Seis ondas de calor, seca e recordes. 2022 foi o ano com a temperatura mais alta desde que há registos em Portugal - TVI

Seis ondas de calor, seca e recordes. 2022 foi o ano com a temperatura mais alta desde que há registos em Portugal

Bom tempo (Lusa/Nuno Veiga)

Seis ondas de calor, défice de pluviosidade e dois meses que bateram recordes de temperatura. O resumo climático de 2022 ainda não está fechado, mas o registos anómalos deixam adivinhar que o ano passado ultrapassou todos os registos. E 2023 já está a começar mais quente do que o normal

Os dados ainda não estão fechados, mas tudo aponta para que 2022 seja o ano com a temperatura mais alta desde que há registos. De acordo com fonte do Instituto Português do Mar e da Atmosfera, a análise preliminar ainda não contém a informação total de todas as estações, mas já mostra que "2022 é, provavelmente, o ano com a temperatura mais alta de sempre, ou seja, desde 1931", ano em que o IPMA começou a fazer a análise dos dados.

"Estamos a falar dos últimos 92 anos", afirma a climatologista Vânia Pires à CNN Portugal, explicando que o valor final "não deve ser muito diferente" quando os especialistas tiverem na sua posse "todo o conjunto das estações".

Ou seja, é praticamente certo que "2022 será o ano mais quente até agora em termos de temperatura média em Portugal".

Mas o que explica estes registos? Segundo a climatologista, no ano passado foram registadas em Portugal "seis ondas de calor, o que contribuiu realmente para termos valores mais elevados da temperatura mínima".

"2017 foi talvez o ano que teve mais ondas de calor, que foram sete, agora tivemos 2022 com seis, sendo que uma foi na primavera, depois tivemos quatro no verão e uma no outono, foram bastantes. O número de dias em onda de calor também foi elevado, porque tivemos ali muitas estações no nordeste que tiveram cerca de 40 dias, no verão, em onda de calor, o que é também bastante significativo, e isto está neste seguimento que temos verificado: cada vez há maior frequência destes dias quentes, de maiores ondas de calor e consequentemente isto tem um contributo maior para os valores anuais serem mais elevados", explica.

A climatologista revela ainda que "em termos de temperatura média, o mês mais quente foi julho", tendo sido o julho mais quente desde que há registos.

E a chuva?

Temperatura mais elevada, mais ondas de calor e com mais dias e poucos meses com precipitação. A climatologista lembra que apesar do ano ter terminado com chuva - e de nos últimos três meses ter chovido acima do normal -, 2022 começou com o país em seca. No entanto, a chuva de fim de ano fez com que a temperatura de Portugal fosse mais alta nos últimos meses do ano quando, sendo meses de outono/inverno, o normal é que as temperaturas baixem.

"O facto de termos tido estes meses agora mais chuvosos fez com que a temperatura fosse mais alta, porque normalmente quando está mais húmido, esta situação de humidade tem aquelas massas mais húmidas e mais quentes, mais amenas. Ou seja, estes meses, que já são meses de outono e inverno em que a temperatura desce, a temperatura acabou por não descer. E nós tivemos realmente este dezembro que foi um exemplo disso e que é também o dezembro mais quente de sempre e cuja temperatura mínima é o segundo mais alto valor", revela.

Em dezembro, as temperaturas mínimas são normalmente baixas, as noites mais frias, mas só agora, na primeira semana de janeiro, "é que estamos a ter o primeiro frio deste outono/inverno".

"Normalmente, no nosso clima, as temperaturas descem mais durante o inverno quando temos este tempo mais de céu limpo, com o efeito do anticiclone, em que há o transporte do ar mais frio, que não foi o que aconteceu. Portanto, as temperaturas, nestes meses em que é esperado descer, não desceram e contribuíram para este ano de 2022 ser realmente excecional a este nível".

A juntar a isso, Portugal viveu em "défice de precipitação, sobretudo até agosto", com o país numa "situação de seca relativamente complicada" e que se foi agravando ao longo do tempo, estendendo-se por todo o território. A situação só se começou a resolver já em setembro, quando a precipitação começou a ocorrer.

"A seca acabou por ir diminuindo agora nestes meses gradualmente e, neste momento, apenas alguns locais do interior Sul ainda se mantêm em seca fraca, que é já a classe menos grave do índice. Praticamente já não estamos em seca Portugal. Houve essa diminuição desde setembro até agora".

No entanto, "no cômputo geral do ano, à partida, deverá ser um ano com valores abaixo do normal porque uma grande parte dos meses foram com défices de precipitação. Apesar destes três meses terem contribuído para aumentar".

Já em termos de temperatura, 2022 é um ano "completamente um ano fora do normal". "Em termos de precipitação irá ficar mais próximo do normal, mas não deixamos de ter tido estes 9 meses em seca, portanto não deixa de ser um bocadinho análogo por causa disso. Tivemos, de facto, temperaturas muito altas, a baterem-se recordes - como foi o caso de julho e de dezembro - tivemos a situação de seca, as seis ondas de calor, foi um ano com alguns eventos este 2022".

E 2023?

2021 foi o 5º quinto ano mais quente, superando ligeiramente os valores de 2015 e 2018. 2022 sobe diretamente para o primeiro lugar. A década 2011-2020 foi a mais quente desde 1931 em Portugal continental. E agora, o que podemos esperar deste ano?

"Nos últimos dez anos, a maior parte da temperatura anual tem sempre sido acima do normal. No início do ano tivemos valores muito altos e em dezembro tivemos temperaturas elevadas no sul, o que não é normal para esta época. É o segundo dezembro em que registamos assim valores tão altos de temperatura".

Consultando a previsão sazonal disponível no site do IPMA, é possível verificar que, de acordo com os dados disponíveis, estão previstas temperaturas acima do normal para os três primeiros meses do ano para Portugal continental e Madeira. Já nos Açores, no grupo Ocidental e Central, as temperaturas serão apenas superiores em fevereiro e março.

"Na temperatura média mensal do ar, prevê-se anomalia positiva, 0.25 a 0.5°C, para Portugal continental e Madeira, para os meses de janeiro a março.
Sobre os Açores, prevê-se anomalia positiva, 0.25 a 0.5°C, para o grupo Oriental nos três meses abrangidos pela previsão e para os grupos Ocidental e Central apenas em fevereiro e março", lê-se no documento.

Quanto à precipitação, será normal para a época, "com exceção do litoral Norte no mês de fevereiro que apresenta anomalia negativa". Já nos Açores, prevê-se que chova menos que o normal no grupo Ocidental no mês de janeiro

"Na precipitação total mensal, não existe sinal significativo sobre o território continental e Madeira em todo o período abrangido pela previsão, com exceção do litoral Norte no mês de fevereiro que apresenta anomalia negativa, -10 a -5mm. Para os Açores, prevê-se anomalia negativa para o grupo Ocidental no mês de janeiro, -10 a -5mm, em fevereiro e março não existe sinal significativo".

Em declarações à CNN Portugal, o meteorologista Alessandro Marraccini explica que "este tipo de previsões é uma previsão sazonal, que tem uma tendibilidade baixa, portanto é baseada em modelos numéricos que tentam o melhor que podem prever o tempo nos próximos meses".

"Mas é uma linha de tendência e por vezes falha. Ainda está numa fase em que tentamos dar uma tendência. Não será assim necessariamente: é o mais provável, mas é pouco mais provável do que o contrário", afirma, em linha com o aviso presente no documento, de que a utilização da previsão mensal "deve ser feita com reservas declinando o IPMA quaisquer responsabilidades que resultem da sua utilização sem atender a estas reservas".

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