“Macron é um líder moderno, mas hoje está a vender porcos criados em França na China. Qual é o sentido disso? O que é que isso vai fazer pelo mundo? Pelo ambiente? França devia estar a lutar para que os franceses comam porco criado em França. ”
As palavras de Juan Branco, advogado franco-espanhol, jornalista e conselheiro de Julian Assange proferidas esta tarde no Altice Arena, no segundo dia completo da Web Summit, arrancaram um raro aplauso à vasta plateia, pouco dada a interromper talks com palmas.
O Presidente francês esteve de facto na China a vender porcos, entre outras coisas, num valor total, segundo a Reuters, de 15 mil milhões de dólares. Julian Branco, que veio a Lisboa lembrar que Assange está preso e que muito teria a dizer na Web Summit, marcou presença no painel sobre a guerra nas trocas comerciais, ao lado de Michael Paul Pillsbury, próximo de Donald Trump, e diretor americano do Centro de Estratégia Chinesa, o Instituto Hudson.
O norte-americano criticou o estado das relações atuais com a China, mas foi Franco que simplificou a questão.
“Vender porco à China. Pensem no que está aqui a acontecer. Caso os chineses decidam quebrar os acordos agora conseguidos, a França não tem qualquer poder contra a China. Pensem nisto”, enfatizou.
As palavras do conselheiro de Assange, focadas nas decisões dos dias de hoje e no impacto que terão no futuro, encaixam na mensagem que antes, logo na abertura do segundo dia, Brad Smith, presidente da Microsoft, levou ao palco central da Web Summit.
O advogado de 60 anos começou por lembrar que a próxima década está à porta e com ela importantes decisões. A Internet, claro está, será o centro de tudo.
“A Internet vai ser como a eletricidade, vai estar a toda a nossa volta, sem que pensamos nela”, disse, apontando ao papel que a Inteligência Artificial vai assumir nas nossas vidas.
Na Web Summit, a Inteligência Artificial tem um rosto: Sophia. A robot esteve mais uma vez em Lisboa e desta vez trouxe o irmão, Phill, um robot já com 14 anos. Os dois tomaram o palco, mas não conquistaram o público do Altice Arena. Pouco ou nada se notou de evolução em Sophia, pelo menos, a "olho nu". A Inteligência Artificial será o futuro, mas foram os próprios criadores das máquinas a admitirem que não sabemos quando vamos ter um robot "completamente vivo".
Já para Brad Smith a Inteligência Artificial, e o que fazemos com ela, é o grande desafio da próxima década e cabe a esta geração tomar decisões que terão um impacto decisivo nos próximos 30 anos.
"Somos nós, todos os que estão vivos hoje nesta sala, a primeira geração da Humanidade que dará poder aos computadores para tomarem decisões que até agora estavam reservadas aos humanos. Se nós errarmos, as gerações seguintes vão pagar durante anos”, disse, apontando como solução a necessidade de colocar o interesse público na frente de todas as decisões, assim como, o poder do indivíduo.
“Todos temos que ter um papel, todos temos que trabalhar em conjunto, esse é o desafio para a próxima década, esse é o desafio da Web Summit”.
Pouco mais de um minuto depois destas palavras, foi a vez de Tony Blair entrar em palco para falar sobre como pode a tecnologia chegar a todos, sem deixar ninguém para trás. Para o ex-primeiro-ministro britânico, a resposta é simples e está na política.
“A tragédia do Brexit, ao qual sou contra, está a distrair da questão central que é a forma como a tecnologia e a política podem trabalhar em conjunto para que ninguém fique para trás”, para que a tecnologia “possa ser usada na saúde ou na educação”. Blair defendeu ainda que é necessário que os políticos entendam a tecnologia para que tomem as “decisões certas”.
Num dia em que o futuro marcou muitas das intervenções da cimeira, o ambiente e a questão sobre se ainda vamos a tempo de salvar o mundo, não podia ficar fora do painel principal.
Christiana Figueres, rival de António Guterres na candidatura ao cargo de Secretário-geral das Nações Unidas e uma das mentes do Acordo de Paris, veio à Web Summit precisamente desvalorizar a saída dos EUA do acordo climático.
Figueres lembrou que os norte-americanos têm nas próximas eleições uma decisão muito importante a tomar, mas fez questão de salientar que mesmo que os EUA nada façam, o importante é o resto do mundo “não parar para olhar e seguir em frente”, porque, defende, estamos a ir no caminho certo: o caminho da descarbonização.
Já sobre “salvar o mundo”, a diplomata costa-riquenha vincou que o planeta não precisa de ser salvo, e lembrou, como muitos dos seus pares, que são as preferências dos consumidores, as escolhas, as decisões, de cada um de nós, que fazem o futuro.
“Nós não estamos a salvar o planeta. O Planeta merecia um bolo pelos 4,5 mil milhões de anos, o planeta vai sobreviver. Nós é que podemos não sobreviver. O que está em causa é a forma como queremos viver e se vamos sobreviver”.