, sleeve gástrico e interruptor duodenal.

O bypass gástrico, desenvolvido no final dos anos 60, cria uma pequena bolsa junto da parte superior do estômago. Uma parte do intestino delgado é subida e ligada a esse ponto, contornando a maior parte do estômago e o duodeno, a primeira parte do intestino delgado.

Na faixa gástrica, uma faixa elástica que pode ser apertada ou solta é colocada à volta da parte superior do estômago, restringindo assim o volume de comida que entra na cavidade do estômago. Uma vez que a banda gástrica não é tão bem sucedida na perda de peso a longo prazo, o procedimento "não é tão popular hoje em dia", explica Ted Adams.

"O sleeve gástrico é um procedimento em que essencialmente cerca de dois terços do estômago são removidos por laparoscopia", explica Ted. "Leva menos tempo a criar resultados, e os alimentos continuam a passar pelo estômago, agora muito mais pequeno. Tornou-se uma opção muito popular." 

A troca duodenal é habitualmente reservada para os pacientes que têm um IMC elevado, acrescenta Ted Adams. É um procedimento complicado que combina uma gastrectomia em sleeve com um bypass intestinal, e é eficaz para pacientes com diabetes tipo 2, de acordo com a Clínica Cleveland. 

Uma complicação grave

Uma descoberta alarmante do novo estudo foi um aumento de 2,4% de mortes por suicídio, principalmente entre pessoas que fizeram a cirurgia bariátrica entre os 18 e os 34 anos de idade.

"Isto porque lhes é dito que a vida vai ser ótima após a cirurgia ou medicação", considera Joann Hendelman, diretora clínica da Aliança Nacional para os Distúrbios Alimentares, um grupo ativista sem fins lucrativos.

"Tudo o que tem de se fazer é perder peso, e as pessoas vão querer estar consigo, vão querer ser suas amigas, e a sua ansiedade e depressão vão desaparecer", diz Joann Hendelman. "Mas isso não é a realidade." 

Além disso, existem riscos pós-operatórios e efeitos secundários associados à cirurgia bariátrica, tais como náuseas, vómitos, alcoolismo, uma potencial falha em perder peso ou mesmo aumento de peso, explica Susan Vibbert, advogada do Projeto HEAL, que apoia pessoas que lutam com distúrbios alimentares.

"Como estamos a definir o que é saudável nestes cenários? E há outra intervenção - uma intervenção neutra no peso?", pergunta Susan Vibbert.

Estudos no passado também mostraram uma associação entre o risco de suicídio e a cirurgia bariátrica, sublinha Eduardo Grunvald, mas os estudos sobre o tema nem sempre são capazes de conhecer a história mental de um paciente.

"Será que a pessoa optou pela cirurgia porque tinha algumas expectativas irrealistas ou distúrbios psicológicos subjacentes que não foram resolvidos após a cirurgia? Ou será isto um efeito direto, de alguma forma, da cirurgia bariátrica? Não podemos responder a isso com certeza", argumenta. 

Um aconselhamento intensivo antes da cirurgia é normalmente necessário para todos os que se submetem ao procedimento, mas pode não ser suficiente, diz Caroline Apovian. O primeiro paciente de cirurgia bariátrica dela acabou por não resistir e cometeu suicídio.

"Ela era mais velha, na casa dos 40 anos. Foi operada e perdeu 68 quilos. E depois pôs-se à frente de um autocarro e morreu porque tinha uma doença bipolar subjacente e automedicava-se através da comida", conta Caroline Apovian. "Nós, como sociedade, usamos muita a comida para esconder traumas. O que precisamos neste país é de mais aconselhamento psicológico para todos, e não apenas para as pessoas que se submetem à cirurgia bariátrica".

A gestão do peso é um processo único para cada pessoa: uma mistura de genética, cultura, ambiente, estigma social e saúde pessoal, dizem os especialistas. Não há uma solução única para todos.

"Primeiro, nós como sociedade devemos considerar a obesidade como uma doença, como um problema biológico, e não como uma falha moral", salienta Eduardo Grunvald. "Este é o meu primeiro conselho."  

"E, se acredita que a sua vida vai beneficiar com o tratamento, então considere tratamentos baseados na ciência, que os estudos mostram serem a cirurgia ou medicamentos, se não tiver sido capaz de o resolver apenas com mudanças no estilo de vida."

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