"Pode perder-se entre 5% a 20% do peso": respostas sobre o medicamento para a diabetes que também faz emagrecer - TVI

"Pode perder-se entre 5% a 20% do peso": respostas sobre o medicamento para a diabetes que também faz emagrecer

Ozempic (Foto: Joel Saget/AFP via Getty Images)

Na semana em que Inglaterra aprovou o uso do Ozempic (nome comercial do semaglutido), um antidiabético para o tratamento da obesidade, explicamos que fármaco é este, quando se usa e em que condições é receitado em Portugal. Comercializado no nosso país desde 2021, só é comparticipado para o tratamento da diabetes

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O que é o semaglutido?
O semaglutido é um fármaco que pertence à classe dos agonistas dos recetores GLP-1 e que inicialmente "tinha indicação para ser usado em doentes com diabetes e para controlo da diabetes", explica à CNN Portugal a endocrinologista Paula Freitas, do Centro Hospitalar Universitário de São João e que já presidiu à Sociedade Portuguesa para o Estudo da Obesidade. "Mas verificou-se que tinha outras vantagens", acrescenta a especialista: não só no controlo da diabetes mas também na redução da pressão arterial e do risco cardiovascular, bem como no tratamento da obesidade, levando à perda de peso.

A quem se destina?
Na dose de 1 miligrama, o semaglutido (nome comercial Ozempic) destina-se a doentes com diabetes tipo 2 e demonstrou eficácia na redução do peso, pressão arterial ou risco cardiovascular. "Mas, noutras doses, este fármaco tem indicação para tratamento da obesidade, independentemente de os doentes terem diabetes ou não", explica a endocrinologista Paula Freitas. "O mesmo fármaco, numa dose, tem indicação para a diabetes; numa dose superior, tem indicação para a obesidade", resume. Se o tratamento com semaglutido for para a obesidade, a dose é de 2,4 miligramas, indica ainda a especialista.

Quais os critérios para utilização no tratamento da obesidade?
O semaglutido tem indicação para tratamento da obesidade em doentes com índice de massa corporal superior a 30. Este número baixa para 27 se houver comorbilidades associadas, como a apneia do sono, por exemplo, explica Paula Freitas.

Existem contraindicações para utilização do semaglutido?
"Estes fármacos são contraindicados em duas situações: pessoas com história de pancreatites de repetição, e neste caso não é uma contraindicação absoluta mas pede precaução, e doentes que tenham tido carcinoma modular da tiroide, que é uma doença raríssima, ou que tenham historial familiar desta doença. Ou seja, não tem grandes contraindicações", esclarece Paula Freitas. Em resumo, não se verificando estes problemas, os não diabéticos também podem tomar o medicamento com segurança.

Tem efeitos secundários?
Os efeitos secundários do semaglutido são, explica a endocrinologista, "autolimitados e transitórios" e sentem-se sobretudo numa fase inicial de recurso ao fármaco. Há quem tenha náuseas, vómitos, obstipação ou diarreias.

Durante quanto tempo deve ser usado?
O semaglutido administra-se numa caneta injetável com periodicidade semanal. Durante quanto tempo? "A obesidade é uma doença crónica e as doenças crónicas tratam-se de forma crónica", explica a endocrinologista Paula Freitas. "Quando tenho um doente com hipertensão, tem de tomar medicamentos e, teoricamente, para quando se resolve a condição. Um fármaco só faz efeito quando se toma e a obesidade não é diferente das outras doenças. Há situações em que se pode suspender a terapêutica e as pessoas vão reganhar peso, mas não é falha do doente. É a doença. Não falhou o medicamento nem falhou a pessoa", ressalva a especialista. "A obesidade é uma doença complexa, multifactorial e crónica", acrescenta ainda Paula Freitas. 

Quanto peso se perde com esta medicação?
Antes de irmos a números, uma explicação: o tratamento da obesidade não é só farmacológico e, idealmente, os doentes deverão ser acompanhados por uma equipa multidisciplinar que integre um médico, nutricionista, psicólogo ou fisiologista. Mas, falando agora de medicação, existem já outros três fármacos aprovados na Europa para o tratamento da obesidade, que atuam de formas diferentes na regulação do apetite e devem ser usados consoante o "fenótipo" do doente, explica a endocrinologista Paula Freitas. O semaglutido "é diferente no sentido em que, provavelmente, pode ser mais potente em termos de perda ponderal", assinala a especialista. "Dos estudos que temos, há maior percentagem de doentes a perder cinco, dez, quinze por cento do peso." A eficácia deste tipo de fármacos para tratar a obesidade mede-se naturalmente pela perda ponderal que proporciona e que se associa à melhoria das doenças associadas à obesidade. "Há estudos em que 77% das pessoas perderam mais de 5% do peso corporal, 62% perderam mais de 10%, 53% perderam mais de 15% e mais de 36% dos doentes perderam mais de 20% do peso", revela Paula Freitas.

 
Porque é importante tratar a obesidade?

A importância do tratamento da obesidade não se relaciona com motivos estéticos ou de cosmética, lembra a endocrinologista. "Ninguém trata a obesidade para as pessoas ficarem magras. O peso é uma medida objetiva mas não queremos só que as pessoas percam peso, o objetivo é reduzir o risco de diabetes, apneia do sono, doença cardiovascular", sublinha Paula Freitas. "Queremos que as pessoas vivam mais anos, com melhor qualidade de vida e que não tenham nenhum dos 13 tipos de cancro associados à obesidade", diz a especialista, que cita um estudo já apresentado na Sociedade Portuguesa para o Estudo da Obesidade, ainda não publicado, e que indica que 5,8 por cento da despesa da Saúde em Portugal desapareceria se a obesidade não existisse. "E estamos a falar de custos diretos, sem abordar custos indiretos, como o absentismo, o estigma ou como estas pessoas são preteridas para determinados trabalhos, por exemplo", diz a médica. 

O semaglutido é prescrito em Portugal?
O semaglutido é um antidiabético e prescrito como tal em Portugal na dose de 1 miligrama. Não existe na dose que se prova ser a adequada para a perda de peso, que é superior, de 2,4 miligramas. "Só o deve utilizar quem tem essa indicação formal", frisa a endocrinologista Paula Freitas, recordando que um doente obeso deve sempre ser visto por um médico. "A obesidade está associada a múltiplos fatores, genéticos ou do ambiente em que as pessoas vivem. E hoje estamos mais expostos a alimentos altamente calóricos e ao sedentarismo. Também sabemos que as pessoas que ganham mais peso têm determinados polimorfismos genéticos, conjuntos de genes que lhes conferem maior suscetibilidade para a obesidade. Portanto, não se pode generalizar e o doente deve sempre ser visto por um médico. O semaglutido não é um fármaco que a pessoa deva chegar à farmácia e pedir", sublinha a especialista. Por outro lado, Paula Freitas lembra que em Portugal não existe nenhum medicamento comparticipado para tratar a obesidade, ao contrário do que acontece com os fármacos para tratar a diabetes - as insulinas são comparticipadas a 100 por cento pelo Estado, por exemplo. "Portugal foi um dos primeiros países que reconheceram a obesidade como doença, então temos de ser consequentes", aponta. "Se temos doença e não temos nenhum tratamento é uma coisa, mas se temos fármacos para tratar uma doença então o poder político tem de tomar uma decisão - se vamos ajudar as pessoas a tratarem-se ou não", diz a especialista, que apela às associações de doentes e sociedades científicas para que façam maior pressão junto do Estado para que possa haver tratamentos comparticipados contra a obesidade no nosso país.

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