Utentes dizem que qualidade dos serviços no SNS baixou, sobretudo a acessibilidade - TVI

Utentes dizem que qualidade dos serviços no SNS baixou, sobretudo a acessibilidade

  • Agência Lusa
  • AM
  • 18 abr 2023, 07:54
Hospital Santa Maria (Lusa/Tiago Petinga)

Estudo Índice de Saúde Sustentável, desenvolvido pela Nova Information Management School, revela ainda que, em 2022, um em cada 10 portugueses não comprou medicamento prescrito por causa do custo e que o investimento no SNS permitiu retorno de 7,8 mil milhões para a economia

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A qualidade dos serviços prestados no Serviço Nacional de Saúde baixou na perspetiva dos utentes, sendo que o valor mais baixo de sempre é atribuído à acessibilidade técnica, segundo um estudo divulgado esta terça-feira.

De acordo com o Índice de Saúde Sustentável, desenvolvido pela Nova Information Management School (Nova IMS), a acessibilidade técnica do SNS diminuiu no ano passado face a 2021 e encontra-se “em níveis muito baixos” quando comparada com as demais dimensões.

A acessibilidade técnica avalia indicadores como as primeiras consultas em tempo adequado, os inscritos em lista espera e tempo máximo de resposta garantido (180 e 270 dias), os episódios de urgência atendidos em tempo previsto e a utilização da capacidade disponível de hospitalização domiciliária.

“Temos uma qualidade percecionada pelos utentes que está mais ou menos estabilizada e que este ano decresceu um pouco, ainda que de forma não significativa, e uma qualidade técnica que subiu”, disse o coordenador do estudo, Pedro Simões Coelho.

O responsável explicou que a qualidade técnica é muito induzida por aspetos que “não são tão percecionados pelos utentes”, como, por exemplo, a diminuição do internamento a 30 dias e a redução da mortalidade por AVC (Acidente Vascular Cerebral).

Por outro lado, adiantou, de todas as dimensões analisadas, o índice de acessibilidade “é o mais baixo”: “Tem apenas 51 pontos, numa escala de zero a 100, ou seja, nem sequer atinge o limiar dos 60 pontos, que é o limiar dos valores positivos”.

“Com estes vários vetores, uns mais positivos, outros mais negativos, o índice de sustentabilidade [do Serviço Nacional de Saúde] acaba por ficar relativamente estável”, acrescenta, falando de um ano “com sinais mistos”.

De acordo com o estudo, o índice de sustentabilidade do SNS - que tinha caído no primeiro ano da pandemia e subido em 2021 – manteve-se quase estável (passou de 92,5 para 91,8).

“É um índice que está estabilizado (…). Estimamos que a atividade (…) tenha crescido acima dos 2%, o que é positivo, mas simultaneamente temos uma despesa que cresceu acima dos 6%. Portanto, (…) uma despesa a crescer acima da atividade significa uma certa perda de produtividade”, explicou.

Pedro Simões Coelho lembrou ainda que este índice estava em valores que rondavam os 102 pontos antes da pandemia e que, em 2020, teve uma queda abrupta, acrescentando: “Em 2021 recuperou parcialmente dessa queda, mas em 2022 continua estável e, portanto, não foi ainda capaz de atingir os níveis os níveis pré-pandemia”.

A satisfação e confiança dos utentes diminuíram na generalidade dos parâmetros avaliados (exceção para a satisfação com a urgência). A este nível, foram analisados os cuidados de saúde recebidos nos últimos 12 meses, as consultas no centro de saúde e no hospital público, os exames de diagnóstico, o atendimento na urgência e o internamento.

Também a perceção da qualidade dos serviços piorou na maioria das determinantes avaliadas, que incluíram a facilidade de acesso aos cuidados (marcação ou admissão), os tempos de espera entre a marcação e a realização dos atos médicos, as infraestruturas e equipamentos dos locais onde foram prestados os cuidados, assim como a qualidade dos profissionais e da informação prestada por estes.

Como ponto forte do SNS os utentes continuam a apontar os profissionais de saúde e a qualidade da informação por eles fornecida, considerando que devem ser valorizados.

As áreas prioritárias de atuação apontadas são a facilidade de acesso aos cuidados e os tempos de espera.

Um em cada 10 portugueses não comprou medicamento prescrito por causa do custo

Um em cada 10 portugueses não comprou no ano passado alguns dos medicamentos prescritos pelo médico por causa do custo, um valor que aumentou face ao ano anterior.

De acordo com o Índice de Saúde Sustentável, 89% dos portugueses tomaram algum medicamento prescrito por um médico em 2022, mas o custo dos medicamentos fez com que 10% tivessem optado por não comprar algum dos fármacos prescritos.

Globalmente, os utentes continuam a considerar o preço do Serviço Nacional de Saúde (SNS) adequado, mas também têm uma perceção do valor das taxas moderadoras que é superior ao valor real, não sabendo que, nalguns casos, estas já não são pagas.

Como exemplo, o estudo apresenta o valor real e o percecionado pelos utentes das taxas moderadoras em diversos serviços.

As consultas com médico de clínica geral ou médico de família no centro de saúde já não são pagas, mas os utentes continuam a achar que custam um valor próximo dos 3€, o mesmo acontecendo nas consultas externas / especialidade nos hospitais públicos, que estimam custar 7€.

É no estado de saúde e na qualidade de vida que a eficácia do SNS tem maior expressão, na ótica do utente, que considera a eficácia dos medicamentos (76) superior à dos cuidados de saúde recebidos (73,3).

O estudo, que é hoje apresentado em Lisboa, indica que a maioria dos portugueses faz uma avaliação positiva do seu estado de saúde, com 74% a considerarem que é “bom” ou “muito bom”. No entanto, este valor é inferior ao de 2021 (77%).

Numa escala de 1 a 100, os portugueses classificam o seu estado de saúde com 75 pontos (75,7 em 2021). Sem o efeito do SNS, o índice do estado de saúde ficaria pelos 64,7 (63,2 em 2021).

Mais de metade (52%) considera que o seu estado de saúde afeta negativamente a sua qualidade de vida, metade diz que dificulta a realização de tarefas diárias (pessoais e/ou profissionais) e 43% que dificulta a sua mobilidade.

Investimento no SNS permitiu retorno de 7,8 mil milhões para a economia

O investimento no Serviço Nacional de Saúde (SNS) em 2022 permitiu um retorno de 7,8 mil milhões de euros para a economia, graças ao impacto dos cuidados de saúde no absentismo e na produtividade.

Segundo os dados do Índice de Saúde Sustentável, este retorno foi superior (mais 300 milhões) ao valor apurado em 2021 (7,5 mil milhões).

“Continuamos a ter um retorno muito significativo. Estimamos que o SNS, no ano 2022, por cada utilizador do sistema, tenha poupado 1,6 dias em absentismo e (…) o equivalente a 10 dias de trabalho em perda de produtividade”, explicou à Lusa o coordenador do estudo, Pedro Simões Coelho.

De acordo com os dados do estudo, mais de metade dos portugueses faltou pelo menos um dia ao trabalho em 2022 por motivos de saúde e 6% faltaram mais de 20 dias. No entanto, a prestação de cuidados de saúde pelo SNS permitiu evitar uma ausência laboral equivalente a 1,6 dias, representando uma poupança de 700 milhões euros.

Os cuidados prestados no SNS permitiram ainda evitar 9,9 dias de trabalho perdidos em produtividade, resultando numa poupança de 4,5 mil milhões de euros.

No total, somando o impacto no absentismo e na produtividade, o SNS permitiu uma poupança global de 5,2 mil milhões de euros por via dos salários.

Considerando o impacto da poupança por via dos salários e a relação entre produtividade/remuneração (valor referência do INE), o estudo conclui que os cuidados prestados pelo SNS permitiram um retorno para a economia de 7,8 mil milhões de euros.

Pedro Simões Coelho fala de uma “mudança significativa” em 2022 no equilíbrio do contributo que o SNS dá para o absentismo e para a produtividade e explica: “Nos anos de 2020 e 2021, o absentismo tinha sido muito significativo, provavelmente associado ao facto de serem anos de pandemia, e no ano 2022 há uma redução significativa do absentismo”.

“Já no caso da produtividade não é assim e o contributo do SNS até é superior ao dos anos anteriores”, acrescenta.

A este respeito, aponta ainda um outro fenómeno, relacionado com a mudança de paradigma trazida por uma diferente organização do trabalho após a pandemia: “Há muita gente que [agora] trabalha ou pode trabalhar em teletrabalho, o que significa que há muitas patologias que antes geravam absentismo e neste momento já não geram (…), porque as pessoas podem trabalhar em casa, mas podem continuar a ter algum impacto na perda de produtividade”.

“Até 2019, as pessoas que tinham uma infeção respiratória com alguma severidade, tinham de ficar três ou quatro dias em casa, até por uma questão de evitar o contágio aos colegas. Agora, ficam em casa, mas ficam a trabalhar. Pode haver uma quebra de produtividade, mas é uma situação completamente diferente”, acrescenta.

O trabalho, desenvolvido pela NOVA-IMS em colaboração com a AbbVie, Diário de Notícias e TSF, conclui que a atividade do sistema em 2022 subiu ligeiramente (2,2%), depois de um aumento significativo de 13,1% em 2021, o ano de recuperação da pandemia. Em 2020 este valor tinha caído 9,8%.

O investigador aponta ainda dois outros “sinais positivos” nos dados recolhidos: a redução do deficit em 3% e da dívida vencida em 8%.

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