Come muitos produtos ultraprocessados? A sua saúde mental está em risco - TVI

Come muitos produtos ultraprocessados? A sua saúde mental está em risco

  • CNN
  • Sandee LaMotte
  • 11 dez 2022, 19:00
Comida processada (Pexels)

Se os alimentos ultraprocessados fizerem parte da sua dieta, tente contrabalançar com alimentos saudáveis e de boa qualidade, tais como frutas, vegetais e cereais integrais

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Alimentos extremamente processados, tal como pizzas congeladas e refeições pré-feitas, tornam as nossas vidas agitadas muito mais fáceis. Ninguém é uma exceção ao seu consumo. E além disso, são bastante saborosas. Quem não gosta de um bom cachorro-quente, salchichas, hambúrgueres, batatas fritas, refrigerantes, bolachas, bolos, doces, donuts e gelados? Só para mencionar alguns.

Mas, segundo um novo estudo, se mais de 20% da ingestão diária de calorias forem provenientes de alimentos ultraprocessados, poderemos estar a aumentar o risco de declínio cognitivo.

Essa quantidade equivale a cerca de 400 calorias por dia numa dieta de 2.000 calorias diárias. Para se ter uma ideia, uma pequena dose de batatas fritas e um cheeseburger normal do McDonald's contém um total de 530 calorias.

Segundo o estudo publicado na JAMA Neurology, a parte do cérebro envolvida no funcionamento executivo, isto é, na capacidade de processar informação e tomar decisões, é especialmente afetada pelo consumo destes alimentos. O estudo constatou ainda que homens e mulheres que mais consomem alimentos ultraprocessados têm uma taxa de declínio cognitivo global 28% mais rápida e uma taxa de declínio da função executiva 25% mais rápida em comparação com as pessoas que consomem uma menor quantidade destes alimentos.

“Embora este seja um estudo de associação, que não foi concebido para provar uma relação de causa e efeito, há um número ou elementos, que reforçam a sugestão de que parte da aceleração da deterioração cognitiva pode ser atribuída a alimentos ultraprocessados”, disse David Katz, um especialista em medicina preventiva e de estilo de vida e nutrição que não esteve envolvido no estudo.

“A dimensão da amostra é substancial e o seu seguimento é extenso. Embora não haja muitas provas, este facto é suficientemente substancial para concluir que os alimentos ultraprocessados são suscetíveis de ser nocivos para o nosso cérebro”.

Houve, no entanto, uma reviravolta interessante no estudo. Se a qualidade da dieta global for elevada, ou seja, se a pessoa também comer muita fruta e vegetais não processados, cereais integrais e fontes saudáveis de proteínas, a relação entre os alimentos ultraprocessados e o declínio cognitivo desaparece, disse Katz.

“Os alimentos ultraprocessados provocam uma diminuição da qualidade da dieta, pelo que o seu consumo em quantidades significativas é um indicador de uma má alimentação na maioria dos casos”, sublinhou Katz. “Por mais atípico que pareça, alguns dos participantes provaram a veracidade desta afirmação. E, por sua vez, quando a qualidade da dieta era elevada, a associação negativa observada entre os alimentos ultraprocessados e a função cerebral diminuía”.

Não são muitas calorias

O estudo, apresentado esta segunda-feira na Conferência Internacional da Associação Alzheimer de 2022 em San Diego, acompanhou mais de 10.000 brasileiros durante até 10 anos. Pouco mais de metade dos participantes no estudo eram mulheres, caucasianos, universitários, enquanto a idade média era de 51 anos.

Foram realizados testes cognitivos no início e no final do estudo, nomeadamente a recordação imediata e tardia de palavras, o reconhecimento de palavras e a fluência verbal, e os participantes foram questionados sobre a sua dieta alimentar.

“No Brasil, os alimentos ultraprocessados constituem 25% a 30% do consumo total de calorias. Comemos McDonald's, Burger King, muito chocolate e pão branco. Infelizmente, não é muito diferente de muitos outros países ocidentais”, disse a coautora Claudia Suemoto, professora assistente na divisão de geriatria da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo.

“58% das calorias consumidas pelos cidadãos dos Estados Unidos, 56,8% das calorias consumidas pelos cidadãos britânicos e 48% das calorias consumidas pelos canadianos provêm de alimentos ultraprocessados”, disse Suemoto.

Segundo o estudo, os alimentos ultraprocessados são definidos como “formulações industriais de substâncias alimentares (óleos, gorduras, açúcares, amido e isolados de proteínas) que contêm pouco ou nenhum alimento completo e normalmente incluem aromatizantes, corantes, emulsionantes e outros aditivos alimentares”.

“As pessoas que consumiam mais de 20% das calorias diárias resultantes do consumo de alimentos processados tinham um declínio 28% mais rápido na cognição global e um declínio 25% mais rápido no funcionamento executivo em comparação com as pessoas que comiam menos de 20%”, disse Natalia Gonçalves, coautora do estudo e investigadora do departamento de patologia da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo.

Não afeta só o cérebro

Para além do seu impacto na cognição, os alimentos ultraprocessados são conhecidos por aumentar o risco de obesidade, problemas cardíacos e de circulação, diabetes, cancro e reduzir a esperança de vida.

“Em geral, os alimentos ultraprocessados são prejudiciais”, disse Katz, presidente e fundador da iniciativa sem fins lucrativos True Health Initiative, uma coligação global de especialistas dedicados à medicina do estilo de vida com base em provas.

Estes alimentos são ricos em açúcar, sal e gordura, o que fomenta inflamações por todo o corpo.
“É provavelmente a maior ameaça ao envelhecimento saudável do corpo e do cérebro”, disse Rudy Tanzi, professor de neurologia na Faculdade de Medicina de Harvard e diretor da unidade de investigação genética e envelhecimento no Massachusetts General Hospital em Boston. Tanzi não esteve envolvido no estudo.

“Estes alimentos, por serem uma refeição rápida e fácil, acabam por substituir o consumo de outros produtos ricos em fibra vegetal que são importantes para manter a saúde e o equilíbrio de um milhão de biliões de bactérias no seu microbioma intestinal”, acrescentou Tanzi, “o que é particularmente importante para o bem-estar do cérebro e para reduzir o risco de doenças cerebrais relacionadas com a idade, tal como a doença de Alzheimer”.

Como prevenir

Como pode evitar que isto aconteça? Se os alimentos ultraprocessados fizerem parte da dieta, deve tentar-se contrabalançar com alimentos saudáveis e de boa qualidade, tais como frutas, vegetais e cereais integrais.

“A conclusão é que os alimentos ultraprocessados são, de facto, um ‘ingrediente’ importante, mas o que deveria ser o foco dos esforços de saúde pública é a qualidade geral da dieta”, disse Katz.

Uma maneira fácil de assegurar a qualidade da dieta é cozinhar e preparar as próprias refeições sem recorrer a estes tipos de produtos processados, disse Suemoto.

“As pessoas precisam de perceber que deviam cozinhar mais e preparar a sua própria comida a partir do zero. Eu sei. Dizemos sempre que não temos tempo, mas não demora assim tanto”, disse Suemoto.

“E vale a pena porque vai proteger o seu coração e o seu cérebro da demência ou da doença de Alzheimer”, acrescentou. “A mensagem que queremos transmitir com este estudo é: Parem de comprar coisas que são ultraprocessadas”.

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